[2] Sem caminho de volta

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1995 - Little Hangleton

Por um momento, Harry sentiu como se não existisse, como se alguém tivesse arrancado sua consciência de seu cérebro e a balançado no ar acima de um poço sem fim de nada. Ele se sentiu leve, vazio e em paz – como se tudo o que ele era, todos os seus fardos e medos, tivessem sido sacudidos para fora dele até que tudo o que restasse fosse aquela sensação de consciência que ele sempre sentia em algum lugar no fundo de sua boca. Durou apenas um momento, mas naquele momento, ele se sentiu eufórico. E então tudo desabou.

Rapidamente, o som inundou seus ouvidos novamente, raivoso, sibilante e borbulhante, quase o sobrecarregando. Ele estava desesperado para cobrir os ouvidos, mas descobriu que não conseguia mover os braços. Ele não conseguia mover quase nada. O branco que havia consumido sua visão estava mudando - movendo-se e piscando na frente de seu rosto até que ele percebeu o que estava vendo - uma pluma de vapor branco e fumaça, e faíscas afiadas. A imagem logo foi perturbada, porém, pelo contorno escuro de um homem se levantando. O que Harry ouviu em seguida fez seu coração apertar em seu peito, e o medo se acumular em seus pés.

— Vista-me.

Não. Não, não podia ser. Não foi uma escolha consciente, mas de qualquer forma, Harry ficou grato por isso quando o choque o cortou da sensação em seu corpo novamente.

Outro homem, soluçando e se curvando sobre um braço mutilado, puxou vestes pretas sobre a cabeça da figura, com uma mão. De repente, Harry estava encarando um rosto que não via há quase vinte anos. Sua pele como papel, esticada contra o crânio abaixo, e fendas diagonais em seu rosto onde seu nariz deveria estar.

Os vívidos olhos vermelhos de gato de Lorde Voldemort o encaravam.

Voldemort se virou para longe dele, inspecionando seu corpo, um membro de cada vez. O pequeno alívio por perder sua atenção foi o suficiente para que todos os sentimentos de Harry o inundassem de volta de uma vez. De repente, ele estava ciente da dor, cortante e drenante, e abrangente. Sua cabeça latejava, uma agonia aguda e penetrante concentrada em sua cicatriz, mas se espalhando por todo o seu rosto. Cordas grossas pressionavam duramente contra ele, prendendo-o a uma grande lápide de mármore. Harry não precisava olhar para saber o nome gravado nela. Ele quase engasgou, quando a sensação retornou ao seu rosto e mandíbula, e ele foi alertado da bola de tecido que havia sido enfiada em sua boca para impedi-lo de falar.

Harry sabia, em algum nível, que isso não era um pesadelo - mas era tão parecido com um que ele já tivera muitas vezes antes que era difícil não acreditar que ele estava realmente seguro e aquecido em sua cama. Atordoado, seu olhar oscilou entre: Voldemort, seus dedos acariciando seu peito; Rabicho, encolhido no chão e choramingando sobre seu coto sangrando; e Nagini, preguiçosamente circulando a base da lápide e sentindo o gosto do ar enquanto ela deslizava por ele. Vagamente, ele percebeu que algo que ele esperava que estivesse ali estava ausente. Ele se contorceu em suas amarras e tentou desesperadamente pensar.

Sua linha de pensamento foi interrompida por um estalo agudo.

Rabicho tinha sido jogado fisicamente contra a lápide em que Harry estava amarrado; ele notou com uma espécie de imprecisão bêbada que Nagini tinha escorregado para fora do caminho em algum momento. Voldemort e Rabicho estavam conversando, mas Harry não escutou. Se isso fosse como todos os seus outros pesadelos, ele sabia o que estava sendo dito. Ele tentou reunir seus pensamentos novamente, mas foi sabotado pela dor repentina e intensa em sua cabeça - ah, ele deveria ter se lembrado disso. Ele estava distantemente ciente da risada aguda que Voldemort deu em resposta ao seu próprio grito de frustração.

Porra. Pense. O que estava faltando?

E então Voldemort começou a falar novamente:

— Você está de pé, Harry Potter, sobre os restos mortais do meu falecido pai - um trouxa e um tolo... muito parecido com sua querida mãe.

The Shadow of Time | DrarryOnde histórias criam vida. Descubra agora