Isaac tem estado longe de mim, apesar de ainda passar algum tempo comigo.
Posso sentir ele distante, já que não está mais fazendo brincadeiras comigo, e nem ao menos me acolhendo do modo como era. Ele não me abraça, e não tenta manter uma conversa mais pessoal desde semana passada. Passei os últimos sete dias pensando muito nele.
Eu não entendo porque de repente ele mudou assim. O pior de tudo é que não entendo porque estou me importando com isso, a única coisa que tenho que me preocupar é com a minha recuperação e não com o fato de um rapaz interessante e de boa índole passar o tempo comigo e me fazer sentir algo por ele.
Argh! Eu não sinto algo por ele, não.
Cadê esse médico? Quero tirar esse gesso logo! Agora vou poder dar um mergulho na piscina e frequentar a academia daqui... isso se a merda do médico terminar a consulta com o paciente hoje. Já estou aqui há minutos e ainda nada de essa maldita porta abrir, seja lá quem esteja aí dentro, o negócio deve estar interessante.
Após alguns minutos esperando ouço a porta se abrir e vejo um cara com uma blusa preta com touca sair de lá dentro. Quem diabos é esse ser? Antes que consiga ver seu rosto, o médico sai na porta.
Ele sorri tentando disfarçar, e eu reviro os olhos e me levanto.
— Você não fala nada e sai daqui sem o gesso ou...— Ele tentou me ameaçar?
— Tudo bem, mas só porque quero tirar esse gesso logo. Talvez eu tenha gostado de você, ou talvez eu esteja de bom humor. De nada. — Brinco.
Observo ele revirar os olhos.
— Qual é o seu nome? — Pergunto e ele fica se jeito. — A qual é, eu não vou te denunciar. — Faço biquinho.
— Meu nome é Pablo Espíndola. — Ele diz mudando o foco em outra coisa. Nome familiar diria.
O resto do processo continua em silêncio até Pablo terminar seu trabalho. Não foi uma boa ideia ter falado sobre aquilo, mas eu não podia imaginar.
Me levanto da maca e tento andar devagar.
— O Isaac terminou de editar aquelas fotos? — Ouço ele perguntar atrás de mim.
— Por que está perguntando isso para mim? — Levanto uma de minhas sobrancelhas. Eu não tenho nada a ver com o Isaac faz ou deixa de fazer.
— Talvez porque vocês estão sempre juntos. — Ele diz parecendo ser óbvio.
— Não, ele não terminou. Ele tirou tantas fotos e gravou tantos vídeos aquele dia que me admiraria se ele terminar tão cedo. — Mudo de assunto e continuo andando até a porta.
Teve um pequeno evento aqui na clínica para comemorar a festa junina, decoramos tudo com bandeirinhas e tivemos comidas típicas. Há muito tempo não fazia isso e relembrar o clima junino foi divertido.
— Quando tiver pronto pede pra ele me mostrar. — Afirmo com a cabeça.
As fotos não podem ser publicadas por ser pacientes, então Isaac as editas e deixam elas em álbuns aqui na clínica.
— Verônica — Pablo me chama de novo. — Leva isso. — Ele me entrega o gesso.
— Você está brincando com a minha cara? — Fico encarando o gesso em minha mão e ouço sua risadinha.
— Obvio que estou brincando, devolve isso se eu deixar na sua mão sou demitido. — Ele toma o gesso da minha mão.
A volta até o meu quarto parece uma eternidade, mas enfim chego e posso descansar. Ao entrar fecho a porta e vou em direção a minha cama, mas algo me chama a atenção antes que eu me aproxime.
Vejo alguém através do reflexo da janela, e me assusto. Na tentativa de me salvar, viro-me rapidamente e dou um socão na pessoa atrás de mim. É ele, de novo. O cara que o Samuel mandou.
— Que porra você está fazendo aqui?! Como me encontrou? — Grito para chamar a atenção de alguém. O cara de cabelos loiros escuros está com uma cara de espantado, e tenta se defender dos meus fracos ataques.
Me preparo para gritar novamente, mas ele é rápido e tapa a minha boca.
— Deixa eu falar com você, caralho. — Ele sussurra e eu percebo que não tenho opção. Tiro as mãos dele da minha boca e me afasto.
— O que você quer? — Cruzo os braços.
— Primeiramente, Samuel me mandou agradecer pelo dinheiro que você deu a ele. — Ele fala baixo e se senta na poltrona.
— Dinheiro? Que Dinheiro? — Não faço a mínima ideia do que você está falando.
— O dinheiro que você deu a ele naquele dia em que te encontrei na rua, quer dizer, alguns dias antes de você levar aquela surra. — Ele explica.
Dinheiro? Ainda não entendi muito bem. Não me lembro de ter dado dinheiro algum, ainda mais a um estranho. Eu mal me lembro de ter visto esse cara a não ser antes dos tiros..., mas, espera aí...
Merda!
— O que foi? — Ele pergunta diante da minha preocupação se levantando da poltrona.
— Eu vou morrer! — Grito e ele se assusta. — Agora literalmente, ela vai em matar. — Me jogo na cama.
— Quem vai te matar? — Ele se levanta.
— Minha mãe! — Digo e ele dá risada. — Qual é a graça? — Me sento.
— Imaginei que você perguntaria... Depois de tudo o que você aprontou, ainda está com medo da sua mãe? — Ele ergue uma das sobrancelhas. — Fala sério, se fosse pra ela te matar já teria matado.
— Tudo o que aconteceu foi comigo e esse dinheiro não tem a ver comigo... quer dizer tem, mas ele era... Era as economias do meu avô para pagar minha faculdade! Eu ferrei com tudo, agora foi tudo mesmo. — Falo tudo muito rápido, e o cara só fica me observando com os olhos cerrados.
Paro por um momento e respiro. Calma, Vee. É por uma boa causa... Samuel vai devolver. Você o ama e ajudou ele, nada demais. Você só pensou no próximo...
— É culpa sua! — Corro em direção a ele e pulo em suas costas.
— Sai de cima de mim, maluca! — Diz ele tentando soltar as minhas mãos de seu pescoço.
— Você não sabia que eu estava drogada?! Eu não sabia o que estava fazendo. — Eu não sei como ninguém veio até o quarto ainda, e pior ainda, não sei como esse idiota entrou aqui.
— E faria alguma diferença se você estivesse sóbria? — Ele diz baixo. Bom, isso meio que é verdade. Saio de cima do cara.
— Vai embora antes que alguém apareça.
— Mas ainda não...— Ele tenta dizer.
— Eu vou gritar! — Ameaço de gritar novamente, mas dessa vez ele não me interrompe e sai batendo a porta, mas antes, me mostra o dedo do meio.
Respiro fundo.
Olho para a cômoda e vejo que há uma carta branca ao lado de uma caixa.
A caixa é de Isaac, e o nome do remetente na carta é ...
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Eu Não Estou Sóbria
RandomVerônica Vitale presenciou o cruel assassinato de seu avô. Na tentativa de fugir e esquecer o que aconteceu, ela conhece o mundo das drogas e acaba se tornando uma dependente química. Sua vida se torna um verdadeiro inferno e, quando ela se dá con...