Capítulo 2

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E justo quando eu achava que meu sábado não podia piorar ali estava eu, parado num engarrafamento quilômetro na Linha Reddo, dirigido a van da floricultura do meu pai, voltando de Kirigakure para Konoha, depois de uma infeliz escolha de caminho alternativo. Tentei me concentrar no número de vezes que o limpador de pára-brisa ia e voltava, dispersando a chuva fraca, para não ter de pensar muito em como minha vida era mesmo um fracasso. 

Mas parecia impossível ignorar os fatos e pensar positivamente! 

Ah, se arrependimento matasse… 

Eu só queria saber quantas pessoas carentes, como eu, haviam abaixado as calças na frente de um primo, como eu, e dado uns amassos nele. NUM FUCKING CEMITÉRIO!

Quanta baixaria, meu Kami! Literalmente! Será que era tão difícil manter um pouco de decência e dignidade na minha vida de merda multiplicada por mil? Para início de conversa, de onde eu tinha tirado tanta coragem para uma coisa daquelas? Logo eu, a pessoa mais covarde a eu conheço. E eu ainda me culpo não apenas pelo ato infame em si, mas também por ter enfiado o pé no acelerador quando o primo Eiji se debruçou na janela da van e perguntou naquela voz mais desavergonhada: "E aí? Foi bom para você?". Ele bateu a cabeça com tudo na lataria da van. Não sei se rachou, mas sei que doeu, pois tive tempo de ouvir o grito. 

Ah, sério, de verdade, eu não tive escolha! Se ele não tivesse se debruçado ali e falado asneira no meu ouvido, o ouvido de um garoto azarado, desempregado, endividado, carente, mal-amado e, consequentemente, imprevisível, eu nunca teria me enchido de raiva e acelerado daquele jeito. Nunca!

Ele ainda teve a pachorra de correr atrás da minha van e jogar pela janela um cartãozinho com o número de celular: "Me liga pra contar?!"

Só não mandei o dedo do meio para ele pela janela porque meu tio-avô estava parado na porta de casa, acenando para mim. 

Quer saber? Bem feito para ele. Para o Eiji, que fique claro. 

E tem mais, eu deveria ter mirado melhor. Isso aí. Deveria ter esmagado os pés dele. Ou causado uma contusão no meio das pernas. Sinceramente, depois de ele ter me mostrado sua margarida e, no fim das contas, não ter cumprido o seu papel, ele merecia perder os dedos dos pés. Ou virar eunuco. 

Foi bom pra você… Bom pra você…

Quando que as coisas haviam sido  boas para mim, afinal? Uou! Eu não conseguia me lembrar! 

Ah sim, eu lembro. 

Meu primeiro beijo… muito, muito bom.

Não exatamente o primeiro, mas o segundo. É que o primeiro foi tão ruim que nunca cheguei a considerá-lo nos cálculos.

Aconteceu no aniversário de 15 anos de Uchiha Itachi, meu então melhor amigo. Era fim de festa no Distrito Uchiha, a propriedade do clã Uchiha, nos arredores de Vila da Folha. Eu estava sentado sozinho na beira da piscina, agitando a água com os dedos e observando as pequenas ondas se formarem na superfície. Que fiasco, eu não parava de pensar, decepcionado com o gosto de banana-nanica da boca do Kentaro, o primeiro garoto que me beijou; que tinha acabado de me beijar, na verdade.

E bem… eu meio que estava chorando. Boca com gosto de banana? E nanica ainda por cima? Ninguém menciona isso nas comédias românticas ou nas fanfics eu costumava ler escondido. 

Quando tirei meus sapatos e mergulhei as pernas na água da piscina, senti que estava sendo observado e me virei para ver quem era.

Ele. O garoto por quem nutria uma paixão secreta, o amor da minha vida, meu amigo de infância. Ele, meu colega de classe no Conservatório Regional de Música, o guitarrista e vocalista da banda Dayse Jones and The Six. Ele, de cabelo comprido e espetado, abaixo dos ombros (aos 15 anos eu tinha uma queda por roqueiros convictos), o irmão de Itachi, a serenidade e espontaneidade em forma de gente: Uchiha Obito

O Azar É SeuOnde histórias criam vida. Descubra agora