Mantenha o Controle

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Era segunda-feira novamente. Uma semana que estava com os Cullen. Na última quarta, Edward havia me poupado da sua dúvida inicial, pelo que revelei sobre Beethoven. Respeitou meu silêncio depois daquilo, apenas agradeceu por eu ter compartilhado as memórias e usou as formalidades de uma despedida entre estranhos antes de ir embora. Eu sabia que a dúvida lhe incomodaria até eu saná-la, mas eu certamente não tinha pressa para fazer aquilo.

Há semanas não me alimentava e já estava começando a sentir os primeiros sintomas da fome no sábado. Era meu dever contar o fato a Carlisle. Então esperei o mesmo chegar em casa, depois de seu turno no hospital e um tempinho ainda para se acomodar, então fui até ele no seu escritório. Chegando lá, ele estava lendo algo até parar ao ver-me.

-Olá. –falei demonstrando timidez, por ser o certo a se fazer no momento.

-Olá. –Carlisle respondeu gentilmente. –No que posso ajuda-la?

-Bem... Você me disse para avisar quando estivesse sentido fome e começou sábado, mas não era tão forte como agora.

O doutor analisava a situação, até que chegou a uma conclusão que eu não havia totalmente concordado, mentalmente.

-Chamarei Edward e Jasper para irem conosco. Caçaremos durante esta madrugada. Tudo bem para você?

-Tudo bem.

Assim que concordei, saí do escritório e fui para meu canto, rapidamente. Ele ainda não tinha conhecimento de que o filho não poderia ler minha mente. Se eu perdesse o controle, Edward não teria nada para usar, além de sua força vampírica. Emmett seria mais útil que ele.

 “Mantenha o controle”.

Eu iria caçar animais para me sustentar. Carlisle havia me dito que eles me manteriam consciente, mas eu sentiria certa insuficiência alimentar, porém, com o tempo eu me acostumaria com aquilo.

Quando eu caçava, não era totalmente eu mesma, apenas o possível para seguir a estratégia que já havia feito. Eu espionava minhas futuras presas quando começava a sentir fome e deixava esta última crescer. Assim que a sede fosse insuportável, eu perseguia a vítima, de acordo com o meu plano, e a matava sem misericórdia. Eu me tornava um animal inteligente por inteiro. Havia vivido daquela forma por muito tempo. Tinha consciência do desafio que seria poder me costumar aos modos dos Cullen, mas não havia mentido quando dissera que estava se tornando insuportável matar pessoas. Aquilo havia começado há um bom tempo.

Fazia três meses desde a morte de Beethoven. Eu estava faminta, mas em luto. Foi a minha primeira tentativa de me livrar do sangue humano. Não havia mais com quem conversar. Não tinha mais meu amigo e a solidão me rondava amargamente. Lembrava-me de como havia “suportado” ficar só, antes de Ludwig. Mas passei anos na presença do mesmo e havia me desacostumado a ficar sozinha. A ficar eternamente sozinha. Queria ter pelo menos mudado em algo importante e continuar com aquilo, sempre. Pensava que logo voltaria às sombras silenciosas que eram antes, a dor constante de perda e acrescentara mais uma em minha lista de tortura mental. Pensava que seria mais fácil suportar a dor, com algo que pudesse até me orgulhar em minha eternidade. Pensava que não havia aprendido nada tão importante com Ludwig van Beethoven.

Acreditava que se conseguisse me controlar perto das pessoas, mesmo com fome, eu logo me acostumaria e não sentiria mais sede por sangue humano. Aquele havia sido o meu erro.

 Estava andando pelas ruas de Viena, pois não queria deixar aquela cidade antes de me controlar, por questões sentimentais amigáveis, por Beethoven. Era noite e nevava fracamente. Estava concentrada na “Sonata No. 14 em C menor” em minha cabeça. Haviam poucas pessoas caminhando no trecho em que eu estava e eu ficava ao máximo de distância delas. O cheiro do sangue estava impregnando meu corpo, mas eu ainda estava no controle. Pensava que havia conseguido me controlar o bastante, então virei-me em uma viela a minha esquerda para poder fugir da tentação que me rondava. Já estava na metade da viela quando fui puxada bruscamente para trás e depois pressionada contra a parede. Assim que me recuperei do susto, compreendi que um homem alto e robusto estava tentando me violentar. Imediatamente arremessei-o contra a outra parede. Ouvi quando o mesmo quebrou a costela, mas o que notei primeiramente foram os arranhões que sangravam de forma fraca, mas suficiente. Quis correr, sair dali o mais rápido possível. Porém o sangue invadia minhas narinas fortemente. Por final, meu instinto me dominara e cravei minhas presas na veia jugular daquele homem. Enquanto sugava o sangue, não pensava em mais nada do que sanar minha fome, contudo, quando terminei ia limpar minha boca com a manga direita da camisa dele, até que levei meu olhar a mão que saia da manga e vi minha bolsa de dinheiro nela. Fiquei confusa, pois antes ele parecia querer me violentar. Ao me levantar, de dentro do casaco do homem caiu um papel dobrado. Por mera curiosidade peguei e logo o abri e o que vi ali desfez a minha dúvida anterior ao mesmo tempo em que me deixou em choque. No papel havia uma pintura de uma mulher, aquele homem e duas crianças pequenas, parecendo terem mais ou menos dois anos de idade. Lembro-me bem que na dedicatória dizia “Ao marido afetuoso e ao pai amado”. Naquele momento eu caí para trás em choque, olhando para o cadáver a minha frente quando uma lágrima atrasada caiu dos olhos opacos dele, ainda abertos. Cobri minha boca com minhas mãos, depois as afastei e olhei para elas sujas de sangue.

Por dias eu me torturei mentalmente com a imagem daquele homem morto a minha frente. Foi então que me lembrei da paz de escutar Beethoven tocar piano e ansiei por aprender a tocar. Logo iniciei meus treinos. Mais do que nunca comecei a sentir como era tocar aquele instrumento. Mas certamente não era apenas aquilo. Pude sentir a plenitude, a paz que Beethoven me ensinara, novamente. Comecei a senti-la não só quando tocava, também quando parava para prestar atenção na natureza. Sabia que minha paz duraria até ter fome novamente, mas prometi a mim mesma precaução dobrada com minhas presas, pesquisando sobre elas semanas antes. Por fim, tomei conhecimento de que Ludwig van Beethoven havia me ensinado; além de tantas coisas sobre a vida como a capacidade de um sonho e o valor do esforço e enfrentamento das dificuldades; a apreciação verdadeira da música e o que ela podia fazer, e essas eram e sempre seriam lições inestimáveis.

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