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O corpo de Apelathei despencou, acertando o chão com tudo. A cabeça do demônio bateu no piso de mármore e sua visão escureceu automaticamente. Gosto de bile e sangue tomou conta do interior da boca dela numa combinação que a faria vomitar se houvesse alguma coisa em seu estômago. Cada parte do seu corpo doía de uma forma diferente e torturante, e ela teria gemido de dor se tivesse forças para isso.

Apelathei sentia tanta dor — e infelizmente não era apenas física.

Lipotak estava morto, seu irmão estava morto. Miguel tirara dela a única pessoa que ficara ao seu lado milênio após milênio. Ele arrancara Lipotak dela da maneira mais covarde possível, como somente ele sabia fazer.

O arcanjo pousou ao seu lado, e, diferente dela, seu corpo caiu com cuidado no chão, os pés fixos no mármore sob eles. Ela ouviu o farfalhar do metal das asas de Miguel — e desejou poder arrancar pena por pena com um alicate. Ouviu quando as penas começaram a encolher e se recolherem de volta para dentro da carne do anjo, escondidas e protegidas.

A visão de Apelathei estava embaçada — tanto por causa da pancada na cabeça quanto pelo sangue que cobria seu rosto e cílios —, mas ela conseguiu ver o vulto de Miguel se abaixando e agarrando um dos seus pés. Ele começou a arrastá-la sem o menor cuidado para dentro de sabe-se lá o quê. O corpo dela foi puxado escadaria acima, escadaria abaixo, por um corredor, em seguida outro, até uma sala escura e fria.

Apelathei se esforçou para tentar reconhecer seu cativeiro. O chão, assim como o da possível entrada, era de mármore preto. As paredes — altas e sem janelas — eram de concreto liso, sem pintura ou qualquer tipo de decoração. Havia tochas nos cantos, iluminando precariamente o cômodo — que era maior do que ela imaginava.

Miguel parou e largou o pé de Apelathei por um instante. Ela respirou, inalando o odor do próprio sangue. Dor lambeu seu couro cabeludo quando Miguel a pegou pela raiz do cabelo, erguendo sua cabeça daquela maneira. Apelathei reprimiu um gemido. Ele aproximou o rosto do dela, afastando com cuidado o cabelo úmido de sangue de sua testa, limpando um fio de sangue da sua bochecha.

— Eu estava realmente ansioso para trazê-la aqui — murmurou docemente o arcanjo.

Apelathei, em toda a sua sabedoria, fez exatamente o que sabia que não deveria: irritou ainda mais Miguel. Com uma precisão quase cirúrgica, ela cuspiu na cara do arcanjo, deixando uma mancha considerável do seu sangue no rosto dele, bem no meio dos olhos.

Uma risada baixa e meio rouca saiu dos belos lábios dele, que não se deu ao trabalho de limpar o sangue dela do rosto. Miguel apertou ainda mais os dedos dentro do cabelo de Apelathei, e ela precisou se esforçar duas vezes mais para não deixar um gemido de dor escapar.

Agora estamos começando a nos entender — disse ele.

Com a mão livre, Miguel segurou a garganta de Apelathei, erguendo-a do chão. Ar parou de entrar ou sair dos pulmões do demônio, e sua visão já comprometida ficou ainda pior. Ele arrastou Apelathei com passadas rápidas até um canto e a largou violentamente. Gritou com alguns anjos, que surgiram do nada e seguraram os braços dela.

Apenas alguns segundos depois, Apelathei estava de joelhos a alguns metros de uma parede, com as duas mãos algemadas a correntes grossas, cada uma em uma extremidade da sala. As correntes impediam que ela fosse muito para frente ou muito para trás. Seus joelhos quase não tocavam o chão, e ela estava mais pendurada do que realmente ajoelhada.

Ela ouviu o som de metal sendo arrastado pelo mármore e não precisou pensar muito para descobrir o que era.

Miguel parou atrás dela, respirou em sua nuca e, com mãos furiosas, rasgou a sua camisa. O tecido praticamente cedeu a ele, deixando as costas de Apelathei à mostra. Não houve qualquer prenúncio da parte de Miguel. Ela apenas ouviu o metal cortando o ar — e sentiu o chicote cortando a sua carne.

Guerra dos CelestiaisOnde histórias criam vida. Descubra agora