#07

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pov's Nicole:

Quando estou saindo de casa, pronta para ir diretamente para o aeroporto, vejo Sara descendo a escadaria. Trocamos algumas poucas palavras, mas já foram o suficiente para puxarem a casquinha da ferida, aquela casquinha que demorou anos se formando no coração ferido.

— Para aonde vamos senhora? - O motorista pergunta.

Saio do meu transe, desvio o olhar da rua do condomínio e percebo que estou já a alguns minutos ali sentada, sem dizer para aonde ele deve me levar.

— Aeroporto - Anúncio.

O carro entra em movimento e eu volto meus olhos para a estrada e recordo o que mais me machucou na vida.

Sete anos atrás:

Entro em casa e percebo que o carro não está na garagem, sinto meu estômago dar algo como uma cambalhota e tudo o que comi volta para a boca, acabo vômito ali mesmo, em frente ao portão.

— Sara? - Chamo a minha mulher.

Ela não responde, suponho que minha teoria está certa, ela saiu de casa.

Caminho para dentro de casa e vou para os fundos, procuro por um pano de chão e encho um balde com água. Volto para a frente da casa, limpo toda a sujeira e quando estou torcendo o pano reparo em algo pendurado no portão, me levanto e pego o molho de chaves pendurado.

— Sara saiu de carro, parecia com pressa, aconteceu alguma coisa? - Sofia, uma vizinha já de idade com a qual eu costumo conversar aparece no portão de casa.

— Ah... É só umas discussão, coisas de casal, deve ter saído em um momento de raiva - Lhe falo.

Não seria uma surpresa, Sara sempre saia de casa quando estava estressada, passava uns 30 minutos ela voltava, normalmente com alguma coisa de comer e um pedido de desculpas.

Nossas brigas eram raras, mas de três meses para cá, desde que começamos o tratamento e ela teve que começar a tomar os hormônios seus nervos estavam a flor da pele.

— Sei bem como é isso! - A senhora fala e abre um sorriso.

Guardo as chaves no bolso e termino de limpar o chão, então me levanto e abro o portão.

— Entre, vamos tomar um chá - A convido com um sorriso.

A senhora entra sem pestanejar, volto a fechar o portão e caminhamos juntas até a cozinha.

— O que ocasionou a discussão? - Questiona a senhora se sentando.

Dona Sofia era uma idosa sabia, seus conselhos eram valiosos e sempre me ajudavam com Sara.

— Não sei exatamente como, mas foi depois de mais um negativo... Eu não quero mais me submeter a clínicas de fertilização - Lhe confesso — Sara quer tomar meu lugar, o sonho dela é ter-mos um bebê biológico, só que ela não pode gestar e acho que a junção dos hormônios que toma toda vez que queremos tentar novamente...

— O sonho sempre se conflitando com a realidade, isso é triste - A mulher comenta enchendo a xícara que lhe ofereci com café — Ela está descepcionada, a vida é assim, não tem como mudar. Ela está em negação, procurando em quem por a culpa - A senhora me fala.

Respiro fundo e forço um sorriso, abro o armário e pego uma lata de bolachas das que Sara costuma fazer.

— Bolachas - Coloco sobre a mesa.

— Vou aceitar, porque se Sara tem um dom, com certeza é assar bolachas - A senhora fala pondo a mão dentro do pote.

Abro um sorriso orgulhosa, quando se ama alguém ouvir elogios por mais simples que sejam, direcionados a essa pessoa aninha o coração.

O PASSADO SEMPRE VOLTAOnde histórias criam vida. Descubra agora