Capítulo 22

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Acordei com o cheiro dele impregnado nas narinas, toquei o lençol a procura do corpo grande de Orfeu, mas encontrei apenas o emaranhado de lençóis de seda e uma porção de travesseiros infinitos.

Pisquei algumas vezes para me situar melhor e passei os dedos sobre os olhos enquanto me espreguiçava ainda deitada na cama king, sentindo cada músculo do meu corpo dolorido e ao mesmo tempo relaxado.

Como é possível?

Não sei nem explicar o que foi a nossa combustão ontem.

— Estarei te esperando na cozinha para o desjejum — ouvi a voz grossa do Kalyvas e percebi que ele tinha acabado de sair do banheiro, vestia uma calça de moletom escura, pés descalços e estava sem camisa, exibindo aquele peitoral musculoso sobre a pele lotada de tatuagens.

Desde o nosso banho silencioso ele estava calado, o grande ogro me surpreendeu ao lavar meus cabelos e seca-los depois. Nos deitamos na cama gigante e o restante da madrugada foi o completo silêncio, ambos ainda nus, até que o sono enfim vencesse.

Fiz minha higiene e vesti a primeira camisa que encontrei na gaveta, que acabou virando um vestido por cobrir totalmente meus joelhos.

O encontrei sentado na ponta de uma mesa de dez lugares, tinha uma xícara de café cobrindo os lábios enquanto bebericava o líquido e um tablet sobre a mesa, onde ele se concentrava em tocar repetidas vezes.

Me surpreendi com a quantidade e variedade de comida disposta, o que me fez levantar a sobrancelha.

— Tem mais alguém aqui? — me sentei na cadeira ao seu lado onde estava montado o conjunto de xícara, pratinho e talheres.

— Além dos seguranças lá fora, somos só nós dois, Joana — a voz fria quase foi capaz de cortar a fatia do bolo que eu estava prestes a me servir.

— Aconteceu alguma coisa? — questionei a sua postura completamente apática.

Orfeu colocou a xícara de volta ao pires e decidiu ignorar o aparelho eletrônico.

— Eu te machuquei? — foi direto ao ponto de onde paramos ontem a noite e a minha falta de resposta o fez continuar. — Chamei um amigo meu para te examinar.

— O que? — engasguei com o bolo integral e precisei de um gole do suco de laranja que estava na minha frente para desentalar.

— Não se preocupe, o conheço a muito tempo, ele é discreto e confiável — a objetividade dele estava quase me fazendo surtar em um espaço muito curto de tempo.

— Eu não vou me consultar com o seu médico e já disse que não me machucou — limpei o canto da boca com o guardanapo e suspirei ao perceber que com Kalyvas não há meio termo, ou eu encaro meus demônios ou ele passa por cima de mim.

— Não gostou do meu sexo? — percebi que ele se referiu ao seu sexo aquele pequeno show tortuoso em que eu estive presa e dependente dele.

Aquele que por mais que eu tentasse, não consegui impedir de me deixar levar.

De me deixar gostar.

— Gostei — não adiantaria mentir, ele, mais do que eu, sacaria o blefe na hora. — Esse é o problema — tive que desviar os olhos dos seus por não conseguir bater de frente com as pedras nebulosas.

— Explique-se — ordenou levantando o cenho, diria que até surpreso com minha resposta.

Foi nesse momento que percebi o motivo da sua indiferença; Orfeu estava se punindo por pensar que me fez algum mal, quando na verdade é o oposto que me assusta.

SHARBERTY - A Liberdade InexploradaOnde histórias criam vida. Descubra agora