A PRAIA I

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O Natal estava se aproximando e sempre havia sido uma data que me deixava mais sensível, muito mais introspectiva, fazendo um balanço não só do último ano mas da minha vida num geral. Mas esse ano meu dezembro estava sendo bem diferente dos outros, acho que eu nunca havia me julgado tanto como dessa vez, refletindo sobre o que eu realmente estava sentindo por Caroline, ponderando todas as sensações que aquela mulher era capaz de fazer meu corpo sentir.

Menina. Ela era só uma menina.

Era bem possível que eu estivesse no auge da minha carência, eu nunca fui mulherenga, casei muito cedo com Stela e vivi a minha vida inteira pensando nela e apenas nela, nunca tendo olhos pra mais ninguém e quando ela foi embora... Eu nem sei que parte de mim que restou aqui, além da Dayane mãe acho que não havia me restado mais nenhuma outra parte. Eu passei a dedicar minha vida toda às minhas filhas e ao meu trabalho, não deixando sobrar tempo pra pensar em nenhuma outra coisa.

De fato eu não havia sentido falta de nada além da presença de Stela... Ela nunca foi uma mãe das mais exemplares, mas ela se esforçava pra isso e eu sabia que mesmo sendo meio desvairada ela amava nossas filhas tanto quanto eu e isso sempre me bastou e acredito que bastava para as meninas também.

Fora essa falta de ter alguém pra dividir o peso da responsabilidade de crias duas pessoas nas fases mais complicadas de pré e adolescência, eu sentia falta dela como minha esposa, como minha companheira, sentia falta dos seus cafunés pra me fazer dormir, mesmo sabendo que ela iria levantar pra continuar trabalhando e me deixar sozinha na cama. Stela amava seu trabalho mais que a ela mesma e eu compreendia que era o jeito dela e que não havia motivo para querer lutar contra aquilo. 

Ela era minha esposa. A mulher que eu escolhi e que havia me dado duas filhas lindas que faziam minha vida ser maravilhosa, eu jamais tive do que reclamar. O sexo era bom, acontecia sempre, mesmo com os anos passando a gente mantinha uma certa rotina bem acima dos casais de amigos que tínhamos que também estavam juntos há muito tempo. Eu tinha uma vida perfeita. Pelo menos eu achava que tinha...

— Mamãe, posso entrar? — Vivian me arrancou dos devaneios profundos em que eu me encontrava segundos antes dela aparecer no batente da porta do meu escritório.

— Claro, meu amor. Vem cá! — abri os braços convidando-a a sentar no meu colo, o que ela fez de prontidão — dormiu bem, mosquito?

— Sonhei com a mamãe... — ela disse receosa 

— E o que foi que você sonhou? — perguntei já com o coração na mão.

— Sonhei que ela passava o Natal aqui com a gente.

Um silêncio constrangedor se instalou naquele momento.

— Vivi, você sabe que a mamãe está morando bem longe daqui, não sabe? — ela assentiu com a cabeça — e é por isso e só por isso que talvez ela não venha novamente esse ano, mas isso não quer dizer que...

— Ela me ama — fui interrompida por ela — eu sei, mamãe. — Eu apenas sorri delicadamente pra ela tentando não deixar cair uma gota do liquido que se formava em meus olhos — mas eu sinto muito a falta dela.

Eu a abracei sem dizer nada e comecei um cafuné enterrando sua cabeça no meu peito podendo deixar as lágrimas caírem pesadamente. 

Não havia como negar o quanto eu sentia raiva de Stela por fazer isso com elas, desde que ela foi embora ela nunca mais voltou pra ver nossas filhas. No primeiro ano ela ligava sempre que podia, no segundo ano ela passou a ligar apenas nas datas comemorativas, nos anos seguintes ela simplesmente sumia durante quase o ano inteiro, às vezes se esquecendo até dos aniversários. 

A única que sabia disso era Letícia que já tinha idade pra lidar com aquilo, quer dizer, filho nenhum no mundo com qualquer idade que seja está preparado para lidar com a indiferença da mãe, mas com ela não havia como mentir, ela já era grande demais, esperta demais pra isso. Já Vivian era enganada sempre que eu podia, dizendo que sua mãe ligava em horários em que ela já havia dormido e que sempre se confundia por causa do fuso horário. Aquela desculpa ainda caía como uma luva.

Nua (G!P) Onde histórias criam vida. Descubra agora