Não me lembro da última vez em que senti o vento quente soprar no meu rosto.
Digamos que em São Paulo não temos esse calor contagiante do Rio, em todos os sentidos da palavra. Me mudei para a capital carioca há uma semana e já pude perceber que as pessoas daqui são diferentes, a começar pelos seus rostos, esbanjando mais vivacidade que os paulistanos – sempre tão cansados da rotina exaustiva.
A primeira coisa que fiz aqui, depois de organizar a bagunça da mudança, foi experimentar o mar furioso do Rio. Que cidade incrível! Minha mãe não aceitou muito bem o fato de papai ter vendido tudo e comprado uma casa no Morro do Alemão. Não tivemos muita escolha de localidade pra morar, no morro é onde dá pra pagar uma casa, afinal, nós não somos bem de condição.
Meus pais se casaram muito jovens; mineiros, da vida simples do campo, decidiram tentar a sorte na grande São Paulo, tudo em vão. A vida não foi como eles esperavam que ela fosse. Meu pai costuma dizer que eu fui a única coisa boa ao longo desses anos. Ele é o tipo de pessoa que se acostuma com qualquer situação e ama as coisas simples. Minha mãe, porém, sempre almeja coisas grandes conquistadas por meio do estudo. Nesses últimos meses, ela tem me pressionado muito com a faculdade que quero fazer e eu não tenho a mínima ideia do que vou cursar. Sempre me desvio da conversa. Pelo menos ela acha que eu tenho oportunidade de ingressar em uma universidade boa aqui no Rio.
Mas, a vida na favela é diferente. Nem todos aqui têm luxos. Não sei o que se passou na cabeça do meu pai para se mudar assim, sem motivos aparentes pra cá. Só que eu sinto algo nesse lugar que me faz querer ficar. Alguma coisa me diz que preciso viver novas experiências.
Uma semana aqui não foi tempo suficiente pra fazer amizades, pelo menos não pra mim, a tímida da família. Minha mãe já sabe até o nome dos vizinhos e meu pai já convidou um colega de trabalho pra almoçar aqui em casa. Eu continuo excluída no meu quarto, sem muitas opções de, digamos assim, me enturmar. Felizmente tenho um primo que fez questão de me acompanhar nessa adaptação ao "novo lar": Gilson Santos. Nós o chamamos de GS, mas eu digo seu nome completo quando quero atormenta-lo.
Gilson e sua mãe, tia Gorete, são nossa única família no Rio. Talvez esse seja o motivo pro meu pai ter vindo parar justo aqui no Morro do Alemão, minha tia – irmã dele – precisa de apoio agora que está viúva.
Os dois moram na rua de cima. A casa deles é menor que a nossa, mas nenhuma tem luxo a mais que a outra. Embora meus pais levem uma vida simples, sempre se esforçaram pra me dar um conforto razoável.
Abro as janelas do meu quarto e sinto o vento quente vindo de fora. Recentemente, demos um retoque na cor de todas as paredes, por isso o cheiro de tinta ainda está um pouco presente no ar. Pintamos só o interior da casa, por fora, os tijolos não foram revestidos por cimento. Nós temos um sofá velho, porém confortável que amamos usar, o GS, principalmente, pois gosta muito de dormir aqui em casa e como não tem cama sobrando, dorme lá mesmo.
Eu termino de dobrar meu cobertor. Acordo tarde intencionalmente, pois quero aproveitar ao máximo meus últimos dias livres antes de voltar à escola. Hoje é sábado. Minha mãe me matriculou ontem, ou seja, segunda começa o "tormento". O último ano do ensino médio não é pra qualquer um.
Escovo meus dentes e decido colocar um cropped verde escuro com mangas e uma calça jeans com detalhes excessivos de rasgado. Faz calor, mas são essas roupas que eu tenho devido um guarda-roupa inteiro voltado ao frio de São Paulo. É certo que na capital as temperaturas ao longo do dia alteram muito – de manhã está frio e no almoço faz muito calor – mas nada se compara ao Rio.
Ajeito meu cabelo e afofo a franja. Gilson vem me buscar hoje pra conhecermos uma galera. Não faço a mínima ideia de quem sejam.
– Já tá pronta, oh Pinscher? – Ouço GS gritar da sala, obviamente ele acabou de chegar.
– Bom dia para você também, Gilson Santos. – Respondo, indo pra onde ele está. Não preciso andar muito, a porta do meu quarto dá pra a sala.
– Já disse pra não me chamar pelo nome completo. Se eu criei a porra de um apelido é pra ele ser usado. – GS retruca, ranzinza.
– Ihhh já ficou zangadinho. – Começo a zoar.
– Não enche, Bárbara.
Ele chama meu nome ao invés de Babi, meu apelido e forma pelo qual preferido ser chamada, de propósito. Eu solto uma risada antes de provocá-lo mais uma vez:
– Isso é o que você ganha por me chamar de Pinscher, seu idiota!
Dou um peteleco na cabeça dele e GS desfaz a cara de zangado de sempre, que não passa de um fingimento. Meu primo é doido às vezes, porém é muito gente boa.
– Pra onde vamos hoje? – Pergunto indo à cozinha, que é dividida da sala por um balcão de mármore – Pelo menos posso tomar o café-da-manhã?
– Fique à vontade, é melhor comer em casa do que me fazer passar vergonha na rua comendo feito uma pedreira. – GS ri como um cavalo relinchando.
– Sai fora, garoto.
– Toma logo seu café, a gente vai se atrasar.
Ele se deita no sofá e começa a jogar em seu celular. Noto que meu primo está com uma tatuagem recente na panturrilha, escondida pelo típico plástico pós-procedimento. Que estranho, penso. Ele odeia tatuagens, só fez a que tem no pescoço porque seus amigos lhe convenceram. Volto a preparar meu leite com Nescau e, em seguida, passo manteiga no pão. Tomo meu café da manhã assistindo desenho animado, com GS usando meu colo como apoio pros seus pés grandões.
Esse parece ser um dia tão normal. Me sinto bem. A melhor parte de me mudar para o Rio é que agora eu não preciso mais visitar o meu primo a cada um ano ou dois, posso vê-lo sempre. E isso sim, não tem preço.
[...]
Gente eu amo tanto o GS!!! 😍 Gostaram da Babi e do GS sendo primos?
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Um Mafioso para Amar | BABICTOR
أدب الهواة[NOVO TÍTULO] Título antigo: PARA SEMPRE E SEMPRE BÁRBARA PASSOS se muda para o Rio com seus pais, pois sua tia, mãe do GS acabou de ficar viúva. Ela e o primo são inseparáveis. Ainda na sua primeira semana na cidade nova, Babi se depara com uma si...