Vestindo uma blusa tom laranja e uma calça jeans com tênis, lá estava ela. Quase não consigo reparar na sua cara de decepção antes de sentir uma ardência em um lado do meu rosto, fazendo uma cabeça virar.
Aí. Esse tapa foi doloroso. Nesse momento minha mão está cobrindo a minha bochecha, que provavelmente está vermelha, assim como meus olhos. Me viro para olhar para ela, sua demonstração de decepção e repulsa está claramente evidente em seu rosto cansado.
— Mãe...— Tento mais uma vez.
— Cala a boca! Você não tem nada para explicar, eu já sei de tudo. — Ela dá outro tapa na minha cara. — Me fazendo de idiota todo esse tempo Verônica! Eu achando que era problema psicológico e era safadeza! — A cada palavra minha mãe eleva seu tom de voz. Ela entra na sala jogando sua bolsa no sofá enquanto eu fecho a porta de madeira.
— Eu...— Tento me explicar, mas mais uma vez sou interrompida.
— Você o que? Teve que passar por tudo sozinha... perdeu seu avô? Poxa coitadinha dela!— Ela fala sarcasticamente. — Eu perdi meu pai, mal vejo meu marido e pelo jeito perdi minha filha também.— Ela me bate mais uma vez. Pelo jeito vou perder as contas de quantos tapas levo hoje.
— Você me deixou sozinha e sem os remédios o que queria que eu fizesse?— Grito.
— Esperava que se recuperasse! Que tivesse vergonha na sua cara e consideraria o fato de que eu preciso estar fora para te sustentar mesmo depois do que tudo aconteceu! Agora percebo que você é uma parasita e não é nem um pouco grata pelo que faço por você. — Ela abaixa sem tom de voz, mas suas palavras doem como se focas fossem lançadas á mim. — Seu pai tem razão. — Ela segura as lágrimas e sua face sem expressão me assusta. Ela parece um robô que não tem sentimentos, mesmo estando chorando a segundos atrás.
Abaixo meus olhos demonstrando vergonha de minhas atitudes e meus olhos se enchem de lágrimas.
— Seu avô ficaria magoado vendo você nessa situação. Se acha que isso resolveu alguma coisa, está enganada. Seja lá onde ele estiver agora, tenho certeza de que também está decepcionado.— Suas palavras me levam a uma verdade com que não me dei conta. Permaneci em silêncio, a verdade dói; não sei como as lágrimas em meus olhos ainda não escorreram. Enquanto estou aqui parada, vendo minha mãe caminhar até o meu quarto, penso em como eu me sentiria se aquelas lágrimas do meu avô no dia em que morreu fosse por minha causa.
Pensar nisso quebra meu coração, pelo menos os pedaços que ainda restam nele.
— Vou ligar para o seu pai. — Ela volta rapidamente do quarto.
— O que?! NÃO!— Arregalo os olhos.
— Está com medo? — Ela me desafia.
— Eu não estou com medo, mas sei que ele vai culpar você por tudo ter acontecido. Vai aguentar ser chifruda e além do mais ser responsável por tudo isso, mãe?— Merda, deixo meus instintos me controlarem. Minha mãe se aproxima de mim e me pega pelos meus cabelos me puxando para o meu quarto.
— Só porque pai não liga para você, não quer dizer que ele não liga pra mim. — Ela diz enquanto me puxa e me joga sobre minha cama, saindo logo em seguida pela porta.
Respiro fundo e seguro o choro, me sentando na cama. Ainda estou acabada já que acabei de chegar da boate, mas nem sei se tenho disposição para tomar um banho e dormir hoje. Preciso pôr em ordem tudo o que está acontecendo, preciso ver como vou sair disso e como vai ser daqui para frente. Analisar a punição que minha mãe vai me dar e ver se será possível eu realizar isso.
— Arruma suas coisas.— Ela volta rápido com uma mala na mão, jogando-a na minha frente na cama..
— Para quê? — Franzo a testa.
— Você vai se internar em uma clínica.— Ela abre a mala e a porta do meu guarda-roupas.
— O quê?! Nunca!— Pulo da cama e abro meus olhos.
— Ou é reabilitação ou é rua.
— Não quero conviver no meio de loucos.
— Não é um hospício, é para viciados em drogas.—Ela revira os olhos.
— Eu não sou viciada em drogas! — Grito tirando essa ideia da minha cabeça. Estou a ponto de surtar com essa mulher, estou segurando cada fio de cabelo que resta na minha cabeça.
— Como você tem a coragem de negar isso? Com toda aquela maconha e cocaína! Você está cega minha filha.— Ela observa fixamente os meus olhos por um momento, e volta a colocar a roupa na mala.
Não... eu não sou dependente química, eu sou apenas... uma jovem comum. Que merda eu estou pensando.
— Eu não vou para lá. — Penso em voz alta, paralisada, enquanto minha mãe esvazia o meu guarda-roupas. Não é possível que não havia me dado conta da minha real situação.
— Pois bem, você sai de casa. — Ela responde ao meu comentário.
— O quê!?— Não pode ser verdade.
— Se você não quer se tratar, eu não vou deixar que vagabunda fica morando de baixo do meu teto.— Ela fecha os olhos e respira fundo, tentando se manter calma.
— Você não pode fazer isso comigo. Eu sou sua filha!— Me aproximo bruscamente da minha mãe, jogando a mala que ela arrumou no chão. Minha mãe se assusta. — Eu não vou. — Chego próximo ao seu rosto, firmando o olhar.
— Você não pode me desafiar.— Ela não abaixa a cabeça pra mim. Só de pensar em ser internada longe de tudo me causa uma raiva e um desespero inexplicável. Fecho os meus punhos, mas antes mesmo que consigo levantá-lo, uma buzina de caminhão nos chama a atenção.
Solto um suspiro. Merda.
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Eu Não Estou Sóbria
RandomVerônica Vitale presenciou o cruel assassinato de seu avô. Na tentativa de fugir e esquecer o que aconteceu, ela conhece o mundo das drogas e acaba se tornando uma dependente química. Sua vida se torna um verdadeiro inferno e, quando ela se dá con...