Notas da autora: Tô doente e quando fico doente eu fico meio melancólica, então aguentem capítulo triste enquanto escrevo ouvindo minha playlist baixo astral.
Eu não podia, embora eu quisesse muito, me enganar com as coisas que minha filha me disse sobre o estado de Caroline, afinal, foi ela quem decidiu ir embora e acabar com tudo que tínhamos, assim como não atendeu minhas ligações e ignorou todas as minhas tentativas de ter uma conversa minimamente decente com ela sobre tudo que aconteceu naquele dia. Ela nunca mais quis saber de mim.
Eu estava desiludida por uma relação que mal chegou a acontecer, quão fodido isso poderia ser? Já havia se passado tanto tempo que eu me pegava questionando se tudo aquilo que ela dizia sentir, tudo aquilo que eu a via sentir não passava de um jogo do meu coração pra me deixar ainda mais fodida e miserável. Era assim que eu me encontrava naquele final de semana: completamente e irremediavelmente miserável. Abrindo gavetas de antigas tristezas que vinham em cima de mim com fome como uma tsunami que arrasta tudo que vê pela frente, destruindo toda e qualquer felicidade que eu poderia ousar sentir, desfazendo certezas e matando toda a esperança que eu vinha fazendo das tripas coração para ter de que algum dia eu deixaria de ser uma pessoa tão solitária e facilmente substituível.
Ouvia todas aquelas melodias que me acompanhavam ao longo dos meus quase quarenta anos tocando repetidas vezes e me afogando em cada pequeno sentimento que eu já senti por elas algum dia, como se nenhuma tristeza que eu já senti tivesse ido embora do meu corpo, estivessem apenas escondidas esperando por esse dia para reaparecerem e me mutilarem em incontáveis pedaços.
Eu amava Caroline. Amava e aquilo só me deixava ainda mais ínfima como se ela mal soubesse que eu existo, como se não houvesse manobra circense capaz de fazê-la me notar. Era um gosto amargo demais me sentir invisível e não ter ferramentas para contornar aquilo. Eu sentia raiva, meu estômago era esmagado por um sentimento devastador capaz de queimar por todo o meu esôfago num grito sufocado.
Por que diabos nossa situação tinha que ser tão complicado?! Por que diabos ela tinha que ser tão impossível de ter? Era assim que eu me sentia... Como se ela fosse completamente inalcançável, como se nosso amor fosse proibido de um jeito sem saída, sem nenhum tipo de trégua ou pena do universo.
Eu sei que causei boa parte disso, mas a quem eu queria enganar? Uma menina... Ela era só uma menina e como dizia o versa da canção que eu estava ouvindo: "...só uma menina, e eu pagando pelos erros que nem sei se cometi..."
O que será que eu fiz pra merecer tanto gosto amargo na boca por querer alguém que eu não posso ter?
Eu só conseguia tentar imaginar como ela andava se sentindo quando ninguém estava por perto, quando se trancava em seu quarto e tinha a solidão ao seu lado. Como ela se sentia nas noites de tédio? Será que esse vazio que me devorava estava degustando dela também?
Não. Ela deveria já estar nos braços de outra pessoa, com certeza. Eu também já fui jovem e sei o quão volátil os sentimentos podem ser nessa fase da vida. Caroline pensou que me amasse, talvez nem isso, eu mesma na minha infinita carência quis acreditar que ela me amasse, acreditei no gosto de seus beijos e no fundo daqueles olhos cor de chocolate, acreditei que eu era especial, mas eu nunca passei de uma pessoa com mais experiência que sabe foder na cama. Ela não seria a primeira e nem a última a estar comigo por causa disso. Talvez fosse apenas pra isso que eu servisse.
O que eu não daria para vê-la, nem que fosse de longe, nem que fosse só pra minha cabeça desistir de tentar me enlouquecer repetindo insistentemente de que nada foi real, talvez nem ela... Será que eu inventei tudo aquilo?
Meus pensamentos estavam embaralhados assim como a visão do mar à minha frente, já estava anoitecendo, o sol já havia se escondido atrás dos montes verdes e gigantescos como o nó que estava entalado na minha garganta. A garrafa de whisky na minha mãe estava pela metade e a maré continuava a subir. Eu não me importaria de passar a noite ali, sem nem ao menos me mexer, queria sentir a água me atingindo e tentando arrancar todo aquele sofrimento que eu tinha entranhado dentro de mim, mas estava bêbada demais para pensar em entrar na água naquele momento, então apenas me mantive ali torcendo para que a maré subisse o suficiente para uma pequena onda tocar os meus pés.
Eu queria sentir alguma coisa, qualquer coisa, qualquer coisa que não fosse aquela angústia, aquela saudade voraz e a imensa vontade de chorar. Eu queria chorar, mas eu tinha medo de nunca mais ser capaz de parar. De toda forma, depois de Stella chorar era uma tarefa incrivelmente árdua, talvez eu tivesse mesmo secado, não somente as lágrimas, mas secado absolutamente tudo como num deserto arenoso, terrivelmente febril e sem vida.
Deitei na areia fitando o céu que já estava totalmente escuro, nenhum vestígio da lua e das estrelas, era uma noite nublada e a brisa que batia já estava bastante fria, mas eu não me importei com aquilo, na verdade fazia mais sentido estar do lado de fora como estava do lado de dentro. Tentei enxergar a beleza daquele céu cheio de nuvens e procurei me lembrar de que as nuvens eram apenas algo entre eu e ele, impedindo que a gente pudesse se ver, mas ele estava lá atrás, assim como eu estava lá do outro lado, sorri com esse pensamento, lembrei de que sobrevivi a todas as rasteiras que a vida me deu, ferida, aos frangalhos vez ou outra, mas sempre sobrevivi pra encontrar as estrelas novamente.
A sensação daquele pensamento me trouxe um pouco de alívio e eu desejei violentamente que tudo aquilo que eu sentia por Caroline fosse embora... Mas a menor lembrança daqueles olhos me colocou de voltada à realidade, como numa porrada bem no meio da minha cara. Lembrar daqueles cachos flamejantes era como cair num abismo sem fim: frio na barriga, desespero e morte.
Era isso. Eu havia rodado todos aqueles pensamentos e sentimentos para chegar nesse único que conseguia realmente traduzir o meu estado nos últimos meses sem ela: morte.
Eu me sentia hediondamente morta sem ela.
A possibilidade de nunca mais tocá-la me enterrava viva numa amargura pavorosa, uma parte dentro de mim insistia em querer ressuscitar àquela altura da madrugada, como mato que cresce entre o asfalto, mas eu sempre fazia questão de puxá-lo tentando arrancá-lo pela raiz.
***
Já na minha casa de praia, após tomar um longo banho, desci para ficar na sala, deitei no sofá e liguei a tv na tentativa inútil de prestar atenção em alguma coisa. Já era tarde e eu estava torcendo para que o cansaço fosse me vencer em algum momento, mas o turbilhão de pensamentos ainda se mantinha ativo, as coisas andavam particularmente mais difíceis do que o normal, além de Caroline e toda a merda que rodeava aquela história ainda tinha todo o problema na agência que estava acabando comigo, cheguei até mesmo a pensar em vendê-la e começar outro negócio do zero, eu não estava mais suportando o embate que estava tendo meses a fio com aquele cliente, as coisas haviam mudado da água para o vinho, meu relacionamento com o vó dele era incrível e agora com ele tudo havia se tornado pesado demais e eu me perguntava constantemente o quanto aquele cliente ainda valia a pena, pois estava custando minha saúde mental que já não andava muito bem das pernas por causa daquela mulher que me assombrava.
Eu precisava de um tempo só meu, para me deixar ser fraca e confusa, rindo e falando em voz alta sem que uma das milhas filhas me visse naquele estado, vir à praia foi uma ótima saída pra isso e ali estava eu, sozinha, me deixando desabar completamente sobre as ruínas da minha vida sem me importar com nada a não ser continuar viva.
Era sexta-feira e eu havia dito que passaria o final de semana inteiro fora, só voltando no domingo a noite, eu teria duas noites inteiras para tomar fôlego e voltar para a minha rotina um pouco menos atordoada e eu estava disposta a fazer tudo que eu pudesse pra isso, estava insustentável viver da forma como eu estava vivendo nas últimas semanas, eu tinha uma empresa que eu custei toda a minha carreira para construir, eu tinha duas filhas que precisavam de mim e eu não poderia desistir.
Os pensamentos foram ficando cada vez mais cheios de lacunas, confusos, distantes, até que o descanso merecido havia chegado e eu adormeci, mas tive a impressão de sussurrar o nome dela antes do inconsciente tomar conta.

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Nua (G!P)
FanficDayane é uma mulher divorciada que vive totalmente para os filhos após descobrir uma traição de sua esposa. O trauma foi tão grande que rompeu todas as suas convicções sobre o amor. Ela nunca mais se interessou por ninguém, até sua filha trazer uma...