EU NUNCA PENSEI QUE SERIA ASSIM.
Sendo assim, nunca me preparei para as coisas que realmente aconteceriam na minha vida. Isso é bom. Conhecendo como sou, se eu soubesse de tudo, tentaria melhorar e estragaria tudo. É meu jeitinho de sempre pensar que não é o suficiente antes mesmo de experimentar algo.
Como... alguém que odeia uma fruta sem nunca ter experimentado. Não é uma aversão, é só um "tenho certeza que é ruim, tem melhores".
No momento atual, tenho certeza absoluta que é o suficiente. Gostar de Laura é o suficiente. O que recebo de volta também é o suficiente. E não podia ser melhor.
Com meu ombro úmido e uma conversa leve, terminamos a noite bem. O medo se esvaiu. O dela, pensar que eu pararia de gostar no momento que soubesse. O meu, pensar que ela nunca tinha gostado de mim.
No fim, rimos como depois do beijo. Esperando nossos pais, percebendo que a festa não tinha mais importância. Uma foto, com o nariz irritado e os olhos vermelhos de Laura, foi o que restou da noite. Encostada no meu ombro, rindo ao imitar morder meu pescoço.
E aí... exatamente aí, encerrei a noite com chave de ouro. Sempre fui a garota que pensava muito a ponto da oportunidade se esvair, mas aqui estava eu: convidando a garota que eu gosto para ir ao baile. Não só isso, mas decidindo participar da competição de melhor par de dança. Uma risada boba com "ninguém vai votar na gente" se misturou com um balançar da cabeça, aceitando.
Agora, meu único motivo era não deixar meu nervosismo se esvair enquanto tinha meu primeiro e último ato no ensino médio: a formatura. Minha avó usou um terno antigo para reformar que coubesse perfeitamente no meu corpo. A gravata em tons de rosa e laranja podia me deixar um tanto quanto cômica, mas sempre foi a escolha perfeita. Olhando uma última vez no espelho, sorrio vitoriosa.
Para ser sincera, não mudei. Pensei que nso últimos segundos do ensino médio eu me revelaria uma pessoa mais descolada. Legal. Até perceber que o legal que eu via não fazia sentido algum com minha personalidade. Assim como todas as coisas que eu pensei que teria que fazer pra viver 'de verdade'.
— Loi — Laura sorri pra mim.
— Futura rainha da formatura, está pronta?
Hoje é um dia especial.
Uma coisa que aprendi com livros sáficos é que sempre tem o momento em que a protagonista, ou o par romântico, usa terno e é uma cena fantástica. Algo importante, uma mudança, um passo ao romance. Na maioria das vezes, em formatura. Não é atoa que aqui estou eu, abotoando a camisa branca por cima de uma t-shirt e animada para minha programação de hoje.
No blazer, alguns bottons estão bem colocados. Um "escritora de clichês sáficos" apertado no maior deles. A bandeira lésbica no outro. Um simples arco-íris, que dessa vez não significa só o fato de eu ser lésbica. A gravata borboleta rosa não combinaria, o que me faz me concentrar apenas nos sapatos e no cabelo. Ainda bem que não é uma noite calorenta.
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Manual para Garotas (que gostam de garotas)
Roman pour AdolescentsPipa escreve histórias sáficas. Ela não é uma escritora famosa, tão pouco profissional e é segredo de estado. Não que precise fazer muito além de ficar com bico fechado, claro. Enquanto sua terapeuta contesta a falta de experiências reais e sua mãe...