O cravo saiu ferido

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Eu estava aqui o tempo todo
Só você não viu

(Na sua estante, Pitty)

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Ela simplesmente não conseguia reagir. Não sabia como. O cavaleiro continuou falando algo à sua frente, mas ela só via a boca se mexendo, não ouvia nada. Só ouvia a palavra banida. "Agathia, você está banida do Santuário de Atena". O quê poderia dizer em sua defesa? O que poderia justificar?

Havia perdido.

Dohko falava, e Albafica estava a seu lado, assentindo a tudo com a expressão de quem achava aquilo justo. Não era justo! Porque ele não a enxergava? Ele devia protegê-la, e não ser mais um de seus algozes. Ele deveria estar segurando o teto sobre sua cabeça, impedindo-o de cair.

Suas pernas tremeram, sentiu-se fraca e sentou-se no banco de pedra da enfermaria. As lágrimas inundaram seu rosto, e ela chorou em silêncio, enquanto seus pensamentos se chocavam. Albafica devia estar ao seu lado, como estivera presente no pior dia de sua vida - o dia em que o pai morreu.

Foi durante a guerra interna do Santuário contra o cavaleiro de gêmeos. Um ataque atingiu o vilarejo, tão próximo do conflito. Foi um caos de pessoas assustadas, correndo, gritando e chorando. Casas desmoronaram e pessoas desapareceram nos escombros - entre elas, seu pai. Ela ficou presa num pequeno buraco, uma bolha entre os escombros, de onde não conseguia sair, e que podia ceder a qualquer momento. Não restou opção além de chorar, já havia perdido tudo. Sequer conseguiu ver o rosto do pai e ouvir suas últimas palavras, apenas via sua mão estendida, o restante do corpo estava todo soterrado.

E então ele apareceu. Levantou a parede que a aprisionava ali, permitindo que a luz do sol a iluminasse. Era como um deus naquele momento em que ela pensara que não havia saída além da morte. "Fique calma", ele disse. "Estou aqui para ajudar". Quando pensou que estivesse só, Albafica lhe apareceu e salvou sua vida. Porque não a enxergava agora?

– Eu sinto muito, Agathia. – disse Dohko.

Ela acenou a cabeça, um gesto quase imperceptível. Albafica se despediu, pedindo licença e indo embora. Voltando para sua casa e para sua protegida. Deixando-a desamparada. Sem outra opção, Agathia se levantou em silêncio e seguiu caminhando para Rodório.

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Anoiteceu, e ela continuava sozinha. Chovia lá fora, aumentando sua angústia, ecoando o vazio que sentia e deixando a casa mais fria. Não tinha amigos nem família próxima, ninguém viria perguntar como ela estava. Poderia definhar ali e só se dariam conta quando sentissem o odor pútrido de seu cadáver. Ao menos era o que pensava, quando ouviu batidas na porta. Talvez fosse algum mendigo que pediria uma bebida quente, e ela não se incomodou em atender. Se sofria, que todos sofressem também. Ninguém a ajudava, então não ajudaria ninguém.

– Caramba, o que te aconteceu, garota?

Agathia procurou o dono daquela voz, surpresa, mas não o suficiente para se levantar daquele colchão velho. No escuro, reconheceu a silhueta de Lucca por sua altura e pelos cabelos rebeldes.

– Essa casa está parecendo um mausoléu. – disse ele – Onde tem velas?

– Na gaveta direita do armário. – murmurou.

Continuou deitada, vendo a água da chuva escorrer pelo vidro da janela. Ouvia a movimentação de Lucca pelo casebre, acendendo algumas velas que ela não fizera questão. Ele se aproximou, fitando-a por alguns instantes antes de dizer algo.

– O que aconteceu?

– Porque está aqui?

– Por que vi quando você estava vindo para casa à tarde. Parecia desolada. Esperei que saísse, mas você entrou aqui e não deu mais sinal de vida. Sequer acendeu as luzes. Fiquei preocupado.

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