FREDERICK
"Vingança deve ser;
A disciplina despertada proclama em voz alta a sua causa,
E a armada ferida exorta a quebrar suas leis."
Byron
Margaret começou a se perguntar se todos os pedidos de casamento eram assim tão insuspeitados de antemão – e tão angustiantes quando ocorriam, como os dois que ela havia recebido. Uma comparação involuntária entre Mr. Lennox e Mr. Thornton surgiu em sua mente. Ela lamentava que tivesse surgido das circunstâncias, no caso de Henry Lennox, a expressão de algum outro sentimento além da amizade. Aquele pesar fora o sentimento predominante, na primeira ocasião em que recebera uma proposta. Não se sentira tão aturdida, tão impressionada como agora, quando os ecos da voz de Mr. Thornton ainda permaneciam na sala. No caso de Lennox, pareceu que ele ultrapassara por um momento os limites entre amizade e amor; e, no momento seguinte, lamentou isso quase tanto quanto ela, embora por razões diferentes. No caso de Mr. Thornton, até onde Margaret sabia, não houve nenhuma fase intermediária de amizade. O relacionamento dos dois tinha sido uma série contínua de enfrentamentos. Suas opiniões colidiam. E, na verdade, ela nunca tinha percebido que ele gostava das opiniões dela, apenas por pertencerem a ela, a pessoa. Ele parecia se livrar dessas opiniões com desprezo, na medida em que desafiavam seu caráter forte como uma rocha, intensamente passional, e até que Margaret se cansasse do esforço de fazer protestos inúteis. E agora ele viera, naquele estranho modo apaixonado e selvagem, declarar o seu amor. Embora no princípio isso a tivesse chocado – que o pedido dele fosse forçado, e determinado por sua forte compaixão pela situação a que ela se expusera, que ele, assim como outros, poderia entender mal – ainda assim, antes mesmo que ele deixasse a sala, e certamente não cinco minutos depois, ela começou a entender, e viu brilhar claramente à sua frente, que ele na verdade a amava, que já a amava antes, e que ainda a amaria. E ela recuou e estremeceu, como se estivesse sob o fascínio de algum grande poder, que em toda a sua vida prévia sempre considerara repulsivo. Margaret arrepiou-se e tentou fugir dessa ideia. Mas era inútil. Parodiando uma linha do Tasso, de Fairfax:
"A sua poderosa ideia vagou pelo pensamento dela."
Ela o detestava ainda mais por ter dominado a sua vontade interior. Como ele ousava dizer que ainda a amaria, mesmo que ela o desprezasse? Desejou ter falado com mais... força. Falas afiadas, decisivas, vinham à sua mente, agora que estava muito tarde para dizê-las. A impressão mais profunda daquela entrevista era como a do horror dentro de um sonho – que não deixa o quarto enquanto não levantamos, esfregamos os olhos e forçamos nos lábios um sorriso duro e rígido. Que fica lá... lá, em algum canto do quarto.. se encolhendo e gaguejando, com horríveis olhos fixos, escutando para ver se ousamos denunciar sua presença para alguém. E nós não ousamos; pobres covardes que somos!
Ela estremeceu ante a ameaça do seu amor eterno. O que ele quis dizer? Será que ela não tinha o poder de amedrontá-lo? Pensaria sobre isso. Era preciso mais do que a ousadia de um homem para ameaçá-la dessa maneira. Ele baseara tudo aquilo apenas no miserável dia de ontem? Se fosse necessário, ela faria a mesma coisa amanhã – por um mendigo aleijado, de boa vontade e alegremente. Mas por ele, ela voltaria a fazer tudo da mesma maneira, com a mesma coragem, apesar das deduções dele e da fria lama que as mulheres lhe atirariam. Fizera aquilo porque era certo, e simples, e verdadeiro, salvar onde houvesse o que salvar - até mesmo tentar salvar. Fais ce que dois, advienne qui pourra.
Até esse momento ela não se movera de onde estava quando ele saíra. Nenhuma circunstância externa a tinha despertado do transe de pensamento em que fora mergulhada pelas últimas palavras dele, e pelo olhar dos seus olhos profundos, atentos e apaixonados, cujas chamas tinham feito seus próprios olhos cederem diante deles. Ela foi até a janela e escancarou-a, para dispersar a opressão que pairava em torno de si. Depois abriu a porta, com uma espécie de impetuoso desejo de livrar-se das lembranças da última hora na companhia de outras pessoas, ou fazendo algum esforço produtivo. Mas tudo estava profundamente silencioso na quietude do meio-dia, em uma casa onde um inválido dorme o sono agitado que lhe é negado nas horas da noite. Margaret não queria ficar sozinha. O que deveria fazer? Ir ver Bessy Higgins, é claro, pensou ela, quando a lembrança da mensagem enviada no dia anterior cruzou-lhe a mente.