Ethel
Ira tinha o costume de fazer analogias entre a praia e eu, ou entre as tempestades de San Diego e o cinza azulado dos meus olhos. Posso fazer analogias entre ele e a música. Ira era um solo de guitarra, uma batida alucinada de bateria, Ira era grave, vibrato, tenor, ritmo e harmonia.
Ira Blame era a música. Ira Blame era um músico com "M" maiúsculo.
Naquela noite, quando fomos os únicos idiotas dançando juntinhos no meio do caos, não estava apaixonada por ele. Eu me sentia atraída por ele, é óbvio, mas nunca quis bancar a groupie. Eu queria mais do que o título de mulher de alguém, eu queria ser a estrela.
A música tinha terminado e os aplausos dos convidados cercavam a gente, a luz era uma droga mais eu ainda podia ver o rosto dele enquanto sorria para mim. Agradeci baixinho por não ter tomado nada que pudesse me fazer esquecer daquele momento, de como os olhos dele se estreitavam quando ele sorria e das covinhas nas bochechas.
- Ethel! - Era Snow, ela e Charlie estavam acenando pra mim do outro lado do salão.
Estava na hora de ir pra casa.
Ira também estava olhando para ela, e voltou a me encarar com um sorriso meio triste.
- É a minha irmã - Expliquei. Eu não disse "eu tenho que ir" ou "foi bom ver você", não queria ir embora quando estava me divertindo de verdade como nunca tinha feito na vida.
Acabei descobrindo uns anos depois que Ira só fez o que fez em seguida porque Vick tinha botado pilha sobre eu me casar com outro cara se ele não tomasse algum tipo de atitude, mas não ligo se ele agiu por medo, pelo menos fez alguma coisa.
- Escuta - Ele disse parecendo meio perdido. A mão que estava na minha cintura me apertou um pouquinho mais - Pode ir embora e esquecer a gente, ou pode vir com a gente e esquecer que um dia quis ir embora.
Ele tinha um ponto. Mas o que eu ia fazer com cinco pessoas que eu mal conhecia? Eu era maluca e rebelde, mas não era pra tanto... ou era?
- E pra onde a gente iria?
- Conquistar o mundo, linda.
Pensei um pouco sobre aquilo. Eu podia voltar para a minha casa onde eu teria toda a grana do mundo, onde o meu pai arrebentaria a minha mãe e onde eu teria que fingir não saber que aquela não era uma vida de verdade. Teria as minhas roupas lavadas e passadas, a minha comida sempre pronta e os comprimidos, a erva e o pó sempre à minha disposição. Nunca ia ter que lutar por nada, e na idade certa eu fingiria ser independente e ia acabar me mudando para Nova York com o dinheiro da pensão dos meus pais. E mesmo não fazendo nada para mudar isso até aquela noite, eu não queria aquela vida.
Eu tinha assistido ao show deles, sabia que eram bons e que uma banda com um potencial daqueles não se achava dando sopa por aí. Logo eles conseguiriam um contrato com uma gravadora e eu não queria me tornar a velhota que conta por aí que conheceu alguém famoso quando ele ainda era um "Zé Ninguém". Eu queria fazer parte daquilo, queria fazer história.
- Segura essa merda - Eu disse, arranquei os sapatos e entreguei para ele antes de pegar a sua mão livre e correr feito doida na direção do canto escuro em que os outros quatro rostos levemente familiares olhavam para a gente.
Eu já tinha 19 anos, mas aquele foi o momento do meu nascimento.
...
Ira
"Out of the window
The wind kisses you, love
Your smile is the shadow
From the stars above".("Fora da janela
O vento te beija, amor
Seu sorriso é a sombra
Das estrelas acima").
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The Ethereals
FanficNa Las Vegas dos anos 70, a jovem Ethel King encanta corações impuros com a sua voz espetacular, um desses corações pertence à Ira Blame, rapaz bonito de San Diego que desfruta de uma viagem breve na companhia dos amigos. Mal sabem eles que após doi...