A volta da realidade

24 7 23
                                    

Sebastian estava sentado com as pernas inquietas. Haviam mais ou menos 15 pessoas naquele local. Pensou em levantar e ir embora. Mas achou que seria muito mal educado. Ouviu diversas histórias. Todas com uma carga bem pesada. Começou a se sentir um pouco mais à vontade. Ele não era o único ali com um problema sério. Chegando mais para o fim, o responsável pelo encontro dirigiu-se a ele.

-Temos uma pessoa nova aqui conosco. Deem as boas-vindas a Sebastian. Gostaria de falar?

O rapaz respirou fundo. Olhou para todos ali. Consentiu com a cabeça e devagar, começou:

-Boa noite. Me chamo Sebastian Scott, sou policial e me apaixonei por uma vítima de feminicídio.

Como se fosse possível, a sala ficou ainda mais silenciosa. Enquanto viu o olhar atento de todos, começou a contar sobre uma das piores noites de sua vida.

-Eu sou policial, chefe do departamento de polícia de Nova York. Há alguns anos, fui nomeado delegado da repartição. É mais sossegado do que patrulhar as ruas, porém, os casos que a gente pega são horríveis também. Nunca vou esquecer a noite de 27 de outubro de 2017. Eu voltava com meu filho da casa da minha ex-mulher. Era uma sexta-feira, paramos numa conveniência, comprei umas coisas que ele havia pedido. Vi uma movimentação estranha. Esse homem saiu do mesmo local que estávamos, mas a atitude dele era muito suspeita. Fomos para o carro e vi que ele tentava entrar na fachada de um apartamento. Ele conseguiu, forçando a porta. Aquela cena me deixou incomodado, então avisei viaturas próximas, para darem uma vasculhada por ali. Continuei meu caminho, mas aquilo não saía da minha cabeça. Resolvi deixar meu filho na casa da mãe, mesmo acabado de sair de lá, eu precisava seguir o que estava me incomodando. Dei a volta na quadra, o deixei e segui novamente pela mesma rua. Chegando perto, ouvi um tiro. Estacionei de qualquer jeito, liguei pedindo reforço enquanto vi o mesmo homem de antes sair correndo. Não pensei duas vezes, peguei minha arma e subi até o apartamento. A porta estava aberta, eu entrei e a vi.

Sebastian respirou fundo, seus olhos encheram-se.

-Ela estava caída, com um ferimento na cabeça. Eu ajoelhei, a coloquei debruçada em mim. Ela ainda respirava. Liguei para a ambulância, mas poderiam demorar. Eu não podia deixá-la ali. Estava viva, talvez fosse tarde demais se esperássemos o socorro chegar. A coloquei nos braços e desci. Não me lembro muito do caminho. A pus no carro e não sei qual rua peguei. Só sei que cheguei no hospital próximo, correndo com uma mulher baleada na cabeça.

Todos escutavam Scott. Nem barulho de respiração tinha. Ele fez uma pausa, olhou para baixo, não gostava de reviver aquele momento. Mas, resolveu continuar.

-A partir daí, eu não saí mais daquele hospital. Após alguns minutos, me ligaram. Conseguiram pegar o desgraçado. O nome dele é Thomas Bones, ex-companheiro dela. Após a ligação, eu achei que conseguiria sair do hospital, mas não. Fiquei esperando notícias. Ela entrou em cirurgia, chamaram a família. Vi o desespero da tia, correndo na recepção, chorando muito. A reconheci. Era a pró-reitora da Columbia. Mãe de um antigo amigo meu. Não acreditei na terrível coincidência. Lecionei um tempo na mesma universidade, por intermédio dele, que me ajudou num momento complicado da minha carreira. Então, me vi naquela situação. Foi assim que April Pearl entrou na minha vida. Os dias viraram meses, eu a visitava sempre. Não faltei um dia sequer. Muitos me falaram que eu ia deixar pra lá, mas de uma forma que não sei explicar, eu queria ficar com ela. E foi dessa forma por 6 meses. Achei que conseguiria seguir em frente assim que fizesse o possível para que aquele desgraçado do Thomas nunca mais saísse da prisão. O processo dele já foi fechado, de lá ele não sai, mesmo assim, eu não conseguia ficar longe dela. Não importava que ela estivesse em coma, com chance de nunca mais acordar, eu não queria sair de perto. Os médicos acharam que era meu nervosismo no dia que cheguei com ela nos braços, mas eu posso jurar que ela apertava a minha camisa.

O dia em que reconheci Sebastian ScottOnde histórias criam vida. Descubra agora