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Violet

     A grama, ainda molhada, fazia barulho sob meus sapatos quando parei no meio do jardim, respirando fundo o ar afiado do frio, não tanto quanto nos meses anterior, mas o suficiente para que eu apertasse o casaco bege ao meu redor. Thomas chutou uma erva daninha, hesitante, havia ficado um pouco surpreso por eu o ter chamado para uma caminhada antes do café da manhã, estava meio ausente desde a conversa com McGonagall, e, depois da certeza da noite anterior... precisava ter aquela conversa.

— Thomas— chamei, parando a um metro de distância, ele abaixou a cabeça minimamente para conseguir olhar em meu rosto, os olhos verdes desconfiados.

— O que aconteceu?— ele perguntou, encolhi minhas mãos para dentro do casaco, tentando esquentar os dedos, e ter algo a fazer com elas.

— Preciso ser honesta com você— falei, era tudo que eu podia fazer, ele concordou com a cabeça, a testa franzida— você é um bom amigo, e uma ótima pessoa, queria que soubesse, não tem nada a ver com isso.

— Não estou gostando do rumo dessa conversa— ele comentou, cruzando os braços e respirando fundo, o ar se condensou na frente do seu rosto, também o fiz, tomando coragem para dizer as duras palavras.

— Eu sinto muito, mas, acho melhor terminarmos— falei, ele piscou, descruzando os braços com o choque, fechei os olhos por alguns segundos, sentindo o coração palpitar em nervosismo.

     Thomas se afastou alguns passos, virando de costas, olhando para o céu de um límpido azul, e a grama que era iluminada por frescos raios de sol, queria saber o que passava em sua mente, mas, talvez, fosse melhor assim. Minha consciência, tão pesada naquela manhã que queimava, se aliviou um pouco, meus ombros ficando mais leves por ter dito aquelas palavras, eu só me perguntei se era por revelar a verdade, ou por terminar o relacionamento.

— Por que?— ele perguntou, voltando a se virar para mim, o semblante mais duro e irritado, mordi o lábio inferior, hesitante.

— Eu...— neguei com a cabeça, a coragem falhando em meu peito, mas ele merecia a verdade depois de não ter feito nada, além de confiar em mim— tenho sentimentos por outra pessoa.

— Você...— ele colocou a mão na boca, a mandíbula trincada, como se quisesse conter as palavras, e sua resposta foi uma risada tossida e amarga— claro que sente.

— O que quer dizer?— perguntei, ficando na defensiva, não sabia de nada daquilo durante nosso relacionamento.

— Você nunca foi uma namorada muito exemplar, eu diria— comentou, pisquei várias vezes, surpresa, ele sorriu, sorriu— passávamos mais tempo com seus amigos do que sozinhos.

— Eu, normalmente, passo mais tempo com meus amigos— expliquei, tínhamos ficado sozinhos, poucas vezes, mas raramente interagíamos mais do que beijos, e esse pensamento me fez questionar o quanto nos conhecíamos.

Estamos em um relacionamento, Violet— ele ciciou, desacreditado— não queria ficar tantas horas com pessoas que não se importam com a minha existência.

— Você devia ter dito algo, conversado comigo se isso te incomodava— aquilo eu sabia que faltava ali, comunicação. Ele passou as mãos no cabelo, soltando outra risada abafada.

— Agora não faz diferença, faz?— questionou, cruzei os braços, não, não fazia. Ele olhou para o castelo na esquerda, o semblante se abrindo momentaneamente antes de voltar a se fechar— é ele, não é?

— O que?— perguntei, mas tinha um pressentimento sobre o que queria dizer, ele me olhou incrédulo.

— Sabe que estou falando de Sirius, está apaixonada por ele, não está?— questionou, não respondi, mas o silêncio naquela pergunta lhe foi resposta o suficiente, ele trincou os dentes— desde quando sabe?

— Desconfio faz três dias, tive certeza ontem— respondi, ele levantou as sobrancelhas, concordando com a cabeça, estava vermelho, e sua garganta ondulava pelo coração acelerado.

— Eu te ajudei— comentou, baixo, franzi a testa, esperando que continuasse, ele me encarou— quando você estava tendo aqueles pesadelos idiotas, eu estava lá por você, e é isso que eu ganho.

Dei um passo para trás, minha garganta ficando fria quando escancarei a boca em surpresa, ele jogava na minha cara àquelas noites na Sala Comunal? Com a sua frase, me lembrei de algo que aconteceu em meu terceiro ano, quando Remus ficava nos agradecendo por cada mínima coisa, eu entedia, éramos seus primeiros amigos, mas, um dia, James segurou nos ombros dele e disse, "somos seus amigos, Remmy, e escolhemos ser, estar ao seu lado, não nos deve nada por isso".

— Não lhe devo nada por isso, assim como você não me deve as horas que fiquei ouvindo suas histórias repetidas, escolhemos ficarmos juntos— falei, minha cabeça queimando, agora com irritação. Ele mexeu com o queixo, suspirei— sinto muito, Thomas, nunca quis magoa-lo, por isso estou sendo honesta aqui.

— Honestidade— ele caçoou, os olhos brilhando quando analisou meu rosto, mas não teve tempo de derramar as palavras venenosas, quando senti um braço se encaixar no meu.

— O que estão fazendo aqui essa hora?—Dorcas perguntou, sorrindo amigavelmente. Ela tinha os cabelos enrolados presos no alto da cabeça, e ofegava levemente.

Estamos conversando— Thomas ciciou, ela levantou as sobrancelhas, nem um pouco afetada pela agressividade.

— É urgente? Queria andar mais um pouco, e falar com Vi— ela falou, se fingindo de desentendida, Thomas pressionou os lábios, pelo seu próprio ego, não falaria o motivo da discussão.

— Acho que terminamos— ele respondeu, e me olhou uma última vez— ele nunca vai te fazer feliz.

E, com essa premonição, subiu as escadas de pedra de dois em dois e voltou a entrar no castelo, senti meu peito se soltar e apertar, estava aliviada por ter terminado, mas, ainda haviam sido dois meses e meio da minha vida, e eu ter relaxado com sua partida apenas pesou em meus ombros. Dorcas assoviou, negando com a cabeça, e soltando o braço do meu.

— Esquentadinho— comentou, ficando na minha frente e analisando meu rosto— como você está?

— Nós terminamos— falei, ela levantou as sobrancelhas, pressionando os lábios ao me puxar para um abraço, o aceitei, suspirando— foi pro melhor.

— Eu sei, você merece bem mais— ela respondeu, esfregando minhas costas, antes de se afastar e negar com a cabeça— mas, relacionamentos são complicados.

— Queria falar comigo?— perguntei, querendo mudar de assunto, ela negou com a cabeça, colocando as mãos na cintura.

— Não, gosto de caminhar sozinha, mas ele parecia muito irritado apenas para uma conversa— ela respondeu, concordei com a cabeça, me sentindo agradecida por ela ter cortado a discussão.

— Vou entrar, então, obrigada— falei, ela apoiou uma mão em meu ombro, ainda preocupada, sorri levemente, me virando para entrar na escola, e ouvindo seus passos se distanciarem, para mim, correr naquele frio era algum tipo de insanidade.

🌖

Tomei café sozinha, geralmente meus amigos chegavam um pouco depois do horário, mas, passar aquele tempo com meus próprios pensamentos foi bom para organiza-los, lembrando daquelas duas semanas infernais e sentindo orgulho de mim mesma por estar conseguindo devorar um prato inteiro de ovos e bacon. Pensar em meu relacionamento também não tirou meu apetite, descobrir que meus sentimentos por Higgs eram apenas de amizade não havia sido algo tão ruim, e Dorcas tinha razão, eu merecia mais do que alguém que estava ao meu lado pensando em retribuição, e, mesmo que fosse precisar de alguns dias para deixar aquele sentimento de estranheza de lado, me sentia livre, o que falava muito sobre como nosso compromisso era ruim.

Se fosse para escolher entre um relacionamento precário e estar sozinha, não precisava pensar duas vezes em dizer que amava minha própria companhia novamente, e o sentimento me fez querer chorar de alívio e felicidade.

A outra Pettigrew Onde histórias criam vida. Descubra agora