Mudança.

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Mudar de cidade nunca é fácil. Ainda mais para Teresa Mansfield que nasceu sem visão. Segundo a história que contavam a ela, havia nascido com um tipo raríssimo de sangue, RH Nulo ou "Sangue Dourado". Isso não só a fazia levemente anêmica comparado aos outros, como gerou uma falha em sua córnea e perdeu o restante da pouca visão que possuía com apenas alguns meses de vida. Apesar disso, sua mãe, que também era portadora, dava todos os cuidados para que assim se adaptasse e vivesse da melhor forma possível. Teresa nunca se abalou por isso e tentou viver a vida da maneira mais normal que podia. Mas sua vida não havia sido nem de longe fácil.

Leva tempo até se acostumar com um lugar, com pessoas, com a confiança e conhecimento do seguro e do perigoso. Teresa é uma garota que acabara de completar dezoito anos, estudiosa, amorosa, tímida e insegura. Filha de Anthony Mansfield, um general do exército que apesar da atitude seria a maior parte do tempo, é bem amável com aqueles que o cativam. Casado com Abgail Williams, uma ex professora afastada devido a ter desenvolvido câncer. Além de Teresa eles tiveram mais uma pequena filha, Megan, uma adorável garotinha de quatro anos que vivia aos cuidados da mãe e de Teresa.

Eles viviam em uma pequena cidade do interior do país onde ficaram quase todos os anos de sua vida. Quando foi descoberto o câncer, tentaram tratamento por lá, mas como a cidade era pouco desenvolvida, carecia de um sistema que cuidasse de algo tão sério. Em busca de condições melhores eles se mudaram para uma cidade maior e mais avançada. Teresa não gostou nem um pouco da mudança, mas entendia as razões e não reclamou nem uma vez. Não queria contar que estava com medo. Era difícil para ela se adaptar e acostumar com tudo. Ela não possuía amigos por lá, mas a cidade era pequena e não possuía muitos hobbies que não pudesse fazer em casa sozinha. Sem dizer que aquela altura já conhecia toda a parte que lhe era útil da cidade. Agora temia não ser aceita, o tempo que levaria para memorizar caminhos e lugares necessários, as áreas da vizinhança que seria segura. Apesar do medo que sentia, não ousava preocupar seus pais com isso. "A saúde da mamãe é mais importante" pensava sozinha enquanto ouvia a paisagem passar pela janela do carro. Fazia o possível para manter um rosto neutro, vez ou outra brincando com sua irmãzinha para se distrair. Após um tempo andando dentro do perímetro da cidade, finalmente pararam o carro.

- Chegamos. Não é nossa casa antiga eu sei, mas podemos deixar ela aconchegante com o tempo.

Teresa ouviu o pai dizer no tom mais alegre que as circunstâncias permitiam. Em seguida o ouviu descer e a porta do lado de sua irmã e mãe abrir. Enquanto seu pai soltava sua irmãzinha do banco para crianças, a mãe abriu a sua porta e segurou em seu braço gentilmente.

- Está tudo bem querida?

- Estou sim mamãe. Não se preocupe. Tudo ok com a senhora?

- Claro, vem. Vamos conhecer a casa e escolher os quartos. Desta vez pode ter um só para você.

Teresa sorriu enquanto a mãe a ajudava a pegar sua mochila e guiava para dentro da casa. Seu pai se juntou a elas e dizia como era cada detalhe da casa. Pelas descrições a casa possuía dois andares e um porão. No primeiro andar se encontravam a cozinha, sala para visitas, uma sala aberta que servia para escritório e sala de leitura, um banheiro pequeno, e duas despensas, uma grande ao lado da cozinha e outra pequena embutida abaixo da escada. Com exceção das dispensas e banheiro, todos os cômodos possuíam grandes janelas que davam uma ótima iluminação de dia. Uma escada levava ao segundo andar onde ficava os quartos. Um quarto grande que ficou com seus pais, dois quartos pequenos onde em um deles, o que se localizava ao lado do quarto de seus pais, ficaria o de Megan, no outro o de visitas, e um médio com janela para a frente da casa que deram a Teresa. No segundo andar ainda havia mais um banheiro, e um pequeno escritório nos fundos.

Na parte de trás do térreo havia um quintal onde em um lado possuía uma árvore grande que fazia uma boa sombra, e do outro uma churrasqueira de tijolos. Na frente ficava uma varanda que possuía um balanço para duas pessoas em uma das extremidades. Pelo que havia entendido, a casa era confortável e bonita. Não precisou de mais que dois dias para arrumarem a casa. O quarto de Teresa ficou quase igual ao seu antigo. Colocou uma estante repleta de livros e algumas lembranças, assim como presentes ao lado da entrada. Uma mesa de escritório atrás da porta, e sua cama ao lado da janela. Na cabeceira havia um pequeno criado mudo com um abajur que a mãe insistia em manter para que ela pudesse lhe fazer companhia a noite.

Uma vez que a casa estava pronta e mobiliada, ela voltou a ser atormentada por suas inseguranças. Sua mãe já havia ido atrás de sua matrícula. Mesmo que seu pai não estivesse muito a favor, sua mãe insistia que seria bom para ela ter uma convivência normal. Iria pra escola no dia seguinte. Seu pai a levaria, e isso não a deixava mais segura. Sabia que seu pai era super protetor e temia que ele fizesse alguma cena que a deixasse com primeiras impressões não muito desejadas. Gostaria de passar despercebida. Já bastava que soubessem que era cega, não precisava ser a filhinha do papai. A noite após o banho se deitou em sua cama encarando o teto. Sua mãe já havia ajeitado suas coisas para o seu primeiro dia de aula. Várias perguntas perambulavam por sua mente. Como a tratariam na nova escola? Tinha recursos para pessoas como ela? Conseguiria entrar sem chamar tanta atenção? Ela suspirou e virou de lado abraçando o travesseiro.

- Pai... que amanhã corra tudo bem... Por favor...

Fez sua prece baixinho e tentou dormir para se preparar.

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