Declarando fatos

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Bianca

Eu não sabia por que estava tão surpresa por ter ficado sem ter notícias de Rafaella por tantos dias. Afinal de contas, eu tinha escolhido sua saída. Fui eu quem disse que queria acabar com o acordo. Eu decidi que queria focar no meu trabalho. E, quando eu a vi aparecer numa capa de revista abraçada com Ivy, senti como se tivesse perdido o chão.

Era total e completamente insano. Eu e Rafaella não éramos e nunca fomos realmente um casal, o casal de verdade naquela história eram elas duas. E elas estavam juntas, felizes, abraçadas, caminhando pela praia feito dois pombinhos apaixonados. A revista contava sobre como o casamento de Rafaella e Ivy tinha tudo para ser o casamento da década. Eles mencionavam meu nome e o nome da minha família, o que pelo menos levantou a minha autoestima.

Eu nem tentei ligar para Rafaella e ela também não me ligou. Agora que eu sabia que ela estava bem com Ivy, as coisas pareciam piores. Eu me sentia completamente inútil, porque ela estava feliz. E sem precisar de mim.

Mas por que dinossauros Rafaella precisaria de mim? Eu não era nada além da organizadora do seu casamento. Só iríamos conversar em situações importantes e necessárias e nada mais seria como antes. A nossa relação amigável e sexual era passado. Eu não podia mais tratá-la como se ela fosse uma amiga. Eu tinha que tratá-la como realmente sou paga para fazer, tratá-la como Rafaella Kalimann, a mulher que estava me pagando milhares de dólares para organizar a noite dos seus sonhos.

Eu parei de pensar nela por alguns dias e só fui me lembrar de que ela também fazia parte do meu trabalho quando o padre da Igreja St. Thomas me ligou, argumentando sobre fazer um casamento gay (felizmente ele era liberal e seguia a lei agora imposta) pedindo para que eu levasse as noivas até lá para que eles pudessem conversar. Então, eu resolvi voltar a me socializar. Liguei para Ivy e a avisei e ao invés de ligar para Rafaella, mandei-lhe uma mensagem.

Eu não pretendia ir para a Igreja, mas devia ser melhor aparecer por lá. Eu podia conversar com o padre sobre o local que ele não queria que fossem decorados e sobre suas preferências. Eu tinha que estar presente naquele momento, assim como em todos. Assim como na hora do casamento, na hora em que Rafaella e Ivy dissessem "sim".

Eu me arrumei e comi alguma besteira antes de sair. Separei algumas coisas na bolsa, peguei as chaves, fechei as janelas, chequei se estava tudo bem e desliguei a televisão. Quando abri a porta para sair de casa, Rafaella me esperava do outro lado com o pulso erguido, uma expressão de ansiedade e pronta para bater na porta.

-Oi. -Eu disse, surpresa.

-Oi. -Ela respondeu, sem fôlego.

-Você está bem? Quer uma água? Parece meio sem fôlego.

-Eu subi de escada, o elevador do seu prédio quebrou então eu subi correndo. -Ela respondeu e eu assenti com a cabeça, abrindo a porta para que ela entrasse.

-Entra. -Disse, em um tom educado.

Era estranho tratar Rafaella com aquela cordialidade ao invés do jeito amigável de sempre. Mas nós duas sabíamos exatamente em que patamar nós estávamos e não tinha como mudar aquilo. Eu não mudaria de ideia de forma alguma, com nada do que ela dissesse, nem mesmo se ela usasse aqueles olhos lindos, ou aquelas mãos macias, ou aqueles lábios suaves ou aquela voz rouca, nada iria me fazer desistir do que eu tinha em mente. Absolutamente nada.

-Você quer água? -Perguntei.

Rafaella assentiu com a cabeça e eu fechei a porta atrás de mim. Corri até a cozinha e coloquei água em um copo. Trouxe de volta até ela na sala e esperei que bebesse. Rafaella me devolveu o copo e ficou me encarando como se quisesse dizer alguma coisa, mas não sabia como. Eu engoli seco trocentas vezes antes de finalmente decidir colocar o copo na cozinha. Respirei fundo pra me preparar e voltei para a sala.

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