10. Má sorte no amor

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A primeira vez que fiquei com um garoto, eu tinha 17 anos

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A primeira vez que fiquei com um garoto, eu tinha 17 anos. Era difícil para qualquer jovem daquela idade se envolver com alguém em meio a um vírus mortal que matava em 30 dias, mas dávamos um jeito.

Naquela época, estávamos no boom da pandemia. Os pais do Rosa haviam morrido, ele havia pego o vírus e sobrevivido e a minha mãe cuidava do meu pai — que sempre estava com a imunidade baixa e precisava de ajuda até para se locomover.

Meu irmão fugia de casa às vezes, para se encontrar com os amigos e namorar a vizinha — uma loira que só usava máscaras coloridas e tinha uma pochete na cintura para guardar álcool gel. Não sei por que, mas naquele dia resolvi aceitar o convite e sair com eles.

Ciano me guiou até a mata perto de casa, onde alguns adolescentes estavam ao redor da fogueira, conversando e bebendo.

Fiquei bêbado fácil, conversei bastante, falei sobre o meu plano secreto de salvar a humanidade (arrancando risadas da galera), fumei maconha até gargalhar e comecei a perceber os olhares do amigo do meu irmão.

O nome dele era Tiago. Tinha um rosto bonito, cabelo bem penteado, máscara preta com um emoji piscando desenhado e uma voz suave. Acho que foi a voz que mais me atraiu, ele tinha uma entonação forte, de quem pensava nas coisas antes de falar e queria ser ouvido.

Absorvi cada palavra dita por ele e concordei ou discordei conforme julguei que pudesse render mais conversa.

Em certo momento, quando todos se espalharam, cheguei perto dele e conversamos sobre as nossas famílias, as perdas que tivemos, nossas vidas enclausurados em casa e o constante medo de infecção.

Não lembro quem se aproximou de quem primeiro, mas lembro do beijo. O medo que senti de estar fazendo algo errado — não por beijar um homem, mas por encostar minha boca na de outra pessoa.

Por mais que todos ali seguissem o isolamento, ainda não conhecia tão bem o Tiago. Mesmo assim, me deixei levar. Fui com ele até uma parte mais afastada da mata, nos deitamos na grama, vimos as estrelas e nos beijamos até dormir um por cima do outro.

—E  nunca mais o vi depois daquele dia. – contei, deitado no chão com o Amarelo ao meu lado, observando as estrelas. – Sempre que olho pro espaço lembro dele. Da forma como tudo foi especial naquele dia...

Amarelo me ouviu, juntando a cabeça na minha e olhando para cima, para a vastidão do espaço e todas as suas constelações.

Aquela parte do setor de luxo foi a minha construção favorita. Me inspirei naquela festa, no dia em que deitei na grama e imaginei o quão bonito poderia ser o espaço. O Rosa achava aquele acabamento de vidro no lugar do teto um desperdício de dinheiro, mas para mim era uma obra de arte

— A minha primeira vez não foi tão agradável assim. – disse o Amarelo. – Fiquei nervoso, torci para que acabasse logo e que os meus pais não descobrissem nada. Tinha medo deles não me aceitarem.

— Sim... Nunca foi fácil gostar de alguém do mesmo sexo na Terra.

— Meus pais até eram tranquilos quanto a isso, mas havia tanta coisa para eles se preocuparem... Não queria colocar mais esse problema na mesa.

— O Ciano era como você. Me assumi primeiro e ele não quis perturbar meus pais para dizer que era bissexual, por pensar que isso seria um "problema".

Senti a mão do Amarelo segurar a minha, mas não o afastei dessa vez. Era bom ter alguém perto, uma pessoa que me fazia esquecer um pouco da mancha negra que crescia no meu abdômen.

— Você é uma pessoa curiosa, Vermelho. – Ele virou-se para mim, com um sorriso.

— Como assim?

— No início, achei que me detestava. E agora me convida para esse lugar super-romântico.

— Bem, era você que queria dar em cima de um cara comprometido.

— E agora? – ele chegou ainda mais perto, passando a mão pelo meu peito. – O que pensa sobre mim?

Queria que ele tirasse a mão antes que percebesse alguma das minhas feridas, então a minha resposta veio com um gesto.

Peguei o Amarelo pela cintura e o aproximei de mim, beijando-o e rolando nossos corpos até o canto do salão de luxo, deixando que as roupas dele fossem embora rapidamente.

O sexo com o Amarelo era quente. Tínhamos o mesmo ritmo, ele gostava de rebolar no meu colo enquanto eu segurava a sua cintura e deslizava as minhas mãos pelo seu pescoço.

Me sentia bem estando com ele. 

Não sei ao certo quais sentimentos tinha, mas uma coisa era certa: aquilo deveria continuar. Queria poder ficar mais tempo com ele e olhar as estrelas quantas vezes pudesse.

Não tirei mais os meus olhos dos dele e gozamos juntos, quase ao mesmo tempo.

Mais tarde, pararia para pensar como nenhum romance que tive terminou bem.

No caso do Roxo, fui traído pelo meu próprio irmão, e os outros casos que tive ao longo da vida foram líquidos, irrelevantes demais, com exceção do Tiago...

Menti quando disse que nunca mais tinha o vi. 

Cerca de três meses após a festa, descobri que ele estava infectado. Eu era um jovem apaixonado, então fiz o que qualquer garoto da minha idade, burro feito uma porta, faria: corri até ele para me despedir.

Lembro de ter pedalado feito um louco em uma bicicleta velha do Ciano, respirando pesado e com a minha testa e cabelo encharcados de suor. Minhas mãos tremiam, meu coração estava acelerado e meu peito ardia. A rua dele era silenciosa, muitas das portas das casas estavam marcadas de vermelho, revelando que ninguém mais morava ali, e o cheiro de morte era constante.

Quando cheguei ao meu destino, enxerguei o caminhão negro parado bem na porta do Tiago.

Ninguém mais se importava em esconder cadáveres, apenas jogavam os corpos nos caminhões e dirigiam para o mais longe que pudessem. Os homens que levavam os pais dele vestiam longas vestes brancas, com camadas grossas de roupas e máscaras pesadas.

Não me aproximei mais. Apenas parei e observei quando jogaram os corpos no caminhão. 

 Sabia o que estava por vir, por isso não me surpreendi quando o corpo inchado e coberto de sangue do meu primeiro amor apareceu e foi arremessando junto de tantos outros.

Chorei feito uma criança e naquele momento, tudo o que queria era sumir dali. Ir para o mais longe possível de todas as pessoas e daquele vírus maldito — o mais longe que o espaço poderia me levar.

Na realidade, foi a minha má sorte no amor que me fez virar um sobrevivente.

Among Us | Gay Fanfic +18Onde histórias criam vida. Descubra agora