Eu costumava gostar de bibliotecas.
Eram lugares de conhecimento, compartilhamento e revelação de aventuras tão inacreditáveis quanto críveis. Eram lugares de histórias e estórias. Eram lugares de mentiras e fatos. Eram lugares que eu venerava.
Agora já não gosto mais tanto delas.
Porque agora, toda vez que penso nas estantes, me lembro de você batendo minha cabeça contra elas.
Eventualmente, eu te perdoei. Mas as estantes guardam rancor.
Milênio 12
– O que estamos procurando, exatamente? – Indagou Klairer, seus dedos deslizando pela lombada dos livros nas estantes, organizados alfabeticamente.
– Alguma coisa que diga mais precisamente onde os cristais estão. – Kye respondeu, o olhar concentrado nas páginas de um livro que julgara suspeito.
– Você não sabe onde eles estão?
– Sei. – Retrucou defensivamente. – Mas com uma... Margem de erro. – Klairer cruzou os braços, um sorrisinho repreensivo no rosto.
– De quanto?
– Alguns anos-luz... – Deu de ombros, vago. A garota revirou os olhos.
– E pensar que eu até cheguei a achar que você realmente sabia para onde estava indo. – Destilou sarcasmo. O rapaz riu.
– Sou confiante, não um mapa. – Sorriu provocador.
– Mas achei que você tivesse um mapa na mão. – Klairer agora estava confusa.
– Eu tenho. – Respondeu. – Mas ele só mostra os lugares por onde passei, a partir de onde nasci. É uma representação minha no espaço, o reflexo da minha extensão pelo universo. – Explicou Kye. – Mas não revela caminhos para lugares desconhecidos. E esse é mais um empecilho que eu quero transpor com os cristais.
– Então se seu mapa não mostra nenhum caminho para o progresso, o que você tanto olha nele? – Klairer não conteve sua curiosidade, sem julgamento em seu tom. Kye hesitou por um momento. Com um suspiro, porém, ele se deixou responder:
– Memórias... – Deu de ombros, o olhar baixo, como se aquilo não fosse relevante, mas o tocasse mesmo assim. – É minha forma de lembrar do passado... – Para a surpresa de Klairer, aquilo fazia muito sentido. Kye tinha uma conexão com o espaço assim como ela tinha com o tempo; e só através do espaço ele conseguia entender a si mesmo. – Fico procurando alguma coisa no passado que ajude no futuro. E eu meio que sei para onde estamos indo. – Restaurou seu sorriso. – Só precisamos de... Informações mais precisas.
Klairer confirmou com a cabeça e se voltou para os livros nas imensas estantes da biblioteca. Enquanto ela mal sabia por onde começar, Kye já estava desaparecendo pelo labirinto de corredores, gritando para ela antes de sumir completamente:
– E se você estiver pensando em se perder, mude de ideia, porque eu estou descarregado em nebulosa no momento. – Justificou e desapareceu, deixando Klairer sozinha com os livros.
As estantes, abarrotadas, estendiam-se para o céu e horizonte como se fossem infinitas. Eram tantas obras que, por um momento, Klairer achou existir um livro para cada estrela nas galáxias; um livro espesso e extenso que parecia contar tudo sobre cada estrela boiando pelo universo, desde seu primeiro raio de luz até seu último, pontuando todo e cada ser e civilização que surgira na superfície dos planetas em sua órbita.
Eles nunca iam encontrar nada.
Tomada por frustração e desesperança, Klairer pegou da estante o primeiro livro aleatório que viu à sua frente. Chamava-se "A Festa dos Frutos", e na capa existia a imagem de uma frondosa árvore com cristais no lugar das folhas e frutas rubis espalhadas. As sobrancelhas de Klairer se ergueram. Aquilo parecia promissor. Tão promissor como se tivesse sido colocado em seu caminho pelo próprio destino. A garota até o teria agradecido por tê-la poupado o tempo de procura, se seu orgulho não tivesse sido ofendido.
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Estrela Caída| Versão Em Português
Science FictionEm um universo predeterminado, ela tinha escolhas; e, em uma galáxia de prisões e caminhos perigosos, ele conseguiu criar seu próprio caminho. Quando Klairer e Kye se conheceram nos confins de uma prisão branca e imaculada, na hora e no lugar perfei...