Capítulo 14

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Algumas Olimpíadas  depois, ali estava eu, ouvindo vagamente o falatório de papai.

-- É tudo muito acelerado. - Ele continuava divagando sobre o trânsito. - Você vê… no meu tempo, o carro era coisa de luxo.

Papai era estreante na casa dos cinquenta, mas seu rosto cansado somava-lhe uns anos na aparência. Não que ele fosse triste. Pelo contrário. Tinha um humor invejável, a não ser quando dava para falar das peripécias político-econômica do nosso governo. Eu não o culpava. Ele passará pela guerra civil. 

Talvez seu cansaço fosse fruto das irreparáveis noites mal dormidas, já que, quando bebê, eu chorava sem parar graças a um pé torto congênito que levou dois anos para ficar totalmente curado.

Ou talvez fossem os pesadelos em decorrência do estresse pós-traumático dos tempos de guerra. Meu pai demorou a se adaptar a vida civil. 

- Fiz lasanha de queijo. - Ele se levantou para fechar as janelas da sala, isolando o vento frio das noites de inverno. Konoha está a menos de duzentos quilômetros de Kirigakure mas parece distante uns dois trópicos no que se refere ao clima. Mas isso tem a ver com a diferença de altitude entre as duas cidades. - Está na geladeira, é só esquentar. Mas o seu cabelo está mesmo esquisito… Ventania em na Aldeia da Névoa? 

- Não estou com fome, obrigado. - Mudei de assunto: - Deu movimento na loja hoje? 

- Um minuto. - Ergueu a mão. - Você está bem? Mesmo? 

- Estou, por quê? 

- Acabei de dizer que o seu cabelo está esquisito e você não me devolveu uma resposta malcriada?

- Não, pai. 

- Ora, ora, que coisa boa. - Ele sorriu. - Ah, os funerais… Sempre nos levam a refletir sobre o que realmente importa na vida.

Ele não sabia nem ia ficar sabendo sobre o tiroteio, se Kami quisesse. Mas o que tinha me levado a refletir sobre o que realmente importa na vida (o que realmente importa na vida?) tinha mais a ver com o meu próprio funeral, adiado por tempo indeterminado. 

- Deu para se virar sozinho, pai? - perguntei. - Muitas entregas para fazer? 

- O movimento foi fraco. - Soltou um suspiro desanimado e sentou-se outra vez. - Mas não fiquei sozinho na loja.

- Não? - perguntei. - Quem ficou com você? 

- Ue… Eu não comentei com você que a Kushina voltava hoje?

- Não.

- Pois é - confirmou. - Ela voltou. E ficou na loja enquanto fiz entregas, só uns gatos pingados.

Kushina era a funcionária pau para toda obra; anos e anos de dedicação ferrenha à floricultura do meu pai. Quando voltei para Konoha e comecei a ajudar na loja, papai lhe ofereceu uma licença remunerada, para que ela pudesse passar uns tempos cuidando da mãe adoentada.

Mas eu deveria ter desconfiado que ela estava de volta. Papai não havia me ligado nem uma vez para reclamar do atraso da van no dia de maior movimento (em tese) na semana. Kushina tinha um caminhão velho e pequeno, e, na certa, fora com ele que papai distribuiu os gatos pingados.

-- Como ele está? - perguntou de repente. 

- Ele quem? 

- Tio Jiraya. 

- Ah - eu disse. - Muito triste, acho. Ele vai se mudar de lá depois de amanhã, sabia? 

- É? Vai para onde? 

- Ele se aposentou recentemente - repassei as informações - Comprou umas terras em Yumegakure, perto de Kumo, e vai se mudar para lá. Já estava cansado de ir e voltar toda hora.

O Azar É SeuOnde histórias criam vida. Descubra agora