Uma espaçonave carrega os últimos resquícios da espécie humana. Sem nomes, sem destino e com a tarefa impossível de sobreviver a um vazio sem fim, os poucos tripulantes precisam enfrentar um mal misterioso entre eles. Algo poderoso, capaz de destrui...
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Como esperado, o caos se instaurou assim que revelei a verdade. A confusão, o desespero, o pavor... Tudo aquilo era previsível demais, porque aquelas pessoas eram incapazes de lidar com uma situação pavorosa como aquela. Talvez nenhum de nós fosse.
Como líder da nave, tentei segurar a barra enquanto pude, mas estava doente e cansado demais para resolver a situação.
Durante meu discurso, Branco não parou de chorar. Ela tinha uma ligação especial com o Azul, já vi os dois juntos diversas vezes pelos corredores – trocando olhares e tocando as mãos quando supunham que ninguém olhava. Sentia pena dela, porque entendia a dor de perder uma paixão de maneira abrupta.
— Precisamos acordar os outros tripulantes. – disse Verde, em meio a confusão. – Temos mais pessoas na criogenia, seguranças treinados pra lidar com isso.
— Isso é impossível, o setor inteiro de criogenia foi danificado, lembra? – alertei. – A nossa prioridade agora é cada um ir fazer as suas próprias tasks.
— Com um assassino à solta??? – Branco quase gritou.
— Se não fizermos, será o nosso fim. – expliquei. – O Amarelo já falou que o reator está com defeito, que precisa de mais uma pessoa para ajudá-lo a arrumar, mas não é só isso. A nave inteira vem apresentando defeitos.
— Como isso é possível? – perguntou o Roxo. Seu olhar ia para o meu irmão, não sei bem o porquê. – Quer dizer, é difícil imaginar a nave inteira com problemas.
— Uma explosão de produtos químicos pode ser bem imprevisível. A questão é todo mundo aqui sabe o que deve fazer. Andem em duplas, se concentrem em suas tasks e logo resolveremos isso tudo.
Ninguém pareceu satisfeito com o que ouviu. Além disso, escolher uma dupla significava poder ter que andar de um lado para o outro com um assassino.
— Ciano e Branco, vão até à fiação e...
— Eu não vou a lugar nenhum com ele! – Branco me interrompeu de imediato. – De jeito nenhum! Todos sabem que o Ciano é quem causa os problemas aqui. Ele é o marginal!
— Tá me acusando de algo, vadia? – tive que segurá-lo pelo ombro antes que o Ciano explodisse.
— Chega! – me virei para o meu ex-namorado, para acabar com aquela confusão logo. – Roxo, vá com ela.
Ele concordou e, depois que os demais se afastaram, me virei para o Ciano.
— É melhor se acalmar se não quiser piorar a situação.
— Eles pensam que fui eu. Até o Roxo me olhou estranho, percebeu?
— Você é meu braço direito aqui. – disse, sem tirar os olhos dos dele. – Preciso de ajuda mais do que nunca, então não ligue para o que os outros pensam, tá legal?
Ele concordou, com o olhar baixo e aquela carranca de quem não queria admitir de que estava errado.
— Fique aqui. Quando o Amarelo melhorar, vá com ele até o reator e ajude no que for preciso.
— Tá legal...
Depois que Ciano entrou na Enfermaria, me virei para quem eu queria conversar de verdade. O Verde ainda estava ali, me observando e analisando cada gesto meu – provavelmente para entender como poderia escapar das minhas acusações.
— O cheiro de desespero... Não sei se é deles ou de você. – Ele disse com um sorriso. – Deixa eu adivinhar: serei a sua dupla?
Não respondi. Apenas pedi que ele me acompanhasse até o refeitório.
Andamos juntos, em silêncio, com as luzes da nave piscando hora ou outra e os sinais de que tempos piores estavam por vir bem visíveis.
Quando chegamos ao refeitório, olhei para os restos de comida na mesa e pensei como jamais teríamos momentos calmos com todos reunidos ali.
— Sabe... – comecei, enquanto procurava alguma task por ali para fazer. – Você nunca tinha me dito como o seu acampamento foi destruído antes daquela nossa conversa.
— Não é algo que eu goste de relembrar.
— Por isso nunca quis contar que eu já sabia. Porque, depois que o Rosa perdeu os pais e foi morar na minha casa, tínhamos o hábito de pesquisar sobre outros países... Sentávamos no tapete da sala e imagináveis maneiras de resolver cada problema do mundo: um jeito de impedirmos o vírus de se alastrar.
— Foi assim que surgiu a ideia da nave?
— Não, isso foi mais pra frente. A questão aqui é que lembro de ter lido sobre o grande acampamento da sua família. Um refúgio e tanto, com muros, médicos, seguranças... Um verdadeiro paraíso! E lembro de ter pensado no que eu poderia ter feito para manter aquele lugar de pe.
Verde começou a entender onde eu queria chegar. Cruzou os braços e ergueu o queixo, na defensiva.
— Não sou nenhum idiota. – continuei. - Sei que a Branco e o Azul estavam conversando sobre me tirar da liderança da nave. Eles faziam parte da oposição, mesmo a Branco sempre estando em dúvida se continuava ou não ao meu lado.
— Sim, ouvi rumores disso. Teria te contado, se tivesse confirmado a informação.
— Como no caso do meu irmão e do Roxo? Ou do Preto?
— Esse tipo de coisa é fofoca. – Ele reclamou. – Não é da minha alçada. Meu trabalho era te avisar quando a sua liderança estivesse em perigo.
— O problema é que não paro de imaginar no que você seria capaz de fazer para impedir que tudo o que rolou no seu acampamento acontecesse de novo aqui. Você mataria por isso, não é?
— Tá indo longe demais, Vermelho. A porra do seu irmão é um psicopata e quer jogar a culpa em mim?
— O Ciano é incapaz de matar uma mosca.
— Não pode afirmar isso. – ele sorriu. – Tenho informações sobre ele. As pessoas estão comentando...
— Por um momento acreditei que não ligasse pra fofocas.
— Estou falando sério aqui! – Verde chegou perto, me observando de um jeito sério. – Parece que seu irmão agrediu o Roxo. Não sei bem o porquê, mas eles brigaram e o Azul foi quem apartou a briga.
Parei onde estava, sem acreditar no que ouvia.
— A questão é que o Ciano é mais agressivo do que você pensa. – Ele suspirou. – Fale com o Roxo, tire essa história a limpo.
— Não precisa, sei que é mentira.
— Sério? Ele foi capaz de te espancar em uma briga! O que mais aquele garoto não seria capaz de fazer?