42. Frutos Mágicos

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O primeiro dia foi intenso. À primeira vista, aquela parecia uma cafeteria normal, mas detrás daquele balcão, especialmente com o grupo que lá se reunia, eu me sentia em um verdadeiro laboratório.

Era diferente de ver Maria Flor aprender a andar, ler ou ter o seu primeiro dia de aula. Diferente de estar em um relacionamento novo, dividir a vida ou a casa com alguém. Dessa vez, era por mim. O meu curso e a minha carreira.

Eu já estava feliz pela SB Koffee, através de Ulisses, além de investir na minha formação como barista, também me liberar para fazer as aulas no meu período de expediente. A única coisa que me incomodava com tudo isso era saber que nada estava passando despercebido por Laura, que insistia que eu sempre arrumava alguma desculpa para não trabalhar e isso já fazia alguns dos colaboradores começarem a olhar torto para mim, mesmo que fizessem de tudo para não concordar com Laura.

O que eu não esperava era que a minha formação seria na Vandenberg Instituut Brasil, a melhor formação do país e uma das melhores do mundo, com o próprio Dirk Vandenberg. Nem a própria Suzy tinha feito esse curso a que eu estava tendo acesso e nem conheceu o Dirk pessoalmente. Muitos de seus alunos iam de lá direto para o exterior ou abriam sua própria cafeteria, e lá estava eu.

— Por que vocês estão aqui? — perguntou Dirk, que era um homem gigante, musculoso, careca, de sobrancelhas ruivas e olhos azuis, bonito e enérgico, assim que chegou onde nós estávamos.

Olhamos uns para os outros, sem saber como reagir.

— Só pra avisar, todo mundo acabou de perder um ponto de iniciativa.

— Como assim? — questionou uma jovem muito magra, de óculos.

— Como assim?! Eu é que pergunto: como assim? Agora me diga: por que você está aqui? — insistiu o careca, encurralando a garota magra.

— Eu não sei...

— Não sabe?!

— N... N-Não...

— Fora!

— Quê?!

— Você é surda, garota? Quer que eu desenhe? Cai. Fora.

A jovem, na mesma hora, saiu do local chorando e todos nós estávamos estarrecidos testemunhando aquela cena.

— Mas alguém quer ir junto com ela? — indagou. — Que fique bem claro que se você não sabe por que está aqui, é melhor nem continuar. Já que estou vendo que ninguém aqui tem iniciativa, eu mesmo vou chamar de um em um... Você! — disse, apontando para um rapaz baixinho e encurvado.

— Sim, senhor!

— Tá pensando que tá no exército, é, moleque? Agora diga: por que você está aqui?

— Pra fazer café?

Vixe que esse boyzinho vai se lascar é agora! pensei com meus botões.

— Fora!

De cabeça baixa, o rapazote saiu em marcha fúnebre.

— Professor! — chamei, levantando a mão enquanto ele cruzava os braços e me encarava com seu par de sobrancelhas vermelhas franzidas. — Só sei que eu não vim lá de Recife, do Nordeste, pra ser tratada feito basculho, não, viu?

— E o que é que é basculho?

— O senhor vai saber o que é se vier com resenha pro meu lado. Porque eu não vim aqui pra brincar de casinha, não.

Boquiaberto, o careca olhou fixamente para mim por uns dez segundos. Depois, olhou ao redor.

— Cadê, minha gente?

Fé, Lis! Um Romance Quase ClichêOnde histórias criam vida. Descubra agora