Capítulo 28

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{POV. Anna Elis}

  Minha boca estava seca, eu estava tão assustada que não sabia ao certo o que fazer.

- Você... você está machucada? - Minha voz falhou.
- Não, esse sangue... - Ela ficou em silêncio por um segundo. - Esse sangue não é meu. Eu estava trabalhando.
- Imaginei. - A palavra pulou da minha boca.
- Anna Elis... - Anna Kariênina se aproximou mas eu dei um passo para trás.
- Não! - Seus olhos que antes eram negros, agora estavam com brilho fraco de súplica sobre o verde. - Você... Você precisa de um banho antes. - Indiquei. - Vou preparar um chá, não deve ter comido nada.

  Eu não consegui olhar em seus olhos, mas podia sentir o olhar de confusão sobre mim, até que ela suspirou e disse.

- Te vejo no quarto. - Então subiu as escadas.

  Suspirei alto soltando o ar que não sabia que havia prendido, e tive que me apoiar por um instante na parede para tentar me situar.
  Andei até a cozinha e usei a água da pia para lavar meu rosto, eu estava tremendo muito e a imagem de Anna Kariênina suja do sangue de alguém não saía de minha cabeça.
  Anna Kariênina não era assim, não! Eu sabia que ela não era má!
  Apenas seu trabalho que era horrível, eu tinha que tentar separar ela de seu trabalho. Anna Kariênina era boa, era uma das melhores pessoas que já conheci. Ela tem que ser, não posso está enganada.
  Suspirei, e mesmo com as mãos trêmulas, comecei a colocar água em uma das chaleiras para fazer o chá.
[...]

  Meu coração havia retornado um pouco ao ritmo normal, mas minhas mãos ainda estavam trêmulas, tanto que balançavam a bandeja em minhas mãos. Abri a porta do meu quarto e tentei ter a expressão mais normal que conseguia enquanto encontrava Anna Kariênina sentada em minha cama, encostada na parede.
  Coloquei a bandeja sobre meu criado mudo ao lado e entreguei uma xícara a ela, peguei uma para mim e me sentei a sua frente. Minha mão tremeu enquanto eu levava a xícara até meus lábios, tentando fazer com que o hortelã me tranquilizasse.

- Você está muito trêmula. - Anna Kariênina percebeu, sua voz soou preocupada, e eu engoli seco abaixando a xícara.
- Mesmo sendo filha de um mafioso... - Comecei. - eu nunca vi ninguém matar ninguém ou aparecer cheia de sangue. Fiquei um pouco assustada. - Contei e Anna colocou sua xícara sobre a bandeja e fez o mesmo com a minha.
- Desculpe, eu não queria te assustar. Juro! - Seus olhos eram suplicantes e eu engoli seco.
- Tudo bem, eu só achava que você ia parar de... trabalhar agora que é casada com meu pai, e ele é super milionário. - Sorri triste.
- Esse não era um trabalho qualquer, fazia parte da minha vingança contra Dorgles. - Ela explicou.
- Seu plano de vida. - Completei e ela assentiu. - Só toma cuidado por favor. - Sem perceber, meus olhos estavam marejados. - Promete? - Anna Kariênina uniu nossas testas.
- Prometo. - Sua voz calma, me tranquilou.

  Anna Kariênina então me puxou e eu lhe abracei, me aninhando a seu colo.

- Você não é o que você faz, Anna Kariênina. - Sussurrei e Anna me abraçou mais forte.
- Obrigada. - Senti emoção em sua voz.

  Eu tinha que aprender a separar Anna Kariênina de seu passado, ela não era uma pessoa má. Eu sabia disso, ela jamais me machucaria.
[...]

{POV. Anna Kariênina}

  Way Down We Go - Kaleo tocava em meus fones de ouvido, enquanto eu observava em silêncio cada punhado de terra sendo jogado dentro da cova onde havia aquele caixão. Eu havia colocado os fones por não aguentar mais comentários e olhares de pena como: "Ele está em um bom lugar agora", "Foi uma tragédia", "Espero que você fique bem, os Borges cuidaram de você", "Harry Vegas era um grande homem", "Você é uma menina muito forte".
  Dane-se se eu tinha que parecer forte, eu só quero meu pai de volta e pronto, eu só tenho 14 anos e há 4 anos que eu não sei o que é dormir ao lado do meu pai. E nunca mais saberei, pois ele está nesse momento na porra de um caixão dentro de um buraco com alguém jogando terra em cima dele. Eu queria gritar, correr, me jogar de uma ponte, me rasgar, o que fosse desde que essa dor saísse do meu peito.
  Entretanto, por mais dolorosa e revoltada que eu estivesse, eu só conseguia sentir as lágrimas saírem, enquanto eu ficava parada em frente ao túmulo igual uma estátua. Um choro sem som, apenas o desespero de alguém que está desistindo, um choro de dor de alguém que não aguenta mais gritar.
  Todos já haviam saído do cemitério e ali estava em, ainda em frente ao túmulo ainda com a terra recém colocada. Com cada peso do meu corpo estremecendo, me ajoelhei em frente ao túmulo, lá estava a foto dele e seu nome. Era tão doloroso que eu não conseguia olhar mais para o que dizia a frase em sua lapidi.

- Pai...

  O choro saiu engasgado enquanto eu mordia meu lábio inferior com tanta força que podia sentir o gosto metálico do sangue.

  - Eu vou honrar a sua morte, nem que seja a última coisa que faço em toda a minha vida.

  Senti meu coração se despedaçar e um vento frio soprou balançando alguns fios soltos de minha trança de raiz, fechei meus olhos e mais lágrimas desceram.

- Pai...

  Minha voz saiu em uma súplica, uma súplica para que tudo tenha sido apenas um grande pesadelo.
  Suplicando que meu pai ainda estivesse vivo.

******

{POV. Anna Elis}

  Meu sono estava um pouco leve depois de tudo que houve, então me despertei um pouco assustada ao ouvir resmungos e sussurros ao meu lado, arregalei os olhos acordando e fiquei mais horrorizada quando percebi que se tratava de Anna Kariênina praticamente se contorcendo agarrando-se aos lençóis da cama.

- Pai... - Ela chorou um pouco mais alto e eu me desesperei. - Volta pai. - Ela chorou como alguém que estivesse sendo perseguida por demônios no pesadelo. Eu tinha que fazer algo.
- Anna, acorde. - Tentei lhe chacoalhar. - Anna, isso é um pesadelo. Acorde! - Disse quase entrando desespero.

Meu Deus, ela não está acordando!

Continua...

Corpos em Chamas: A vingança de Anna Kariênina (Romance Lésbico)Onde histórias criam vida. Descubra agora