Lilian olhava-se naquela intrincada redoma de vidro, que graças a sabedoria e habilidade dos venezianos, havia sido transformada no que hoje é tão disputado e agraciado pelas damas da alta sociedade: um espelho. Nada aplaca a podridão da alma, como uma boa imagem refletida no espelho. Era a própria descrição da sociedade londrina, todos absortos em austeridade, legitimidade, riqueza e é claro, nenhuma liberdade. A perfeição imaculada.
Viu-se refletindo, os cabelos castanhos escuros, quase pretos, olhos âmbar como os de sua mãe. Não era estranho que fosse questionada, e taxada como a réplica da condessa. Jaqueline, sua mãe, a escandalosa e francesa, porém ainda condessa de Doncaster, tinha qualidades inestimáveis, do tipo que não valia enumerar para a sociedade inglesa, tudo o que enxergavam nela, era uma mulher de humores volúveis, de classe duvidosa, e gosto impecável, que enredou um conde, e casou-se primeiro em sua terra para depois oferecer um lampejo matrimonial aos ingleses. Sua mãe era... Sua mãe é, tudo que ela sempre desejou ser de alma, mas que de fato nunca conseguiria. É preciso muita coragem para adentrar os bailes recheados de matronas de língua afiada. Sua mãe fazia questão de ser o assunto, e revoltava-se quando o conde não escandalizava os salões com ela.
Lilian sorriu, e rogou aos céus que a energia de sua mãe atravessasse os mares e terras, e chegasse a galope para invadir sua alma, precisaria de toda ajuda possível. Era chegada a hora de encenar o seu maior papel.
Saiu do seu quarto na residência dos Montgomery e desceu as escadas sinuosas para encontrar Claire e seus tios, visconde e viscondessa de Montgomery. O caminho até o baile fora repleto de olhares agradecidos de Claire, que assim que adentrou o salão, pôs-se a dar um aperto em seu braço e sussurrar em seu ouvido.
- Que Deus a abençoe imensamente, prima.
Lilian virou-se para responder, mas Claire já estava em outro mundo. Daniel havia chegado. E caminhava perigosamente em uma linha que certamente o faria chegar à Claire.
Claire o olhava fascinada, verdadeiramente apaixonada, devotada àquele que deu a ela a possibilidade de algo mais que um casamento amistoso. Talvez por esse motivo, ela não vira seu duque amistoso chegando. Lorde Kahn tinha um sorriso leve no rosto, um olhar carinhoso, tão diferente dos olhos selvagens de Daniel. Lilian poderia suspirar por aqueles olhos que imitavam a maré no inverno. Um suspiro foi o que bastou para atentar-se a chamar a atenção de Claire com um leve aperto em seu braço. Triste que Lorde Kahn tenha vencido a corrida e chego primeiro até a elas, o pobre homem não sabia que estava vencendo todas as batalhas erradas.
- Lorde Kahn. – Ambas inclinaram a cabeça em direção ao duque, que respondeu com um aceno.
- Lady Claire.
- Oh, perdão. Recorda-se da minha prima, Lady Lilian Doncaster.
Lilian percebeu com certo divertimento quando o duque fez a associação do nome. Isso nunca a abandonaria.
- Percebo que vossa graça compreendeu de quem se trata o imponente Doncaster. – Lilian se sobressaltou surpreendida por Daniel que brotara entre ela e sua prima. Ela o olhou divertidamente e balançou a cabeça com descaso.
- Imaginei apenas que com o passar dos anos isso não fosse mais lembrado.
Lilian pensou em responder que independente dos anos um escândalo era um escândalo, e que quando alguma parte envolvida fazia questão de manter comentários, não importavam os anos, a fofoca permaneceria viva. Abriu a boca para comentar quando avistou um amigo.
- Ora Lorde Baker, que falta de educação escutar a conversa dos outros. – Daniel pegou a mão de Lilian e a beijou, piscando o olho ao fazê-lo. Um desgraçado encantador.
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Jamais engane um duque
RomanceLilian decididamente não queria ter nada a ver com a sociedade londrina e suas restrições, não necessitava ser aceita, não desejava ser aceita e o melhor, não precisava, tinha inteligência, fortuna e amor o suficiente de sua família para jamais prec...