27 - Manual para Sushi

3.7K 651 1.3K
                                    

— Foi tão bom!

Isabela sorri. Escondo o rosto para demonstrar menos a minha animação mesmo que esteja extremamente animada. Minha psicóloga não diz nada porque eu simplesmente não paro de falar.

— Ficamos deitada, ela alisava minha bochecha e sorriu pra mim. Observando meu rosto. Nos beijamos devagar e... eu juro por Deus que me perdi no tempo. Quando meu pai me ligou e eu tive que ir embora, fiquei igual uma idiota caminhando pelas ruas de pantufa e pijama. Não consegui acreditar que... aconteceu. Beijei Gaia.

Gaia?

— Então... tive um problema técnico. Errei o nome dela esse tempo inteiro. É Gaia, não Maia. Não sei como ela está sentindo, mas... não sei como tive coragem daquilo. De agir como se houvesse a possibilidade de um sim. Não, como se... eu pudesse ter aquilo. Acreditasse nisso. Porque, tudo bem, ela disse que me beijaria, mas não sou o tipo que acredita fácil. Nunca acreditaria. Tudo bem, sob efeito de álcool é justificável.

O álcool me dá euforia, me faz me sentir corajosa. Mas... sem ele, continuo patética. Deveria continuar, pelo menos.

— Mas eu não sei porque a euforia continuou. Porque no dia seguinte eu estava bem o suficiente para ir até a casa dela, conversar e beijá-la. É normal essa mudança repentina? É que... antes eu tava...

— Bem, você teve um estímulo. Não foi uma mudança repentina, foi? Quando a beijou a noite e ela demonstrou que queria, você acreditou. Talvez pela bebida. Mas acreditou e essa crença continuou quando você acordou. Extremamente normal.

— Será? E se eu for... sei lá bipolar?

— Paloma, mudanças são normais. Nem sempre algo é "alguma coisa", é o natural do ser humano. Fico muito feliz que beijar essa garota tenha te feito tão bem. Não só pelo beijo, mas porque isso foi um passo muito grande pra você. Nós duas sabemos que você não se odeia.

Só me vejo obrigada a odiar e o mundo inteiro concorda com isso.

— Mas... a gente precisa conversar sobre a outra parte. A parte da bebida. Você está feliz e isso é muito bom, mas não quero que saia daqui sem esvaziar tudo pra não ficar mal o resto da semana.

Respiro fundo. Ela está certa, mas eu queria esconder isso pra me importar só com a parte feliz.

— O número da Mica ligou pra mim. Ele ficou tocando várias vezes. Não faz sentido, entende? Não faz! Alguém já deve ser o portador do número, tudo bem. Mas por que ligou pra mim? — murmuro. — Senti como se fosse um aviso que... estava a esquecendo. Esquecendo minha melhor amiga. Eu... tô, não tô? Sou uma péssima amiga? Sinto que finalmente dei um passo à frente, mas dói porque sou um monstro por causa disso. Micaela deve ter se arrependido de ter passado a vida inteira sendo minha amiga. Mas eu a amo, juro. Sinto tanta falta, mas queria ser digna de ser feliz novamente.

Digo, baixinho. Isabela me observa, sem dizer nada, mas dessa vez também paro de falar. Esperando uma orientação. Qualquer coisa. Se não, isso só vai servir pra me atormentar.

— Como posso ser feliz se isso significa que estou bem, mesmo que ela tenha ido embora? Quão egoísta é isso? Lembrar me dói e nunca me sinto bem verdadeiramente... queria que nossa mente fosse um computador e as memórias fossem pastas. Sinto que só vou melhorar se apagar permanente a que tenha o nome dela. Seria egoísta ainda sim? Seria, mas eu não saberia disso. Se não há saída para melhorar depois do que aconteceu, a solução é simplesmente fazer com que aquilo nunca tenha existido. É por isso que queria sair daqui, se não sou um computador onde tudo que não quero pode ser apagado, a solução é fugir.

Manual para Garotas (que gostam de garotas)Onde histórias criam vida. Descubra agora