Fios de Prata

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"Eu costumava dizer que seus cabelos eram fios prateados do destino, por isso nos encontramos"

[Friendship | Soulmate | Sparda e Arya | Dante e Diva]

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Sparda estendeu a mão, inicialmente planejava oferecer consolo, mas antes que se desse conta, afundou os dedos nos sedosos cabelos da mulher. Ela não possuía a longa e orgulhosa cascata que fluía graciosamente pelas suas costas, em seu lugar havia uma massa tímida de castanho, cortado sem manejo, com pressa e descuidadamente.

Arya estremeceu, pôde sentir a tensão irradiando para onde sua mão tocava. Manteve-se firme, afagando as curtas madeixas com o afeto e respeito que compartilhavam. Ele sabia intrinsecamente o simbolismo daquilo e tudo que representava para Arya, ninguém entenderia a dor que carregava; a perda, a traição, o desafeto, a promessa quebrada. Nada do que fizesse apagaria as lembranças ruins e os sentimentos que desmoronaram.

Arya virou, pegando a mão do demônio e entrelaçando seus dedos. Apesar de ligeiramente surpreso por tal atitude e a carência que via, não a afastou. Esperou ver um sorriso ainda que fragilizado, um capaz de iluminar a noite mais sombria e que pertencia só a ele, porém tudo que recebeu foi um olhar triste com lágrimas transbordando, querendo liberdade. Sparda pensou em recolher a mão, mas simplesmente permaneceu imóvel, assistindo Arya se mover lentamente, esticando a mão livre para imitá-lo, mexendo em seu cabelo. Ela verificou o tamanho e lançou um breve, fino e enigmático sorriso.

– Seu cabelo está longo. Quer que eu corte?

Não era novidade esse ritual, sempre que os fios prateados alcançavam um determinado tamanho, Arya voluntariamente os cortava. Isso era um papel que cabia a ela, desde a primeira vez quando optou deixá-los curtos. Em épocas passadas, muito antes de viver como nômade entre os humanos, tinha os cabelos de um tom prateado incomum longos.

– O que acha de cortá-los?

– Hm? – arqueou uma das sobrancelhas diante da proposta, passou os dedos pelos cabelos por puro reflexo. – Não gosta?

– Claro que gosto, são os fios prateados do destino – levou a longa mecha próxima ao nariz, aspirando o perfume. Sparda tinha um cheiro de flores e álcool, nada exageradamente forte, mas bastante agradável.

– As vezes precisamos mudar. Além disso, vai ficar mais apropriado para um homem da sua idade... Quantos anos mundanos você tem mesmo? Trinta e cinco?

– Trinta e nove. – corrigiu, sorrindo com a expressão estupefata da mulher.

– Isso explica sua atitude paternal. – sussurrou, a testa franzida. Não culpava ela por pensar que agia assim por instinto paterno já que a diferença de idade era gritante. – E então, Sparda, o que acha?

– Tudo bem, faça o que achar melhor. Eu conto com você, Arya. Como sempre.

Com um sinal positivo, deslocou-se para uma cadeira e Arya tomou seu lugar com a tesoura na mão. Silenciosamente, mecha por mecha foi ao chão, espalhando fios brilhantes com a cor da lua pelo chão. Subitamente, Arya debruçou-se sobre o demônio, abandonando a tesoura, e o abraçou forte, chorando tudo que estava guardado. Em algum momento sentiu que aconteceria, ela havia bloqueado o sofrimento por tanto tempo que uma hora a armadura racharia, permitindo que as lágrimas viessem.

– Eu gosto de sentir a textura do seu cabelo – confessou com a voz embargada, entre soluços. – São como... A única coisa que sobrou do passado. Você lembra...? Eu costumava dizer que seus cabelos eram fios prateados do destino, por isso nos encontramos.

O demônio não ousou quebrar a confissão, queria ouvi-la e, principalmente, desejava que o peso que ela trazia se minimizassem.

– Não deve fazer sentido, não é? – limpou as lágrimas. – Eu só tenho você. Estou sozinha.

– Talvez tenha razão. – Arya puxou o ar com a resposta. – Estamos unidos por esse elo inquebrável. Mas garanto que não está sozinha.

Guiando-a para seus braços, Sparda a envolveu em um abraço firme e protetor. Sentindo-se em um mundo, frágil, fragmentado, mas, ainda assim, seguro, Arya encolheu-se, as mãos agarradas as roupas de tecido aparentemente resistente.

– Seus fios de prata nos manterão ligados para sempre, Sparda.

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– Para sempre – Diva repetiu essas palavras com uma estranha e inexplicável sensação de déjá vu. Ergueu a mão, e embora não pudesse vê-los como aconteceu no Inferno, sabia que em seu dedo existia o cordão de prata – o fio prateado do destino. Olhou para Dante com um sorriso encantado, inevitavelmente fascinada com a constatação de sua alma gêmea.

– Ligados para sempre.

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