46. Todos Por Um

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Depois de termos batido e chamado bastante, pensei que Ulisses não fosse conseguir abrir aquela porta à força, mas em algum momento a guarnição, que provavelmente nunca havia sido trocada, cedeu.

Chamamos várias vezes e ele não respondeu, então entramos. As luzes estavam apagadas, mas a televisão, em volume baixo, iluminava a sala. Tropecei em alguma coisa, mas Ulisses me segurou, me impedindo de cair. Olhei para baixo e vi garrafas de bebidas alcoólicas.

— Pierre? — Chamamos várias vezes.

— Vamo ficar perto um do outro, tá bom? — sussurrou Ulisses ao meu lado.

— Tá bom.

Sentimos um cheiro ruim que vinha da cozinha e lá nos deparamos com toda a louça suja e lixo espalhado.

Olhamos alguns cômodos, que estavam mais intactos. Um grande escritório com uma estante repleta de livros, um cavalete de pintura e várias telas pintadas a óleo e uma obra inacabada no cavalete. Outros dois quartos mais simples e com o básico, como se ninguém mais morasse ali. Até que paramos diante do que parecia ser o último cômodo.

Chamamos algumas vezes antes de eu empurrar a porta entreaberta. Roupas espalhadas pelo ambiente, a única iluminação vinha das frestas da persiana e de outra televisão ligada em volume baixo, uma caixa de pizza aberta, com algumas fatias ainda dispostas sobre ela.

Sobre a cama, alguém parecia estar encolhido debaixo do cobertor.

— Pierre? — chamei.

Ulisses gesticulou para mim, dando a entender que iria tirar a coberta.

— Cuidado — sussurrei.

Com muita cautela, o Ulisses hesitou muito até que descobriu a cabeça do sujeito sob a coberta. No mesmo instante, Pierre escondeu o rosto debaixo do travesseiro.

— Pierre! — exclamei, correndo em sua direção. — Olha pra mim, Pierre.

— Vocês não deveriam estar aqui. — Ouvi sua voz abafada debaixo do travesseiro.

— Pierre, por favor, olha pra mim e fala comigo... Eu te peço por tudo o que é mais sagrado! — Depois do meu pedido, pude ver seus olhos verdes se revelando na minha direção, saindo de debaixo do travesseiro.

Eu soltei um suspiro de alívio e me sentei na cama, puxando a cabeça dele para o meu colo. Pierre passou os braços em volta da minha cintura e, como uma criança, deixou que eu alisasse seus cabelos bagunçados.

— Tu não tais sozinho. A gente tá bem aqui contigo. Ouviu? Tu não tá sozinho.

Senti lágrimas molhando a minha blusa e um pranto repleto de gemidos tomou conta do ambiente. Ele me apertou mais forte e Ulisses se aproximou, tocando o ombro dele.

— Pierre, tu não tá sozinho... — era tudo que eu conseguia dizer, porque eu queria que ele tivesse certeza de que nunca mais estaria sozinho.

Eu jamais o abandonaria.

Não faço ideia de quanto tempo ficamos abraçados com Pierre, me pareceram horas. As minhas costas doíam e as minhas pernas estavam dormentes quando percebi que ele dormiu.

Cobrimo-lo com o edredom e ficamos em pé, nos alongando. Ulisses me abraçou e beijou o topo da minha cabeça antes de perguntar:

— O que a gente faz agora?

Olhei em volta e depois ergui a cabeça para ele.

— A gente limpa.

— Acho bom você avisar a sua tia que vai demorar pra chegar em casa.

Fé, Lis! Um Romance Quase ClichêOnde histórias criam vida. Descubra agora