Eu tenho essa sensação, sim, você sabe
De que estou perdendo todo o controle
Porque há magia em meus ossos
Eu tenho essa sensação em minha alma
Porque há magia em meus ossos(Bones - Imagine Dragons)
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Alexia sentia-se exausta. O cavaleiro de Peixes parecia realmente ser tudo aquilo que diziam sobre ele: rude, arrogante e orgulhoso. Talvez fosse por isso que estivesse sempre tão sozinho. Irritava-a profundamente a forma como ele sempre a desafiava, como quando dissera para se levantar e tentar caminhar — e irritava ainda mais quando ele tinha razão! Era um misto de frustração e desconcerto que a fazia questionar o motivo de se importar tanto.
Já estava quase pegando no sono, depois de muito se incomodar com as roupas sujas pinicando sua pele e com a poeira dos lençóis, quando ouviu batidas leves na porta.
— Ainda está acordada? — a voz mansa de Albafica soou abafada pela madeira da porta.
— Estou. — respondeu, com um tom surpreso. Ele então abriu a porta lentamente, colocando apenas meio corpo para dentro.
— Pegue essa túnica. É minha. Vai ficar um pouco grande, mas imagino que seja melhor do que dormir com roupas sujas. — ele lhe estende a peça, e Alexia levantou-se de imediato, indo até a porta para pegá-la.
Seu olhar foi atraído para o dele, e por um instante Alexia pensou enxergar ternura nos orbes azuis. No entanto, lembrava-se bem do tom cortante de suas palavras horas atrás. Ele não a queria por perto; deixara isso bem claro. Ainda assim, havia algo em sua expressão que não combinava com a frieza de antes.
— Obrigada e... boa noite. — murmurou, rompendo o contato visual.
— Boa noite. — respondeu ele, recuando e fechando a porta.
Alexia soltou a respiração que nem percebera estar segurando e dirigiu-se à suíte do quarto. Lá, tomou o banho mais rápido e gelado de sua vida, apenas para livrar-se do suor e da poeira acumulados no dia exaustivo. Vestiu a túnica que Albafica lhe dera, que realmente ficara grande, mas era incrivelmente confortável. Deitou-se novamente, o corpo agradecendo o alívio do cansaço, e caiu no sono quase imediatamente, embalada pelo perfume suave de rosas que impregnava a túnica. Era como se ele estivesse ali, ao seu lado.
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Um brilho intenso fez Alexia abrir os olhos. Mas, ao fazê-lo, não estava mais no quarto. Viu-se imersa em um vazio absoluto, onde pontos de luz dançavam acima de si em uma psicodelia ordenada. Algo estranho queimava dentro dela, crescendo como uma onda que tomava todo o seu ser. Olhou para as próprias mãos e viu, para seu espanto, que podia enxergar através de si mesma. Seu corpo parecia ter se fundido àquela matéria brilhante e etérea.
O medo a tomou. Quis gritar, mas sua voz não lhe atendia. Quis mover-se, mas era como se não tivesse controle sobre o próprio corpo. Finalmente, parou de tentar resistir. Rendeu-se àquele vazio, anestesiada pelo silêncio absoluto e pela energia que parecia envolvê-la e consumi-la.
De repente, as luzes ao seu redor tornaram-se mais nítidas. Olhando para cima, Alexia percebeu que formavam uma constelação. Fascinada, esticou a mão translúcida para tentar tocá-la, e o universo pareceu eclodir à sua frente. Estrelas, planetas, galáxias. Era uma visão de tirar o fôlego.
Então, uma voz começou a chamá-la. No início, era um som distante e abafado, mas foi crescendo, ganhando clareza. Era um som humano, atravessando a bolha onde Alexia estava submersa. O brilho das estrelas intensificou-se, tornando-se tão ofuscante que ela precisou fechar os olhos. Quando os abriu novamente, a luz havia sumido. Estava de volta à casa de Peixes, o coração disparado e o corpo banhado em suor.
— Alexia, está tudo bem? Sou eu, Albafica. O que está sentindo? — a voz dele era grave e carregada de preocupação.
Ainda atordoada, ela ergueu os olhos para encará-lo. E, nos olhos azuis dele, viu o mesmo universo que havia testemunhado em seu sonho — ou seja lá o que fosse aquilo, parecia real demais para ser apenas um sonho. Estava confusa, desnorteada, sentia seu corpo quente como uma febre letal, e não sabia por onde começar a explicar. Em vez disso, tomou a única atitude que seu instinto permitiu: lançou-se para frente e o abraçou com força.
Albafica hesitou, completamente surpreso. Por um momento, seus braços permaneceram imóveis, mas então ele cedeu, envolvendo-a em um abraço delicado. Suas mãos repousaram em suas costas, tentando transmitir a segurança que ela parecia buscar.
— Está tudo bem. — disse ele, com uma suavidade que ela nunca havia imaginado ouvir de sua voz. — Foi só um sonho ruim. Você está segura aqui.
Alexia apertou os braços ao redor dele, como se temesse que ele pudesse desaparecer. Guardaria aquelas palavras para sempre.
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Quando o sol raiou, já recomposta, Alexia sentou-se à mesa enquanto Albafica retirava a água fervente do fogão e coava o café. O cheiro acolhedor espalhou-se pela pequena cozinha, trazendo à mente memórias de sua casa em Rodório. Sentiu um aperto no peito ao pensar nos pais, que certamente deviam estar preocupados. Precisava voltar para casa o mais rápido possível. Ainda assim, desde a noite anterior, havia algo diferente em como se sentia na casa de Peixes. Não era mais o desconforto de antes; era algo mais profundo, como se Albafica, mesmo sem perceber, começasse a derrubar os muros que o isolavam.
Ele serviu o café em duas canecas de cerâmica rústica, estendendo uma para ela, e Alexia pegou um dos pãezinhos da cesta no centro da mesa.
— Obrigada por cuidar de mim. Não sei que sonho foi aquele. — diz, mordiscando o pão. — Não costumo ter pesadelos.
— Talvez... — ele hesitou, escolhendo as palavras com cuidado. — Talvez a aura do Santuário tenha te afetado de alguma forma. Imagino que nunca tenha passado tanto tempo por aqui antes.
— É, nunca passei. — concorda, enquanto franzia a testa, pensativa — Preciso voltar. Meus pais devem estar preocupados.
— Sente-se bem para andar tudo isso? — pergunta ele, o tom genuinamente preocupado.
Alexia arqueou uma sobrancelha. Por que ele se importava, agora?
— Sim, eu dou conta. — responde, tentando soar confiante.
Terminou o café rapidamente e retirou-se para o quarto onde passara a noite. Ainda vestia a túnica que Albafica emprestara, mas precisava trocar-se. Vestiu as roupas do dia anterior, sacudindo o pó acumulado, e foi até o espelho para ajeitar o cabelo. Quando levantou o rosto, porém, o sangue gelou em suas veias. Em seus olhos, ainda estava presente aquele brilho estranho, como se carregassem as mesmas estrelas que vira antes. A visão a deixou tensa. O que estava acontecendo? Precisava sair dali o quanto antes.
Com a mochila jogada nas costas, voltou à sala. Albafica a esperava na entrada da casa, e Alexia tentou afastar o nervosismo que ainda a assombrava. Ele abriu a porta e, mais uma vez, perguntou:
— Tem certeza de que está bem para a caminhada?
— Sim, não se preocupe comigo. — diz, tentando soar despreocupada — Obrigada pelo café... e pela paciência.
— Não foi nada. — responde ele, os olhos azuis prendendo os dela por um momento — Se cuide.
Alexia não queria quebrar o contato. Era como se houvesse algo ali, algo que a conectava a ele de uma forma inexplicável. Guardou cada detalhe daquele rosto — os traços perfeitos, a gravidade serena — como se quisesse gravá-lo para sempre na memória. Por fim, assentiu e virou-se, descendo os degraus da casa de Peixes com passos lentos. Daquela vez, tinha certeza de que não voltaria mais.
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A Nova Rosa
FanfictionEscolhida pelas estrelas e marcada por um destino que jamais imaginou, Alexia Cattelan, uma jovem simples da vila de Rodório, vê sua vida transformar-se quando desperta seu cosmo e descobre ter sido escolhida pela constelação de Peixe Austral. O cha...