21 - Victor Hugo

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- Quando vai me apresentar sua garota? – Fabio me perguntou quando parei nossa conversa para responder uma mensagem de Mortícia na rede social.

No último mês as coisas entre nós, Edith e eu, têm ficado mais sérias á ponto de eu já ter conhecido os avôs dela, isso tinha sido pelo acaso de eu ir fazer uma surpresa e o casal de idosos entrarem no elevador saindo no mesmo andar que eu e indo bater na porta do apartamento dela, sendo recebidos por uma mulher negra de cabelos tingidos de loiros.

- Tia Rose! – ela gritou estendendo a mão para a senhora – Sua benção, tia.

- Que os deuses te abençoem e os anjos te guiem pelos caminhos da justiça e do amor, minha filha – disse a mulher idosa beijando a testa da mulher que havia se curvado para receber o carinho, aquela tinha sido a benção mais longa que já ouvi.

- Seu Abel, boa noite – cumprimentou o homem e se virou para mim enquanto o casal idoso entrava no apartamento, eu tinha verificado se estava no andar certo – E você seria?

- Sou Victor Hugo – ela nem sequer reagiu ao meu nome – Vim visitar Edith.

Ela me olhou dos pés a cabeça com desconfiança antes de me mandar esperar e fechar a porta, menos de um minuto depois Edith veio me receber dando risadas da amiga por fechar a porta na minha cara. Joana, a mulher negra com cabelos loiros, se desculpou por sua reação, ela não me conhecia e nunca tinha ouvido meu nome.

- Não tínhamos nada marcado para hoje, tinha? – Edith questionou olhando para mim.

- Eu pensei em te fazer uma surpresa e vir convidá-la para jantar.

- Sexta-feira? Desculpe, mas só estou disponível aos domingos e segundas.

- Mesmo? Eu não sabia.

- Você não perguntou.

- Esse não é o tipo de pergunta que se faz num encontro, Eddie – seu Abel, avô dela, criticou bem humorado – No meu tempo a gente costumava perguntar número do CPF, da conta bancária, tipo sanguíneo e a crença religiosa para não correr o risco de estar cortejando uma bruxa á procura de um virgem para rituais satânicos.

Estávamos discutindo na sala e todos os presentes nos ouvindo o bastante para se meter na conversa e ainda zombar de nós, Mortícia riu antes de se juntar ao avô:

- Verdade, hoje em dia se pede só contato de rede social por onde a gente obtêm todos os dados da possível vítima para nossos rituais sinistros.

Edith me puxou para seu quarto naquela noite nos trancando longe dos risos, a família dela estava muito divertida em zombar dela ao que ela me explicou que fazia tempos que não apresentava ninguém para eles e Mortícia usava o termo namorado da Ed para falar de mim. Eu gostei daquilo e peguei para mim, agora eu era o namorado dela e como ela não fez recusa assim ficamos.

Sua justificativa para estar disponível para sair comigo apenas nas segundas e domingos era por causa do seu trabalho. Ela já tinha tentando me convencer que era chefe de uma casa noturna uma vez que lhe ofereci emprego, resolvi não bater mais nessa tecla. Se ela dissesse que era hostess ou cantora de alguma casa de show eu acreditaria, mas chefe de segurança?

Ela tem um apartamento excelente e bem localizado num bairro decente de classe média, dirige um carro de luxo, nunca fala sobre seu trabalho á menos que seja para usá-lo como justificativa para me evitar, mais de uma vez já a escutei dizendo coisas como "deixa que os advogados resolvam" ou "não se preocupe com os custos, papai é rico", não consigo olhar para Edith e ver uma motorista sequer consigo criar uma imagem dela como chefe de segurança numa casa noturna.

Edith não é mimada e superficial como uma jovem entrando no mundo dos adultos que ainda esperam resolver tudo com um pouco de coragem e teimosia, contudo, ela é orgulhosa e independente demais para admitir que precise de algo, eu acredito que ela não goste de se ver como a namorada do cara rico que depende do dinheiro dele e é infinitamente mais simples aceitar o apoio financeiro da família.

- Não a chame de garota – respondi para Fábio – Ela é uma mulher e se chama Edith.

Ou Eddie ou Ed que é como a família dela a trata, até mamãe a chama de Eddie com uma intimidade intimidadora, ela me corrigiu uma vez quando a chamei de minha gata, e pediu que a chamasse de Edith ou qualquer variação de seu apelido que no geral eram corruptelas diminutivas do seu nome, ela não gostava de ser chamada por substantivos ou adjetivos.

- Deus do céu – Fábio riu – Que diferença faz a chamar de garota ou mulher ou Edith? Dá tudo na mesma.

- Ela não gosta de ser chamada de garota e ela não é uma.

- O que? Vai falar que aquela morena toda é macho? – ele arregalou os olhos.

Dai-me paciência, reviro os olhos antes de explicar:

- Não seja lerdo. Ela não gosta de ser tratada como garota por que soa como se ela fosse uma adolescente e não uma adulta.

- E as mulheres não gostam quando são vistas como mais jovens do que realmente são?

- Não Edith, ela tem 28 anos e prefere ser tratada de acordo com sua idade em vez de ser vista como uma garota de dezoito.

Fábio riu alto quase caindo da cadeira.

- Dentro de dez anos ela vai querer que pensem que ela tem 28 ainda – ele debochou entre risos.

Não, talvez quando passar dos cinquenta ela pare de mencionar sua idade, mas não acredito que seja por sua vaidade e sim para evitar descrença. Se ela me dissesse que tem vinte eu acreditaria pelo simples fato de que ela aparenta ser mais nova do que é e por que eu vi a mãe dela, a mulher parece ter congelado nos trinta anos.

A curiosidade de Fábio por Edith está se tornando cansativo, tenho a impressão que ele esperava que eu nunca mais me envolvesse com alguém ou que minha relação com Edith fosse invenção minha. Eu disse que já se conheciam, mas ele desconsiderou a recepção de Luís como uma apresentação já que os dois não foram formalmente apresentados e por que na época ela e eu não estávamos juntos. Vencido por sua insistência eu cedi.

- Vou marcar um jantar para domingo lá em casa – parecia informal o bastante para mim.

- Não precisa, podemos jantar hoje mesmo no LaRue.

- Edith só pode no domingo ou segunda.

- Por quê? – meu amigo fez uma careta – Ela é uma daquelas loucas por regime que só podem comer duas vezes por semana?

- De onde você tira essas bobagens? – ri da idiotice da ideia.

- Sophie uma vez começou desses regimes em que só podia tomar água nos dias terminados em feira, nos fins de semana ela podia comer alguma coisa fitness.

Só Sophie para fazer uma merda dessas para ficar mais bonita, como se ela precisasse de regime, vive na academia. Eu não sei se Edith faz regimes, mas ela está sempre em forma. Talvez fizesse ioga, toda aquela flexibilidade devia ser resultado de algum treinamento, sei que ela não frequentava academia nem praticava esportes por que disse numa de nossas conversas aleatórias que ficava cansada só de ver as pessoas se exercitando.

- Vamos trabalhar, Fábio – enxotei ele e sua curiosidade da minha sala.

Não falo com Edith com tanta frequência assim, principalmente quando o fim de semana começa a se aproximar, então ela muda para mensagens e tende a ignorar toda ligação que recebe isso quando o celular não passa o dia todo desligado, quando ela faz isso eu troco mensagens com Mortícia que me deu seu contato para que eu não me preocupasse caso a irmã encerrasse alguma ligação e passasse o dia incomunicável, fazia isso quando começava a ficar grosseira demais para manter uma conversa civilizada.

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