Em dúvida

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Era dia 26 de dezembro. Eu estava a caminho do Hospital. Consegui uma consulta, um encaixe, na verdade. Dr Liam me atendeu. Fiz exames de sangue, ultrassom, exame de urina e por fim, ele quis bater uma radiografia da minha cabeça. Fiquei assustada com o tanto de coisa que ele pediu, mas pelo diagnóstico na consulta, eram apenas de rotina.

-Está parecendo uma bela crise de sinusite.

-O quê? Mas eu nunca tive isso....

-Pois bem, pode ter desenvolvido agora, já que você trabalha em um ambiente onde tem ar condicionado forte. Seu nariz está muito ressecado, acredito que seja isso que esteja causando as hemorragias.

-As dores de cabeça são constantes em dias frios mesmo, faz sentido, doutor.

-Não se preocupe. Assim que os resultados estiverem prontos, podemos entrar com a medicação adequada.

-Ótimo. Obrigada!

Saí de sua sala contente. Enfim, eu tinha certeza que estava tudo bem! Aproveitei e parei na padaria do pai de Rudolph. Comprei brioches, compotas de doce de framboesa, pães e claro, os cupcakes que eu tanto adorava. Meu telefone começou a tocar. Olhei sorrindo.

- Oi!

Atendi animada. Scott devolveu a animação com a entonação gostosa de alguém que parece gostar de ouvir a voz da outra pessoa da ligação.

-Ei! Está na Columbia?

-Não, acabei de passar na padaria...

-April, achei que estava aqui, hoje não era o encontro estudantil?

-DROGA! ERA HOJE? ESQUECI COMPLETAMENTE! Mas, o que está fazendo aí?

-Então, como achei que estaria por aqui, pensei em te buscar....

-Eu me confundi com as datas, achei que tinham colocado para depois, nunca vi marcarem na semana de folga.... Nossa, eu realmente me esqueci, que merda...

-Me espere na padaria que te busco.

-Certo! Estou aqui.

Scott desligou o telefone. Estava encostado na parede, já do lado de fora da universidade. Foi em direção ao seu carro, mas ao longe, uma figura esguia o olhou e acenou alegremente. Ele acenou de volta e a pessoa veio em sua direção.

-Está esperando a April?

-É, mas ela não está. Acabei de falar com ela.

-Ela anda faltando bastante. Achei que estaria presente no conselho. O pessoal não queria esperar, por isso marcaram essa semana, já que todos que fazem parte ainda estariam por aqui.

-Pois é, ela disse que esqueceu....

Rebecca mudou de expressão.

-O que foi?

Scott perguntou intrigado.

-Nada, bobeira minha. Não quero te preocupar, não é nada demais.

-Como assim me preocupar?

-É que... eu estou preocupada com o comportamento dela. Esses lapsos de memória.... essa agitação....

-Em sala de aula ela costuma estar assim?

-Já tem um tempo. Ela falta bastante, mas é extremamente inteligente. O que me deixa apreensiva não são as faltas...

Ele ficou pensativo. Lembrou-se quando era professor e eu faltava muito, mesmo conseguindo a nota máxima.

-Mas ela pode estar muito atarefada, estudar e trabalhar é complicado. Mas você a conhece melhor do que eu. Ela fica brava se a gente toca no assunto ou pergunta. Eu fico extremamente preocupada porque...

Rebecca respirou fundo.

-Porque....

Scott não tinha curiosidade, mas essa história começou a incomodá-lo.

-Eu tive um irmão que.... tinha esses sintomas. Não quero pressupor nada Scott, me desculpe por estar falando isso.

-Tudo bem Rebecca. Você só está preocupada. Posso perguntar o que seu irmão tinha?

-Bom....ele sofreu um acidente de moto com 18 anos e teve muitos ossos quebrados, a recuperação foi muito complicada. Com isso, ele acabou se viciando em Oxicodona.

Sebastian a olhou e sua expressão havia mudado. Ele estava preocupado comigo achando que era algum problema de saúde por conta dos desmaios e nariz sangrando, mas a preocupação mudou para algo muito mais sério. Imediatamente lembrou de quando viu minha ficha policial e no boletim de ocorrência, estava mencionado uso excessivo de remédios. E pela primeira vez uma ponta de dúvida pairou em sua mente. Será que aquela acusação, de alguma forma procederia? Tratou de afastar esse pensamento.

-Eu sinto muito. Não deve ter sido fácil. Mas fique tranquila em relação a April. Ela não está tomando nenhuma medicação.

-Fico muito feliz em ouvir isso, Scott!

E sorriu, imitando um alívio e suspirando.

-Só gostaria de pedir que não mencionasse essa nossa conversa. Pearl poderia interpretar de outra maneira.

-Tudo bem. Agradeço o cuidado com ela. Bem, eu vou indo. Se cuide.

-Você também. Até amanhã.

Enquanto Sebastian caminhava até seu carro, Rebecca sorria vitoriosa. A semente da dúvida foi plantada. Era tudo o que Thomas precisava.

Passados alguns minutos, vi o carro de Scott encostar. Levantei-me do banco na frente da padaria e fui animada ao seu encontro. Assim que entrei no carro, o beijei.

-Comprei para você!

Entreguei o pequeno pacote com biscoitos.

-Obrigado!

-Como sabia do conselho na Columbia?

-Rebecca mencionou na delegacia. Como são da mesma turma, achei que estaria lá.

-Esqueço que ela está estagiando com você.

Disfarcei o descontentamento.

-Quando você foi ao médico aquela vez, falou para ele sobre esses lapsos de memória?

Minha espinha gelou. Eu havia mentido sobre ir ao Dr Liam. E mesmo que tenha ido hoje, ainda era uma mentira o que eu disse dias atrás.

-É....falei. ele disse que poderia ser do cansaço mental. Mas....não mencionei a você, fiz exames, estou só esperando ficarem prontos. Na verdade, ele descartou qualquer coisa perigosa. Estou com uma possível crise de sinusite, isso explica as dores de cabeça, por isso o nariz sangrou lá nos seus pais, isso vem acontecendo com frequência no frio. Assim que mudou o tempo, os sintomas iniciaram.

Scott me olhava atentamente.

-Que bom que está bem. Ele passou alguma medicação?

-Ainda não. Só quando os exames estiverem prontos e eu retornar. Não precisa se preocupar! Confesso que fiquei um pouco apreensiva, mas não é nada demais.

-Sempre vou me preocupar com você.

-Você é um fofo! Quer ir lá pra casa? Estou de folga até amanhã. O que acha de vermos um filminho e aproveitar esse tempo pra ficar de aconchego debaixo das cobertas?

-Topo.

Ele me deu mais um beijo e saímos em direção ao meu apartamento. Eu não percebi, mas Sebastian não ficou completamente convencido com a minha história. Embora ela fosse verdadeira, a única parte que não batia era a data da consulta. Por fim chegamos. Ao anoitecer, pedimos pizza. Scott não ficou por muito tempo, pois estava com a rotina pesada na delegacia. E ter ido trabalhar ressaqueado lhe custou mais processos e relatórios para revisar e assinar, pois não deu conta de fazer tudo hoje. 

O dia em que reconheci Sebastian ScottOnde histórias criam vida. Descubra agora