Alguns dias de recuperação se passam, mas isso não garante que fique cem por cento bem. Ainda estou mal, na verdade.
— Oi. — Uma voz masculina me tira do estado pensante.
Ao abrir meus olhos e levantar minha cabeça, me deparo com Isaac parado na porta.
— Sei que não quer me ver e está brava comigo, mas tive que te trazer isso. — Ele entrega um presente em minhas mãos. É o mesmo presente de quando estava na reabilitação e não quis abrir. — E também isso. — Ele estende a outra mão e me entrega um envelope. — É o convite do meu casamento. Pensei muito antes de te trazer isso... só quis te dizer que se não quer ir por causa da minha sogra, não se preocupe porque ela saiu da cidade há algumas semanas dizendo que tinha algo para fazer. — Sua voz é baixa e calma, e sua postura é tensa.
Não consigo olhar para os seus olhos.
Meus sentimentos se misturam entre vergonha e raiva. Raiva por ele não ter acreditado em mim. De qualquer maneira, felizmente aquela mulher sumiu de novo.
Isso é muita hipocrisia da minha parte, na verdade. Querer punir Samuel e deixar a mulher responsável por tudo solta é muito contraditório na justiça da minha mente, por outro lado a acusação que tenho sobre ela é apenas uma semelhança em seu rosto, já Samuel tive provas concretas e ele assumiu com os próprios olhos.
Não sei se tenho forças o suficiente para ir atrás daquela mulher, muito menos coragem para isso. Obviamente terei que vê-la novamente. Ela me assombrou por muito tempo. Seria hora de deixá-la desaparecer entre minhas memórias?
A morte seria mais fácil do que lidar com esses fatores diante de minha mente lesionada.
— Me desculpe por...
— Não precisa se preocupar, eu também não acreditaria em mim. Tudo bem.
— Eu fiquei preocupado com você. Achei que ia te perder e quando soube sobre Samuel... — Gesticula com as mãos.
— Por favor, não fale disso. Minha cabeça dói, eu não quero me lembrar de nada. Não fique preocupado comigo, isso não vai te beneficiar em nada... eu vou destruir sua vida.
— Não, você não vai destruir minha vida. — Ele se mostra totalmente compreensível e aproximando de mim.
— Eu já estou destruindo Isaac, olha seu estado, está todo pra baixo em um momento que era para ser feliz, você me tornou sua responsabilidade, você está acabando com você mesmo com isso. Olha onde estou mesmo depois de toda a sua ajuda! Eu nunca vou mudar, e você também não pode mudar o que acontece comigo... e tá tudo bem. O que eu mais ouvi foi que eu teria que lidar com isso, só eu posso mudar isso. Eu quero que você seja feliz, faça pelo menos isso por mim. — Pego em suas mãos.
— Tudo bem. Então acho que essa é a nossa despedida. — Ele beija a minha mão e se afasta.
— Você não é minha responsabilidade. É bem que mais que isso. — Ele se vira e some da visão da porta.
A pior parte de deixar alguém partir é ela levar parte do seu coração junto.
Isaac levou uma grande parte, mas como poucos, não foi o responsável por quebrá-lo.
É horrível ter que abrir mão de quem quer e nos faz bem, entretanto não vou errar dessa vez. Ele não me merece que eu destrua a vida dele também.
Quero que ele viva ao lado de alguém que possa tratar ele como ele merece. Alguém com quem ele possa sair para encontros e tomar vinhos sem se preocupar, que conte sobre seu passado feliz, alguém que possa ser um bom exemplo para seus filhos. Assim como Heather é.
Decido abrir o presente deixado em meu colo.
Não faço a mínima ideia do que seja, já que da primeira vez não o abri.
A caixa é amarela, com laço rosa. Assim que puxo o laço de fita de cetim me surpreendo.
Como mágica, várias borboletas de papel saltam para fora da caixa e em seguida, algumas pequenas bexigas em tons de verde, enchidas de gás hélio sobem. Uma em especifico é transparente com desenhos de borboleta e nela há uma frase:
'' A arte de recomeçar''
Olhando para o interior da caixa, vejo alguns detalhes em todos os tipos de azul, e na parte central na caixa, as fitas de cetim que seguram as bexigas envolvem um quadro.
'' 1 mês sóbria.''
É uma fotografia espontânea minha sorrindo com os braços abertos mostrando a decoração que indicavam meu tempo sóbria na clínica de reabilitação.
Meus olhos se enchem de lágrimas.
Esse é um dos melhores presentes que recebi em minha vida.
Representa um momento de alegria, paz e renovação. É muito especial.
Com certeza foi um presente único, feito por ele mesmo.Porque ele me faz querer ficar ainda mais perto dele? Que ódio, Isaac!
Guardo as borboletas que caíram, fechando a caixa novamente com todo cuidado e a coloco sob a mesinha ao meu lado.
Olha para o envelope do convite de casamento de Isaac.
Talvez devesse agradecer a ele pelo presente e me despedir da forma correta.
Ver ele de terno e sorrindo vai ser uma bela recordação a se guardar como última lembrança.
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Eu Não Estou Sóbria
CasualeVerônica Vitale presenciou o cruel assassinato de seu avô. Na tentativa de fugir e esquecer o que aconteceu, ela conhece o mundo das drogas e acaba se tornando uma dependente química. Sua vida se torna um verdadeiro inferno e, quando ela se dá con...