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Violet

     Os cheiros do café da manhã invadiam meus pulmões, ovos, bacon, torradas recém feitas com manteiga, e o aroma de bolinhos tiravam aos poucos meus pensamentos do pesadelo da noite anterior, dos grunhidos de raiva e de terror, até eu conseguir sentir o sol atingindo minha nuca em um delicado carinho.

— Quando começam os exames?— Emmeline perguntou, esfreguei meu rosto, tentando comer uma parte dos ovos presentes no meu prato. Ela não falava dos N.O.M.S, mas dos exames que tínhamos todos os anos, menos no quinto e sétimo.

— Nenhum professor falou— Lily respondeu, Remus, ao seu lado, concordou com a cabeça.

— Não fale de exames, Alice ficou verde— Marlene falou, em tom condescendes, a citada estava do meu lado direito, com Frank no assento seguinte, ele a olhou preocupado, mas ela estava normal.

— Não estou mais tão preocupada— ela respondeu, comendo mais do que seu antigo nervosismo deixava, Frank sorriu de lado por isso.

— Querem ver alguém verde?— me virei instintivamente para a voz de Sirius, e isso me fez franzir a testa. Ele se virou para James ao seu lado— o jogo final é em menos de um mês.

— Quanto tempo demorariam para perceberem que você sumiu?— James perguntou, fingindo ameaça na voz, enquanto bebia de sua taça, Sirius sorriu largo.

— Duas semanas— Remus respondeu, mesmo a pergunta sendo retórica, Sirius o olhou ofendido.

— 6 meses— Lily falou, sorrindo quando ele lhe lançou a mesma resposta pelo olhar.

— 9 meses— Mary falou, ela normalmente não se envolvia naquelas piadas, mas parecia contente.

— Perceber o sumiço de quem?— Marlene perguntou, tirando gargalhadas de meus amigos enquanto Sirius revirava os olhos, não consegui rir, apenas encarei meu prato.

— Você está bem?— Thomas estava sentado do meu lado esquerdo, e esqueceu de diminuir o tom de voz, atraindo a atenção imediata de todos.

— Estou— respondi, mas levei a mão instintivamente para a barriga, o ferimento havia se curado, mas a cicatriz ainda doia.

— Você não parece bem— Alice falou, colocando uma mão em meu ombro, não pude impedi-lo de cair, estava exausta, não dormia direito fazia dias, a situação da minha amizade com Sirius me perturbava, e Thomas ultimamente parecia querer passar mais tempo juntos.

— Só preciso de ar— expliquei, me levantando com uma bola de algodão na garganta, e sem conseguir olhar para nenhum deles ao seguir para fora do Salão Principal.

Minha mente circulava de um problema para o outro como o desenho mais confuso que eu já tinha visto. Ninguém havia encontrado nem rastro do lobisomem que eu ataquei, e isso deixava uma grande dúvida se ele apareceria depois, mesmo que Lily houvesse avisado Dumbledore e ele tivesse instalado mais defesas ao redor do castelo, sabíamos por experiência própria que sair dali não era tão difícil.

Os pesadelos vinham toda à noite, fantasmas do presente e do passado me atormentavam até que eu me sentisse como uma criança assustada, e, quando eu saia da minha cama, a pessoa que eu encontrava na Sala Comunal era... Thomas, que me abraçava mesmo que eu não conseguisse ou pudesse responder suas dezenas de perguntas sobre o motivo de estar tão assustada, o problema nessa questão era que, seus abraços, eles nunca pareciam o suficiente para espantar aqueles medos profundos da minha alma, eles sempre pareciam insuficientes em me acalmar, e aquela falta de profundidade me martelava como uma pontada insistente depois de uma corrida.

Minha ideia era ir para o dormitório, mas, quando ainda estava no primeiro andar, bati de frente contra outra pessoa por causa da minha visão desfocada do caminho.

— Desculpe— pedi, a Professora McGonagall voltou a reequilibrar sua pilha de papéis no braço, resmungando, mas parou quando me olhou.

— Venha, entre— ela pediu, eu não soube o que ela tinha visto em meu rosto para isso, mas aceitei, pensando que uma xícara de chá seria boa naquele momento.

A lareira estava apagada, mas cinzas ainda manchavam as madeiras desgastadas. Havia ido parar tantas vezes naquele escritório junto com os outros ao longo dos anos, que as poltronas eram tão familiares quanto as da minha casa. Me sentei em uma delas, me deixando afundar no estofado.

Com um aceno de varinha, ela fez sua chaleira e seu pote de biscoitos de gengibre aparecerem, mas, como não estava esperando visitas, a chaleira estava vazia, não reclamei.

— O que a atormenta, criança?— ela perguntou, a voz gentil, estava acostumada a levar broncas ao ir ali, e a pergunta me pegou desprevenida.

Peguei um dos biscoitos quando ela ofereceu o pote, o analisando na mão, não tinha comido quase nada no café da manhã, e meu estômago doía. Olhei para o campo de Quadribol vazio, usando a vista como desculpa para pensar no que dizer.

— A senhora já esteve apaixonada?— perguntei, não falaria sobre os motivos que atormentavam meus momentos adormecidos, então perguntei sobre o que me importunava nas horas despertas.

     Minerva levantou uma sobrancelha em surpresa, perdendo momentaneamente a carranca séria, a expressão se tornando tão frágil quanto cristal, pensei em mudar a pergunta, mas ela se recompôs facilmente, pigarreando e franzindo a boca.

— Suponho que sim— a resposta foi superficial demais para a pergunta, mas eu não podia esperar que ela me contasse de algum amor verdadeiro.

— Como é?— perguntei, repartindo o biscoito no meio, era estranho ter aquela conversa com ela, mas, a quem mais perguntaria? Meus amigos ainda descobriam os próprios sentimentos, e minha mãe nunca falaria comigo sobre meu pai.

— Como correr em uma colina no meio de uma tempestade— libertador, contagiante, eufórico, assustador. Foi a minha vez de ficar surpresa com sua resposta, enfiei uma metade do biscoito na boca, encarando as migalhas na saia.

— Como eu sei que estou?— perguntei, ela suspirou, cruzando os dedos no colo.

— Você sabe, no fundo, mesmo que tente esconder da superfície, você sabe— ela respondeu, franzi minha testa quando uma bombardeio de pensamentos começou.

     A primeira lembrança rápida foi do aniversário de Sirius, na praia, quando senti que poderia dizer qualquer coisa ali, e ninguém poderia nos escutar, mesmo que meus amigos estivessem a alguns metros de distância, e a sensação não foi de ser invisível, mas de ser completamente ouvida e entendida por ele. E, quando o pensamento dos dias que nos deitamos na grama do campo de Quadribol me atingiu, me lembrando de como me senti confortável naquele momento, mesmo estando de costas na grama... me levantei, Thomas, eu deveria ter pensado nele com a frase da professora, não em Sirius, e na forma que me senti na noite de ano novo.

— Obrigada— falei, me dirigindo para a porta sem esperar resposta, a professora murmurou algo, mas não a ouvi.

Procurei certeza nos pensamentos, tentando de todo jeito negar o que me vinha tão claramente, mas, não podia, eu não podia ter escondido isso, aquilo tinha que ser apenas uma confusão pelo cansaço, eu não podia...

O corredor estava vazio, então continuei meu caminho para a Sala Comunal, minha mente ardendo com a consciência pesada. Thomas havia me perguntado sobre meus sentimentos, e eu simplesmente assumi que estava confusa quando pensei em Sirius, e talvez fosse só isso, confusão. Mas, quanto mais pensava sobre minha amizade com ele, mais seu afastamento fazia sentido, ele desconfiava de meus sentimentos, por isso quis quebrar nossa amizade? Não, aquilo tinha que ser outra coisa.

Não.

A outra Pettigrew Onde histórias criam vida. Descubra agora