— Está esquecendo de alguma coisa, querida? — Minha mãe afagou a minha bochecha com carinho. Seus olhos orgulhosos brilhavam tanto que eu quase me senti culpada.
Eu sou uma vergonha para minha família! Uma mentirosa, falsificadora de documentos. Mas o que eu posso fazer? Meus pais não me deixariam cursar Artes Cênicas nem se eu tivesse uma irmã gêmea.
A culpa me corroía desde que decidi que daria cabo a minha mentira. Então, por mais que eu tente não ter remorso do que eu fiz, meus pensamentos sempre me traem, principalmente quando meus pais parecem realmente satisfeitos por eu estar "trilhando seus passos". Até meu pai, que sempre foi rígido e frio comigo ostentava no rosto um olhar quase amável.
— Está tudo aqui comigo. Chequei umas cinco vezes só hoje. — Meu pai retirou as mãos do bolso do terno caro e me puxou para um abraço que me deixou surpresa. Ele cheirava a colônia francesa, e não era muito adepto a demonstrações de afeto.
Quando me afastei do abraço, os dois me encaravam com emoção e orgulho. Parecia até que eu estava partindo para a guerra.
O sonho dos meus pais desde que eu era pequena sempre foi o de seguir seus passos na carreira da advocacia. Nós somos muito ricos, pois o escritório de advocacia dos dois é um dos melhores do país. Clientes de outros estados vem até eles à procura de seus serviços, e eles sempre quiseram que eu fizesse parte deste sucesso.
Infelizmente, eu nunca tive um pingo de interesse por Direito. Já tentei gostar do curso por muitas vezes em minhas pesquisas, mas não deu muito certo. Acho até que o curso deveria se chamar Tédio, ao invés de Direito de tão chato que é. Toda a vez que meus pais falam sobre Direito Constitucional ou outra baboseira dessas eu me desligo completamente. Tenho vontade de dar um tiro na minha cabeça toda a vez que eles falam sobre assuntos do trabalho. Sei que eles fazem isso de propósito, porque sempre me dizem que é para eu me familiarizar desde já em relação a esses termos, mas ainda assim, é um saco.
Minha aptidão para artes sempre foi um problema para eles. Eu sempre me inscrevia em oficinas de dança, canto, teatro e escrita e me envolvia nos eventos artísticos protagonizados pela minha escola. Meus pais acharam que um dia eu iria enjoar desses hobbys, mas meu amor pela arte só cresceu.
Quando eu disse que estava considerando outras opções, eles quase tiveram um ataque do coração. Então, eu fingi que estava super animada em seguir a carreira que escolheram para mim e me inscrevi em uma das melhores universidades de Artes Cênicas do Rio de Janeiro, a Universidade Federal de Artes Cênicas de Niterói, UFACN. E eu passei!
Tive que falsificar a lista de aprovação para comprovar que eu estava matriculada no curso de direito, e com a ajuda de Candinha, a empregada mais maravilhosa que existe, consegui uma vaga gratuita em um dos dormitórios da universidade. Tive que colocar o endereço de Candinha para "comprovar" que não tenho condições de me bancar e separei minhas economias para poder viver por minha conta. Não posso correr o risco de depender tanto dos meus pais, pois se descobrirem que eu menti sobre a faculdade, eles com certeza vão querer me matar.
Ok, estou sendo dramática. Eles não me matariam, me trancariam num porão com todo todos os livros do curso de direito. Com certeza dariam um jeito de me fazer uma grande lavagem cerebral para virar uma "escrava do direito", ou seja lá o que isso significa.
Um arrepio percorreu minha espinha quando pensei nessa possibilidade.
Candinha apareceu, se posicionando ao lado dos meus pais. Abri um sorriso nervoso e a abracei.
— Boa sorte, meu amor. Sentiremos muito a sua falta. — Meus olhos se encheram de lágrimas, pois Candinha sempre foi como uma segunda mãe para mim. Ao contrário dos meus pais, ela sempre deu voz aos meus sonhos e sempre me incentivou a trilhar meu próprio caminho. Claro que agir pelas costas dos meus pais a deixava apreensiva, mas nós duas sabíamos que não havia outro jeito.
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Por trás da Máscara [CONCLUÍDA]
ChickLitMaria Madalena Vitorino de Almeida - Ou Madalena/Madá para os íntimos - está empolgada por ser a caloura em uma das melhores Universidades de artes cênicas do Rio de Janeiro. Claro que ela estaria mais empolgada se não tivesse se inscrito no curso e...