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As batidas suaves, mas firmes, na porta acordaram Apelathei em um sobressalto. Ela arregalou os olhos e se debateu, sem saber momentaneamente onde estava. Quando se deu conta da camisola preta de seda escorregando suavemente por sua pele recém-restaurada submersa em uma mistura feita por Sagara foi que se lembrou e acordou completamente.

Apenas uma brecha da porta foi aberta, e o rosto de Lukka surgiu parcialmente. Ele não olhou para mais nada além do rosto de Apelathei, abrindo um sorriso discreto e meio culpado, mas empático.

— Desculpe, eu acordei você? — perguntou em tom baixo.

— Sim — felizmente, ela completou mentalmente. — Mas está tudo bem.

Lukka pigarreou.

— É... você se importa se eu... bom, será que eu posso...

— Entre.

Apelathei fechou os olhos. O som da madeira sendo cuidadosamente empurrada chegou aos seus ouvidos, assim como o som das dobradiças rangendo e dos passos de Lukka vindo até ela. O barulho das botas de couro da gárgula pisando no chão de mármore com cuidado parou à sua direita, e ela abriu novamente os olhos.

— Posso...? — pediu ele, apontando para uma cadeira de madeira escura e entalhada perto da banheira.

— Sim, Lukka, pode se sentar.

Lukka ergueu a cadeira — que era mais pesada do que parecia, mas não parecia pesar quase nada para ele — e, com tanto cuidado quanto o usado ao entrar no banheiro, colocou-a perto da borda da banheira, se sentando a uma distância boa, mas não totalmente impessoal, de Apelathei.

Tanto o Descido quanto a Caída ficaram em silêncio, apenas ouvindo as respirações um do outro. Apelathei fechou os olhos mais uma vez e balançou suavemente as pernas enquanto boiava — como um cadáver — dentro da banheira que mais parecia um caldeirão, sentindo pétalas de rosas, galhos de alguma planta, ervas, flores e outras coisas da flora arranhando sua pele. Seu corpo já não doía nem ardia mais, mas sua mente ainda estava um turbilhão bagunçado e destruído.

— Hum... — começou Lukka, baixo, como se estivesse desconfortável por ter que iniciar uma conversa. — É curioso isso, essas plantas e a água... Achei que a bruxa pudesse curar você com um toque, como fez com seu irmão em Moscou. — Ele parou, pigarreando novamente e passando uma mão pela nuca, como se não soubesse exatamente o que fazer a seguir.

— Elas chamam de O Toque de Amor — explicou Apelathei, ainda com os olhos fechados. — O nome, obviamente, é irônico, já que o toque é doloroso. É como dar uma parte da sua própria saúde a outra pessoa. Poucas bruxas fazem isso, porque ele abaixa significativamente o sistema imunológico delas. Sagara fez uma cortesia a Lipotak. Não achei que houvesse necessidade de fazer o mesmo comigo, então ela achou uma alternativa para me curar mais rápido. — Ela soltou uma risada fraca, sem humor. — Parece que a minha recuperação celular avançada não está mais tão avançada assim. E como eu fiz "questão de foder com o meu couro", como disse Lipotak, não dá para saber em que nível minha cura diminuiu.

Ela abriu os olhos, virando o rosto para a direita e olhando para o rosto de Lukka. A gárgula estava com o cenho levemente franzido e balançava a cabeça, concordando.

— Bem, eu... nunca tinha visto uma bruxa fazer aquilo. — Ele riu. — Foi meio que... assustador.

Apelathei abriu um sorriso e virou o rosto para o teto, encarando o nada.

— Acho que, no seu ramo de trabalho, você apenas mata as bruxas, não as estuda. — Os dois ficaram em silêncio por alguns instantes, então Apelathei concluiu: — Se parasse um pouco com o derramamento de sangue e prestasse alguma atenção nos seus inimigos, veria que todos nós temos certas peculiaridades.

Guerra dos CelestiaisOnde histórias criam vida. Descubra agora