Visionar e sentir - A disciplina da chantagem

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Eva

Havia se distraído. Como pôde!? Sentia a distante mana de Donovan desaparecer naquele instante, então focava naquilo. Já sabia o que aquilo significava, mas ainda assim era sempre muito difícil aceitar. A mana deixava completamente o corpo, segundos após a morte, como se nunca tivesse existido. 

Sentiu-se triste ao mesmo tempo em que tentava comensurar as dimensões daquilo! Como sua rainha reagiria?! 

O inimigo falava com Lúcio enquanto pensava naquilo, e havia lançado um projétil no formato de uma grande lâmina, uma magia muito lenta, talvez algum tipo de aviso. Tão lenta que não tinha como tal acrobata não desviar. 

E no entanto, ele ficara ali, parado?! Arremetera seu cristal no último instante, quando percebeu que Lúcio não se esquivaria por algum motivo, era como se não conseguisse perceber. 

Sem conseguir se concentrar na forma, bloqueara apenas parte do golpe!

- Cuidado!!! - gritara inutilmente, o corte já o rasgando - Lúcio!

Foi uma hipnose? Mas não senti nenhum outro tipo de magia.

Havia sido descuidada. Um pequeno trincado se fez no cristal, sentiu o gosto de sangue em sua boca em resposta, um quase regorjeio, mas segurou-o líquido metálico na boca, e o engoliu junto a dor.

- Fascinante! Eu não esperava menos de você - disse o atacante na língua dela, com clareza. 

A acústica do local parecia ter se acentuado mais ainda com as alterações provocadas pela outa criatura.

- O que você fez com ele?! Lúcio! - chamou novamente o piromante, mas não houve resposta. Concentrou-se e sentiu a mana enfraquecida no corpo caído no chão, uma chama a se extinguir. Resistiu ao impulso de descer sobre ele e verificá-lo com o tato. 

Foguinho...

- Hora, não acha cruel chama-lo dessa forma? Não está vendo todo esse sangue escorrendo? E mesmo assim ele olha suplicante pra você! Devia deixa-lo descansar. 

A língua do adversário era perigosa. Viperina. Não podia se deixar levar. No entanto, ao saborear a crueldade ele acabara por lhe dar uma dica ali.

Vendo.  

- Enganou os olhos dele! - afirmou em descoberta. 

- Vantagens e desvantagens do mundo da magia... Consegue "ver" a ironia? 

Cuspiu em resposta, com desprezo.

- Eu não tenho nada contra trapacear, mas eu gosto de desafios - continuou o outro, com seu asqueroso interesse em lhe provocar -  Enganar no primeiro golpe costuma ser tão fácil ... Mas observando vocês, eu bem desconfiei que pelo menos você seria um ótimo entretenimento...

Esse sangue escorrendo... E mesmo assim ele olha suplicante pra você!  - era palpável o quanto seu adversário procurava afetá-la com seus joguinhos cruéis. 

Não tinha como saber o quão verdade era aquilo agora, nem como verificar, o oponente se aproveitaria de qualquer deslize, mesmo que fosse mental. Apenas a leitura de mana não a permitia saber completamente a gravidade dos ferimentos de Lúcio. Se a aura hedionda ainda estivesse no ar, talvez já teria baixado cedendo ao desejo de saber, mas ao menos seu fedor se fora. 

Agradeceria Donovan em seu coração por aquilo, quando pudesse. Mas não era hora para nada daquilo. Nesse momento focava apenas em seu objetivo e na grande fúria que sentia, o seu tipo de fúria. Dura, letal.

Um dos seus cristais aproximou-se de sua mão, então imaginou em sua mente a  grande lâmina com a base saindo do dorso de sua mão, uma pequena projeção para trás da base, pra que pudesse contra-golpear, mas a ponta principal muito longa, afiada em ambos os lados. Sentiu-a enorme foice presa a si, uma extensão assassina de seu punho. 

Cicatrizes da Magia - Memórias de OutremOnde histórias criam vida. Descubra agora