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O famigerado cheiro adocicado de chocolate, recendeu diretamente nas narinas de Meredith quando ela levou a borda da xícara azul a boca.

Antes de evidentemente beber, deu uma leve inspirada naquele aroma inebriante, sentindo o vapor quente imergir em si e aquecer-lhe as entranhas. Depois sorveu longamente a bebida, movendo a língua na boca para melhor proveito do sabor. Estava uma delícia, doce e quentinho, à maneira que aquela noite fria requeria. Addison também havia feito uma graça ao colocar pequenos marshmallows e salpicar um pouco de canela em pó, que derretiam-se gradativamente na bebida quente.

Sentadas no estreito sofá que existia na varanda externa da casa de Addison, as duas deliciavam-se com suas bebidas, num silêncio que não era tão pleno, pois os três felinos, encolhidos numa poltrona do canto, miavam e ronronavam vez ou outra. No entanto, era aprazível, e, pela primeira vez em muito tempo, Meredith se sentiu extremamente confortável.

— Gostou? — Meredith ouviu a voz arrastada de Addison ressoar bem ao seu lado.

No momento em que a loira virou-se para olhá-la, foi quando a mulher levou aos lábios sua xícara branca, fechando os olhos ludibriadamente quando a boca encheu-se do agradável chá de erva-doce. Meredith suspirou ao perceber que qualquer mera ação tornava-se tão cativante quando executada por Montgomery. A garota ainda se lembrava bem de como a mulher conseguia comer um morango da forma mais sensual dos séculos. Irreal.

— Adorei! — respondeu, numa animação que talvez soara exagerada demais, olhando para a forma como a boca de Addison ficara vermelha e molhada depois da golada em seu chá.

A ruiva assentiu, num sorrir com o canto dos lábios.

Meredith encheu a boca com boa quantidade de seu chocolate quente, apenas para ter uma trégua antes de sua próxima bola fora. Ainda não aceitava bem o fato de como agia feito idiota perto daquela mulher.

Depois de terminarem praticamente juntas, repousaram a xícara na mesinha de madeira posicionada ao centro da varanda e Addison passou a olhar fixamente para Meredith.

— Vai me contar agora o que aconteceu? — Meredith suspirou desanimada, sabia que em algum momento Addison perguntaria aquilo, só não sabia se estava preparada para dizer. — Eu sinto que você esconde muita coisa, e dá pra ver nos seus olhos que dói...

Com o olhar fixo no chão de taco, a garota permaneceu por longos segundos, apenas ponderando sua condição, buscando compreender se chegara a tão temida hora de se abrir com alguém.

— Ei... — Addison colocou uma mecha do cabelo loiro para trás, abrindo uma brecha para conseguir ver a lateral do rosto de Grey. — Você não precisa guardar tudo pra si mesma, vai continuar te afetando cada vez mais. Converse comigo.

— Eu só... — Repousou as pálpebras devagar, enquanto os dedos de Addison esquentavam seu rosto.  — Eu não consigo... — lamuriou, entrelaçando fortemente seus dedos um no outro.

— Apenas tente, querida.

A verdade é que não tinha aquele costume. O de falar. Estava fortemente habituada a esconder tudo para si mesma, guardar toda sua dor num cantinho reservado em seu âmago. E então, quando algo de ruim lhe acontecia, quando era machucada, uma mágoa a mais era acrescentada ali. No entanto, o espaço era limitado, e tantas tristezas depois, tornava-se cada vez mais difícil guardar algo ali. E às vezes transbordava, em forma de lágrimas nos olhos, impaciência nos poros do corpo. Tudo porque não suportava mais absorver.

Tantas angústias já sufocavam seu peito, e ofuscavam a esperança de um dia ser capaz de se livrar delas. A vida não lhe era fácil, e ter que lidar sozinha, com estritamente tudo, dificultava a eficiência. Não tinha carinho, tampouco o apoio de sua própria mãe, seu pai abandonara a família há menos de dois anos e seu irmão? Seu irmão era quem a fazia lembrar todos os dias de como sua vida era um inferno.

Impermanência𓂃 ִֶָOnde histórias criam vida. Descubra agora