1 ano atrás:
Normalmente quando estamos à beira de um colapso e não sabemos, costumamos sentir um misto de sentimentos entre a ansiedade ou a alegria extrema.
Naquele dia, logo cedo, senti que o fim de algo estava próximo, uma tamanha sensação estranha tomava meu corpo se demonstrando em suor e tremores em minhas mãos.
Sendo uma pessoa já diagnosticada por ansiedade, tomei meu remédio e ignorei tudo o que estava sentindo, acreditando ser sobre o término do ensino médio.
Aquilo estava dentro de minha cabeça há muitos anos. De fato, é enorme a pressão que jogam sobre nossas costas quando terminamos a fase da escola. Esperam que com tão pouca idade, em um passe de mágica, ganhamos responsabilidade e decidimos o que queremos para toda a nossa vida.
Apesar de tudo, eu já havia feito diversas provas para entrar na faculdade. Júlia minha amiga, me acompanhou nessa jornada, mas infelizmente teríamos que nos separar já que precisava ficar próxima aos meus familiares enquanto os pais dela a mandariam para longe.
Não diria que nossa amizade fosse uma das mais saudáveis possíveis, já que uma tinha problemas de ansiedade e outra por distúrbio alimentar. A típica amizade moderna de adolescentes modernos.
A verdade é que só tinhamos uma à outra. Júlia é uma pessoa sensível e antissocial e, apesar de eu me comunicar com outras pessoas além dela, deixá-la na mão ou sozinha sabendo do seu histórico familiar não seria uma atitude boa de minha parte.
Naquele dia, estávamos juntas.
Liguei para meu avô para dar a notícia sobre o resultado, mas caiu em caixa postal... várias vezes.
Meu avô, uma figura paterna e amiga, era a melhor pessoa que já havia conhecido. Sempre ficávamos juntos por longas horas fazendo absolutamente tudo o que podíamos. Nossa rotina era sempre diversificada.
Por outro lado, a da minha mãe era sempre a mesma, seguindo todos os dias para o seu trabalho noturno e dormindo ao dia. Mal via ela, mal ficava em casa. A casa de meu avô era meu lar.
E foi para lá que eu fui naquele dia para contar a novidade após me despedir de Júlia.
O que eu não imaginei é que o que me esperava lá era uma cena trágica que me marcaria durante anos.
Ao entrar pela casa destrancada, ouvi um enorme barulho de objetos jogados ao chão e vidros se quebrando, sons vindos dos dois andares da casa.
— Anda seu velho, nos diz onde está! — Uma voz feminina vinha da cozinha.
Ao me aproximar, a primeira coisa que notei foi o sangue escorrido por todo o chão. Foi quando, acompanhando os rastros, vi que eram de meu avô. Um homem e uma mulher de cabelos vermelhos o batiam sem piedade.
Quando me viram, me fizeram de refém, colocando um pano em minha boca, prendendo minhas mãos com uma corda...
Eu estava completamente em choque, não conseguia me mover, pensar ou gritar. Nada além de chorar.
Não acreditava nas imagens que via em minha frente, aquilo era como um filme de terror.
Meu avô, quase completamente inconsciente e machucado de tanto ser maltratado mal havia percebido a minha presença diante de tal cena.
— ENCONTREI O COLAR! — Uma voz masculina vinda do segundo andar se aproximou de mim. — Ora temos mais uma visita aqui. — Disse ao me ver sentada sob o chão entregando o colar para o outro homem, que permanecia em silêncio.
— Temos que dar um jeito nisso. — A mulher de cabelos vermelhos parou em minha frente. —Já nos viram, não vão ficar calados. - Dizia, enquanto pegava uma faca em suas mãos.
— Tá maluca, porra? Isso é só um assalto nada mais que isso. —O homem se aproximou da mulher, com o olhar de confusão. Olhei para trás deles, e notei movimentos vindos de meu avô, ele havia acordado.
—Quer ir pra cadeia? — Enquanto a mulher se vira para convencer ao outro assaltante sobre a ideia, meu avô me olhava desesperadamente, com o olhar de pura tristeza se encontrando em meus olhos molhados de lágrimas e repleto de desespero. Observando a faca nas mãos da mulher, ele criou forças e se jogou contra a mulher na tentativa de auto defesa.
Não deu certo.
Com o ódio eminente em seu olhar, a mulher de cabelos vermelhos descarregou toda a sua raiva, cravando aquela faca diversas vezes no corpo de meu avô, sem piedade.
Comecei a gritar no mesmo momento que, misteriosamente, sirenes da polícia se aproximaram até o local em que estávamos.
— Puta que pariu! — Foi a última coisa que os assaltantes disseram antes de sair pelas portas dos fundos. Antes de sair, a mulher de cabelos vermelhos me olhou com um sorriso no canto dos lábios e sumiu pela porta levando tudo o que um dia eu emocionalmente tinha.
Olhando para o chão via o corpo ensanguentado de meu avô. Não tinha forças para correr atrás deles e muito menos me levantar. Por isso, me arrastei até seu corpo.
—Vovô! Vovô acorda! — Tentei gritar através do pano que cobria minha boca.
Sentei-me próximo ao seu corpo, na tentativa de acordá-lo de qualquer maneira. Só o queria de volta.
De repente, a cozinha ficou repleta por policiais, e os paramédicos entraram.
Em choque permaneci jogada ao chão, com meu avô ao meu lado, apenas tentando raciocinar que vivenciei o momento em que meu avô foi morto e não pude fazer nada.
Após o trágico acontecimento, os dias foram difíceis.
A tristeza tomou parte do meu ser, e as crises de ansiedade se tornavam cada vez piores. Os remédios já não faziam tanto efeito como antes.
Eu apenas ignorava a televisão, internet ou jornais para não ver os noticiários e fingir que aquilo não havia acontecido. Mas sempre ao final da noite, imagens e pesadelos viam à tona e me faziam passar pelos piores momentos possíveis.
Meses se passaram e minha mãe precisou voltar ao trabalho. Naquela noite uma crise absurda me invadiu, mas meus remédios já não estavam mais lá por ordem da médica.
Uma escuridão tomou todo o meu corpo e as tremedeiras não passavam com a imagens se repetindo incansávelmente em minha cabeça.
Eis que me surgiu a ideia- uma lembrança para ser mais exata- de algumas drogas que aliviavam esses sintomas...
Não demorei para me trocar e ir em alguma festa em busca de algum traficante disposto a me vender uma quantidade de maconha. E o encontrei bem mais fácil do que pensei, na verdade.
O traficante jovem de pele negra, com o cabelo crespo arregalou os seus olhos ao me ver pela primeira vez, praticamente assustado.
A princípio, o jovem não quis me vender a maconha, porém- por algum motivo desconhecido- voltou atrás e assim o fez.
A sensação que tive da primeira vez em que usei foi de uma tranquilidade imensa.
Naquele momento, desejei usá-la para sempre.
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Eu Não Estou Sóbria
RandomVerônica Vitale presenciou o cruel assassinato de seu avô. Na tentativa de fugir e esquecer o que aconteceu, ela conhece o mundo das drogas e acaba se tornando uma dependente química. Sua vida se torna um verdadeiro inferno e, quando ela se dá con...