35| Passeio de fim de tarde

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Hoje já era sábado à tarde. Devido ao meu machucado, a madame mudou meu castigo para ficar somente no quarto, incluindo realizar as refeições por lá. Agora, saio apenas para aulas e  passeios de fim de tarde. 

— Nossa, que problemão você arranjou, Joy — disse Tiffany.

— Nem tanto, já estive em piores, acredite — admito.

—Tomara que a caminhada acabe logo e a gente volte lá pra dentro. Odeio ficar exposta ao ar livre — reclamou Liana.

Liana não parava de se abanar e espantar os insetos que se aproximavam dela.

O dia, apesar de cinzento, estava com uma temperatura amena e agradável. Nem tão frio, nem tão quente. Um solzinho tímido aparecia entre as nuvens, e o nível de poluição no ar estava baixo.

Estávamos em uma trilha com outras garotas e a Madame Monclair. Chegamos na parte anterior do Castelo, num pequeno pátio com mesinhas, bancos e guarda-sóis.

Nos posicionamos e Liana já colocou seus óculos escuros.

— Essa é a melhor vista — cantarolou Tiffany.

— Mas não tem nada, apenas arbustos e um celeiro ali na frente. Além dos caminhões de carga, ali atrás. — disse eu.

— Ah não, Tiffany está falando dos garotos trabalhando — explicou Liana.

Tiffany me lançou um sorriso preguiço.

Percebi que não era só ela, a maioria das garotas se juntava perto do cercadinho para observar os jovens trabalhando.

— Isso é tão tosco — disse Liana.

— Eles estão só trabalhando  — digo.

— Eles são uns piteis. Vem cá, Joy — chamou Tiffany.

Me aproximei dela.

— Sabe aquele mais alto de cabelo escuro? Ele é o Joe. Aqueles ruivos são Petter e Derek, o bronzeado é o Luke e por fim, Eric, o loirinho. — mostrou.

Eric. Senti uma ardência nas bochechas, estava corando. 

Lembrei de Carter em seguida e percebi que esse tipo reação me levaria a um final errado.

Voltei para realidade.

— Como sabe disso? — pergunto.

— Ah, digamos que as informações correm rápido por aqui — respondeu Tiffany.

Tiffany estava tão entretida, que precisava se abanar de cinco em cinco minutos.

— Cora está de olho no loirinho, o Eric — cochichou Tiffany.

— Está? — digo, rápido demais.

— Sim, mas como sabe, não podemos namorar. Pelo menos não aos olhos de todos, se é que me entende.

— Aham — respondi.

Conforme ficamos ali, percebi que estava tempo demais admirando Eric.

Ele reparou e logo virei o rosto, para disfarçar.

— O que aconteceu na sua mão? — perguntou Tiffany.

— Foi lavando a louça, mas está tudo bem, estou cuidando — contei.

— Precisa tomar mais cuidado, damas não podem aparecer machucadas em público. É feio — comentou.

— Feio?

— Sim, é deselegante. Não passa uma boa imagem, parece que não temos modos.

— Mas foi um acidente, além do mais tinha motivos pra isso acontecer.

— Eu sei. Só estou dizendo — disse ela, e se deslocou para mais próximo da cerca.

°°°

Tinha planejado uma forma de escapar daqui.

Estava agora a caminho da dispensa, no andar de baixo, para avisar Eric.

— Eric? — o chamo.

— Jo... Dayse — diz confuso.

— Tudo bem, agora que já sabe pode me chamar de Joy — digo.

— Joy, o que foi? Aconteceu algo? — pergunta, colocando outros sacos de arroz de lado.

— Tem um minutinho? É importante — peço.

— Me acompanhe — acena.

Voltamos para aquela saleta, do dia em que ocorreu toda confusão.

— Decidi como vamos partir.

— Ótimo, e como será?

— Na próxima falha da fornalha. Estou com tudo pronto, arrumei o mínimo que trouxe para partir. — explico.

— Por onde a gente vai sair? E como vamos fazer para embarcar num avião?

— Calma. Eu recuperei meu passaporte , mas provavelmente a Madame vai notar isso. Por tanto, essa fornalha tem que dar problema o mais rápido possível. Vamos sair pela portinha que você pega a carga do caminhão. Decorei o mapa do nosso distrito, tem uma estação ferroviária aqui perto, podemos chegar lá a pé. Pegando o trem, vamos para o próximo distrito. Seguiremos ao norte de trem também. De lá fica mais fácil continuar subindo para Pandora, vamos de barco. Entrando lá, não teremos mais problemas. — finalizo.

— O.K. Acho que posso dar um jeito na fornalha. Amanhã cedo esteja pronta, desça aqui o mais rápido possível.

— Eles só liberam minha saída pra cozinha às 6:00 horas. Antes é impossível.

— Tudo bem, então esteja aqui às 6:10.

Inspiro fundo.

Teria que contar muito com a sorte, mas provavelmente daria certo.

— 6:30, é menos arriscado. 

— Então esteja aqui às 6:30.  Outra coisa também, você sabe, assim que perceberem que sumiu vão espalhar seu rosto pelo distrito inteiro — avisou.

—  É de se esperar. Mas planejo não mostrar meu rosto, e também espero estar longe daqui. — digo.

— Até amanhã, Joy — diz, e volta a seu trabalho.

Voltando para minha solitária, peguei as malas debaixo da cama e comecei a arrumar as coisas.

Como eu não trouxe muita coisa, seria fácil  separar o que levar. Peguei a menor maleta de mão e fui colocando primeiramente as facas. Eu as priorizava mais, nunca se sabe o que vamos encontrar pela frente. 

Depois, peguei uma calça, um casaco, roupas intimas e uma echarpe de lã. Colocaria uma roupa confortável por baixo do uniforme amanhã. Como passaria pela dispensa, pegaria frutas, cereais e água. 

A maleta, apesar de espaçosa, era pequena. 

Tinha tudo organizado, agora só precisava dormir, pois provavelmente seria minha ultima noite boa em algumas semanas.

Deadly Mirrors - 1° Rascunho - CONCLUÍDAOnde histórias criam vida. Descubra agora