Capítulo XLI - 1985

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Tirar Umas Férias
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Não era raro chegar ao estúdio e se deparar com Dio sobre a mesa de mixagem, concentrado demais no que estivesse fazendo a ponto de esquecer do próprio cigarro entre os dedos até as cinzas desabarem inteiras sobre os botões e de ouvi-lo soltar um xingamento por ter de limpar a bagunça.

Desta vez, estavam em Munique, prestes a iniciar o novo álbum.

Contudo, se tornou raro ter um momento a sós com o ômega sem ter o agente Enrico Pucci como um papagaio de pirata por perto, sempre interrompendo com a sua inconveniência irritante, impedindo-lhes de ficar mais à vontade, tornando-se mais um motivo às discussões entre o casal.

Mas se perguntado, Jonathan não diria que estava cansado apenas disso.

Há 10 anos, ele não sabia mais o que era sossego; o que era andar sozinho pela rua; o que era ser um completo desconhecido. Há 10 anos, perdera a liberdade em prol da realização do sonho de Dio, tendo poucas compensações. Há 10 anos, The Phantom Blood era um fenômeno mundial. E ninguém mais tinha controle sobre isso.

Jonathan sentiu insegurança no começo, depois uma sensação de alegria e, por fim, um sentimento que era ao mesmo tempo esquisito, apavorante e arrebatador. E uma sutil troca de olhares com Dio se tornara suficiente para retomar a confiança e acreditar que tudo daria certo... Tinha que admitir que funcionara melhor do que ele e Erina, Speedy, e talvez o próprio Dio, tinham sonhado que seria possível, a princípio.

O álbum de estreia fora lançado somente em '77, intitulado como "The Phantom Blood", dando início à primeira turnê pela Europa como um plano maligno de dominação mundial. Em '81, foi a vez do quarto álbum, "Battle Tendency", arrebatar a indústria fonográfica e consolidar a banda em meio às demais, trazendo mais uma faceta artística impressionante e os levando aos EUA para inúmeras apresentações exaustivas em inumeráveis cidades diferentes.

Jonathan ainda se lembrava de como se sentiu completamente desorientado, à beira de uma crise de pânico, ao acordar no meio da noite sem saber que dia era, para onde estava indo e o que viera fazer no meio daquele enorme país desconhecido.

O que serviu de consolo foi saber que não fora o único a se sentir assim. Dio também era um poço de pavor e ansiedade, por isso, ambos se apoiaram um no outro nesses momentos difíceis. Mas a ferida ao ver o endiabrado parceiro desperto agir como se nem ao menos o conhecesse depois que a turbulência passava arrebentava a cada vez mais, tornando exaustiva a rotina que se seguia, consequentemente; abstrair-se, relevar-se, respirar fundo e tentar mais uma vez.

Agora, sentado ao lado do ômega de visual extravagante, Jonathan esperava que, após a última turnê conturbada, pudesse ouvir a palavra "férias" saindo daquela boca pintada de verde.

Senão isso, então que fosse uma razão plausível para Dio não ter posto a sua primeira composição nos álbuns anteriores que ainda carecia de explicações.

Afinal, há 10 anos, a melodia que embalou os corredores do dormitório alfa os uniu e, embora a banda trabalhasse na música desde quando conseguiram o contrato com a gravadora por intermédio de Pucci, até o momento, fora impedida de viajar pelas ondas de rádio e de desbravar o mundo.

— Fico me perguntando quando você finalmente se sentirá satisfeito pra lançá-la – Jonathan quebrou o silêncio, embora não duvidasse que tivesse sido notado. Tamborilou os dedos nos braços da cadeira, ansioso, assistindo Dio se apoiar pelos cotovelos sobre a mesa de mixagem e apagando o cigarro num cinzeiro ao lado.

Âmbar No Azul-Celeste [✓]Onde histórias criam vida. Descubra agora