A Cerimonialista

Idiota, idiota, idiota

Bianca

Eu me peguei pensando no que o padre Martin havia dito por horas. Com aqueles olhos astutos e sábios, ele devia conhecer mais sobre o mundo e sobre as pessoas do que eu jamais conheceria em toda a minha vida. Até porque ele sabia dos maiores pecados de muita gente, então ele sabia que um rostinho bonito pode guardar pecados inimagináveis. Realmente, enganar um padre era uma tarefa difícil. Ainda mais alguém tão experiente quanto o padre Martin.

Ele havia dito que a pessoa certa para Rafaella estava bem ao lado dela, mas ela não havia descoberto ainda. Depois de passar horas pensando e ir dormir com aquela frase na cabeça, na manhã do dia seguinte tudo já fazia sentido em minha mente. Deve ter sido por isso que eu acordei chorando e com um travesseiro molhado de lágrimas.

A pessoa certa para Rafaella era Ivy, ela estava bem ao lado dela. Ela só não havia percebido ainda e era por isso que o romance delas não estava mais fluindo. Era por isso que elas não tinham mais amor, porque Rafaella havia esquecido o que ela realmente significa em sua vida. Por isso que o padre havia dito que seria melhor se eu não fosse no casamento, porque eu deixaria Rafaella confusa. E saber daquilo, saber que eu realmente teria que me afastar de Rafaella, fez com que eu me sentisse um grande pedaço de merda. (n/a: meu Deus, Bianca.  VOCÊ É BURRA?)

Se eu não tivesse que trabalhar, passaria o dia todo na cama, assistindo filmes de romance antigos e comendo sorvete. Mas eu não tinha tempo para poder descansar. Eu tinha que conversar com algum representante da empresa de decoração e, mais tarde, tinha que ir com Ivy fazer a lista de presentes para os membros da família que não eram tão próximos.

Tomei um banho bem longo, me arrumei e comi metade de um pote de sorvete de chocomenta antes de sair. Anotei mentalmente que precisava comprar mais potes para reprimir meu desejo e me sentir satisfeita. Eu poderia chorar, comer e assistir meus filmes assim que chegasse em casa. Eu iria me enfiar embaixo das cobertas e esquecer o mundo.

Cheguei no horário marcado para a reunião com o representante da empresa de decoração e deixei estipulado o que o padre permitia e não permitia na igreja e trocamos informações sobre a festa. A reunião durou mais tempo do que eu esperava, mas pelo menos já deixamos tudo acertado. A empresa de decoração iria trabalhar em conjunto com a floricultura que Rafaella, Ivy e eu havíamos visitado algumas semanas antes. Ivy queria rosas brancas na igreja e um mix de flores coloridas para a decoração da festa, cedendo ao pedido de Rafaella. Agora tudo estava acertado. Se Ivy quisesse fazer alguma alteração, ela que ligasse para empresa e marcasse uma nova reunião com um representante porque o meu trabalho já estava feito e muito bem feito.

Almocei em um Burger King e liguei para Ivy no caminho da loja em que íamos fazer a lista de presentes. Era mais uma daquelas lojas feitas pra gente rica, que não tinha nada realmente útil. Eles vendiam prataria, aparelho de jantar, alguns aparelhos eletrônicos, mas em sua maior parte, vendiam acessórios de decoração completamente inúteis. Quem precisaria de uma mesinha de café com madeira legal da Albânia que custava 25 mil dólares? Só gente rica.

-Bianca, eu não vou poder ir hoje. -Ivy disse no telefone, se desculpando.

-O que? Por que não? -Perguntei.

-Eu tenho um compromisso inadiável, mas já mandei Rafaella no meu lugar e ela deve estar a caminho da loja. Por favor, não a deixe escolher nada muito extravagante e inútil. -Ela pediu.

-Tá ok. -Eu assenti, começando a suar frio.- Vou fazer o máximo que consigo.

-Obrigada mesmo, Bianca. E me desculpe mais uma vez.

Ela desligou sem nem ouvir o que eu tinha para fazer. Qualquer que fosse seu compromisso parecia ser algo realmente importante. Ivy não largaria os preparativos do casamento daquele jeito se a sua carreira não estivesse em jogo. Respirei fundo e balancei os ombros. Aquilo me rendia uma tarde inteira com Rafaella em uma loja de coisas inúteis. Pelo menos nós não teríamos que selecionar muita coisa, graças a Deus a lista era pequena.