Rafaella Kalimann
2021
O copo térmico descartável na minha mão começava a esfriar, a ardência que antes o calor da bebida causava em meus dedos e na palma da minha mão desaparecia aos poucos, deixando para trás um pequeno rastro vermelho, minhas costas começavam a doer e meus pés continuavam inquietos, como se ainda não houvessem decidido que caminho seguir. Estava à bons minutos parada na entrada do jardim, o lugar só era separado da parte do refeitório pelas grandes vidraças que imitavam paredes e tudo que os unia era uma única passagem.
Manoela continuava da mesma maneira que eu havia a deixado, sentada em um dos bancos de madeira envernizada em frente à um canteiro de rosas brancas e vermelhas, seu olhar nas flores era tão atento que duvidava muito que ela houvesse ao menos se mexido. Os ombros curvados, as mãos apertadas uma contra a outra no colo, o olhar perdido e a cabeça levemente inclinada para baixo, deixavam claro que o dia não estava sendo muito bom para ela.
Bianca havia me contado, enquanto preparava o chocolate quente, sobre o episódio da queimadura enquanto Manu servia café para uma cliente e o quanto isso não parecia ter a afetado nem um pouco. Aparentemente, Manoela só havia percebido o machucado quando Bianca a encarou assustada, nem mesmo parecia sentir dor, ao menos não física, e segundo minha amiga, tinha certeza que as lágrimas dela nada tinham a ver com o pequeno acidente.
Me sentia em frente à um grande ponto de interrogação, mas sabia que a única pessoa capaz de me explicar o que estava acontecendo era a própria Manoela, e dessa vez não a deixaria escapar de me contar algo sobre sua vida. Por isso, rumei confiante de volta para onde havia deixado-a, mas essa confiança foi se esvaindo a cada passo dado e sumido totalmente quando meus olhos bateram novamente em seu corpo pequeno e sua áurea triste.
Minha escolha de leva-la ao jardim havia sido tomada sem nenhum pensamento coerente, quando dei por mim já estávamos aqui, paradas no meio do lugar sem conseguir dizer uma única palavra. A sentei em um dos bancos, e expliquei que buscaria algo para tomarmos enquanto conversávamos, apenas uma desculpa qualquer para dá à nós duas algum tempo a mais para pensar no que dizer, afinal, Manoela parecia tão nervosa quanto eu.
Respirei fundo, soltando o ar pela boca e obrigando meus pés a se aproximarem novamente dela, tentando expulsar a ansiedade e o nervosismo que sentia a cada vez que chegava mais perto. Parei ao lado do banco, mas Manoela continuou inerte, como se não houvesse ninguém ali com ela, o que começava a se tornar estranho, mas deixei o pensamento de lado.
Sentei ao seu lado, encostando o corpo na parte detrás do banco e tentando ao máximo relaxar, sua falta de ação estava começando a me assustar, e meu cérebro começava a correr atrás de ideias para puxa-lá da espiral que havia entrado. Limpei a garganta, forçando uma tosse em seguida, tentando me fazer presente, mas ao notar sua falta de reação, me aproximei mais um pouco de seu corpo, tocado timidamente suas mãos.
Manoela não me olhou quando coloquei o copo de chocolate quente em sua mão esquerda, e muito menos se mexeu quando voltei a entrelaçar nossos dedos, ocupando sua mão direita. Ela continuava encarando as rosas, respirando ruidosamente como se segurasse um possível choro, e só então percebi que seus olhos estavam cheios de lágrimas.
Mesmo preocupada, resolvi esperar até que ela mesma resolvesse me contar o que estava acontecendo, respeitar o que ela sentia era de suma importância para mim e nesse momento a última coisa que importava era o fato dela ter recusado meu convite. Não irei negar o quanto fiquei chateada com sua negação, sendo estupida o suficiente para evita-la durante dois dias, mas agora, vendo-a frágil dessa maneira, tudo o que queria era seu bem-estar e nada mais.
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Second Chance [Ranu]
FanfictionHerdeira de um dos maiores hospitais do país, Rafaella Kalimann tinha a vida perfeita e deixava os pais extremamente orgulhosos. Porém, viu essa realidade se desmanchar ao sofrer um grave acidente onde teve a memória afetada. Agora, tendo que difere...