Capítulo trinta e três.

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Últimas palavras de uma estrela cadente.
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*Aviso de conteúdo sensível, podendo conter gatilhos para pessoas que lidam com transtornos mentais.*

Viver.

Provavelmente de todas as coisas difíceis que me deparei em uma existência vazia, viver era a parte mais difícil de tudo que poderia fazer. Mas isso não era alguma novidade. Qualquer um que me acompanhasse sabia de tudo que ocorrera para que contraísse esse sentimento. Vivi por quase sete anos sem saber o que fazer. Não seria novidade que seriam anos vazios e solitários. Mais do que nunca, ainda tenho a impressão de que vivi ainda mais do que pensei. Após outro conflito que me deixou sequelas evidentes, a missão que tive há um tempo de salvar o mundo foi completada. Com êxito, mesmo que metade da humanidade tenha sofrido consequências. A esse ponto não eram as coisas que pensava, na verdade fazia bastante tempo que não me recordava do pior período da minha vida. O que veio em seguida só agravou essa concepção e continuava em constante mudança.

Tinha uma nova casa. Longe de ser um lar. Mas próximo de onde Irina morava também. Ironicamente, em Marley. Com o auxílio que recebia, graças a minha ausência de sanidade, causada por ter feito parte de eventos tempestuosos; conseguia me manter sem uma profissão específica.

Conheci o cheiro de novas flores mas nada parecia suficiente.

O tom de sépia era o que pintava qualquer cenário que meus olhos enxergavam. Mas com as mãos e a pouca força que me restava, eu pintava coisas que não podia mais enxergar, com a cor que não podia mais enxergar. Tive agora conhecimento também de que telas e tintas à base de óleo eram o que me conectava com sentimentos; os mesmos que não sentia há muitos anos. Me mantive calada por longos períodos. A constante prática me levou até uma exposição de arte. Coisa que nunca imaginei existir. O usual causa estranheza.

Todos esses anos, mesmo tentando evitar. Era como um juramento particular e interno. Não conseguia ver sentido em desenhar coisas diferentes de um só rosto.

Era como espetar o dedo em espinhos de rosas. Pensando em flores, entretanto, mantive em meu jardim vivo para manter as lembranças vivas, assim como meu único sentimento. Um jardim e era a única responsabilidade que tive.  Estavam começando a desabrochar graças à primavera tardia que se aproximava.

O significado do amor eterno ainda estava enraizado, talvez junto dessas tantas flores. Talvez próximo ao que eu chamava de coração.

Era um grande dia. A primavera em seu início me dizia que o ano estava próximo do fim. E também dizia que o dia da exposição de artes estava próximo. Exposição essa que só estarei fazendo parte devido a insistência de Irina que, em suas vindas semanais à minha casa, fazia questão de enaltecer os quadros de diversos tamanhos e significados diferentes mas, com o mesmo rosto estampado em todos.

O que havia ao meu redor em um quarto sempre vazio eram panos, quadros espalhados, cavaletes de diversos tamanhos, alguns com quadros sem conclusão; pincéis, tintas, tudo se mantinha em um canto específico. Sem nenhuma organização, obviamente. Manchas nas paredes e chão poderia ser ainda melhor do que chamavam de arte. A minha arte. Se é que poderia chamá-la de minha. Não sentia propriedade nem em mim mesma. "Eu sou sua. Qualquer um que olhe tem noção disso."
- Tia Raven! - Vozes de crianças podiam ser ouvidas, de longe, o que me tirou de meus pensamentos ominosos. Andei até a entrada da casa, apenas para ser chamada de novo. - Tia Raven, você não vai abrir a porta pra mim? Eu trouxe uma comidinha gostosa pra você!

Sinfonia de batalha - Hange Zoë x OCOnde histórias criam vida. Descubra agora