🎙Capítulo 3🎙

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Ethel

Eu nunca soube o que deu errado para a Atomics acabar numa festa de gala da filha do meu tio em Setembro de 1972, mas agradeceria à Deus por isso se fosse uma pessoa religiosa, o que nunca foi o caso.

Greene King havia estreado em Hollywood nos anos 60, não era o que se poderia chamar de "uma verdadeira estrela do cinema" mas ele com certeza tinha grana, tinha grana o bastante para fechar a porra do Golden Gate para o aniversário da filha. Greene era o irmão mais velho do meu pai, o que não fazia deles muito mais próximos do que Caim e Abel ou Snow e eu.

Os dois se odiavam, o que, se prestarem atenção, é bem comum na minha família.

A festa tinha uma proposta anos 50, e antes que eu pudesse evitar acabei como a porra da reencarnação da Marilyn Monroe enquanto Snow se exibia por aí como uma versão menos carismática da Jane Russel. Eu estava usando o mesmo modelo laranja que Marilyn usou em "Os Homens Preferem As Loiras", os sapatos estavam enfeitando os meus pés com bolhas e os brincos pesavam nas minhas orelhas, e eu odiava tanto aquilo. Eu me sentia mal por aquelas pessoas, todas aquelas pessoas que se sentiam na obrigação de parabenizar os meus pais pelo simples fato de terem feito uma filha para quem valia à pena olhar, me sentia mal por não poder dizer que aquela era só uma parte da Ethel King, que eu tinha um cérebro funcionando e que também queria receber tapinhas nas costas por ter sido aprovada em duas universidades por conta própria e sem precisar de um tostão dos meus pais, e não só por ter um par de peitos.

Eu me lembro de uns anos depois, de quando publicaram aquela matéria sobre os meus comprimidos, e me lembro de rir quando li o trecho que dizia que os meus neurônios estavam queimados pela quantidade de drogas que eu mandava para dentro, ri porque era parte verdade, e ri porque estava com o Ira e não queria que ele me visse chorando.

Eu nunca deixei ninguém me ver chorando...pelo menos não enquanto estava sóbria.

Mas vamos voltar para a festa.

Eu estava sentada entre a minha mãe e Snow, bebi uns golinhos de Champagne e umas taças de vinho enquanto fingia estar ignorando o fato de que tinham pelo menos cem pares de olhos no decote do meu vestido. Eu estava sorrindo muito naquele dia, sorrindo como se não soubesse que por baixo da maquiagem impecável da minha mãe se escondia um hematoma no olho esquerdo, fingindo que os nós dos dedos do meu pai não estavam machucados e fingindo que Charlie, namorado da minha irmã, não estava tocando umazinha pra ela por baixo da toalha de mesa. Eu fingia muita coisa naquela época.

Summer Hope King, a aniversariante, estava fazendo 18 anos, e sendo só alguns meses mais nova do que eu, era de se esperar que nós duas tivéssemos algum tipo de relação. Mas não era o caso. Por isso percebi a carranca dela enquanto eu dançava, mesmo com o vestido longo consegui um espaço para me mexer de verdade, agitando os braços e os quadris, brincando com os movimentos e com as ondas do meu cabelo. Eu não vou negar que tirava proveito de mim mesma para conseguir a única coisa que os milhões de dólares de Robert King não poderiam comprar...amor. Ou a ideia que uma garota de 19 anos que nunca foi amada fazia dessa palavra. Eu não era melhor dançando do que com um microfone na mão, mas aquilo não importava de verdade desde que eu continuasse servindo de atração para festa.

A Atomics foi anunciada depois de uma outra banda em ascensão da época.

Eu não deveria reconhecer aqueles cinco rostos, mas reconheci, e estava consciente demais disso para conseguir desviar os olhos deles.

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