Ansara olhou para Valência e admirou-se. Parecia uma rainha a falar. Nem parecia a Valência com que tinha acabado de discutir. A Valência que tinha passado a noite nos seus braços. Ele não a entendia nem sempre concordava com o que fazia, mas admirava a sua força e sentia que estava sempre a descobrir aquela mulher.
Quando Marx foi falar com Regina, Ansara conseguia notar o desprezo pelos homens que aquela menina mimada tinha. Parecia que estava a falar com uma cascavel. Tinha medo, mas a repulsa estava tão presente como uma pessoa. Ansara suspirou. Como poderia haver mulheres assim? Se elas não os atacassem no acampamento onde estavam nunca estariam ali no meu daquela confusão. A maioria dos homens das Minas e até mesmo eles só queriam estar em paz, sem maltratos ou submissão por meio de artefactos.
As exigências dos homens do reino eram liberdade para escolher o seu trabalho e mulher e impedimento de ser vendidos ou obrigados a trabalhos forçados. Nada demais. Depois Marx e Regina ficaram a discutir a monogamia e a poligamia. Mas o mais importante já tinha sido tratado.
Ansara saiu do castelo e viu Valência a dar ordens aos soldados para acabarem com algumas disputas que surgiram perto deles. Ansara aproximou-se:
– Obrigada – disse simplesmente.
– Fiz apenas o meu dever – respondeu Valência olhando significativamente para ele.
– O Artefacto?
– Está no Castelo Dourado. Seguro.
Uma disputa entre uma mulher e um homem do reino tornou-se pior depois dos soldados intervirem. Foram contra os soldados, sem acalmar a sua discussão, e eram mais fortes do que aparentavam. Os soldados recuaram ao evitar usar a espada para civis não armados. Sem querer, foram embater contra Valência e Ansara que ficaram encostados, muito próximos, encurralados entre os soldados e com a parede do castelo. Como último recurso, os soldados ameaçaram os civis com espadas e eles ouviram os civis argumentaram «Isto é entre marido e mulher! Não tem nada que impedir! Resolvemos as coisas entre nós» e ele ajudou-a «sim, é isso mesmo! Precisamos de dizer tudo para depois ficar tudo bem!». Os soldados abanaram as cabeças sem compreender.
Valência e Ansara poderiam interessar-se pela disputa do casal, mas a verdade é que a proximidade dos seus lábios, devido ao empurrão, fez com que o desejo aquecesse os seus corpos. Mesmo depois dos soldados terem controlado a situação, nem Valência, nem Ansara se moveram.
Ansara de uma forma instintiva agarrou a cintura de Valência e puxou-a para si. Ela correspondeu, abraçando-lhe o pescoço. Ele beijou-a profundamente e explorou a sua boca demoradamente. Valência sentiu-se derreter. Por vezes, a razão cedia aos sentidos. Como ela se sentia quente e agitada por aquele homem!
Valência lembrou-se do que tinha feito. Desejou esquecer e ficar ali naqueles braços que pediam para voltar ao Castelo Dourado, mais precisamente, ao seu quarto no castelo. Suspirou ao libertar-se dele. Ele ainda a agarrava na cintura e nas costas.
– Ansara... eu fiz uma coisa terrível... – confessou Valência sentindo os olhos a picar. Sabia que aquela confissão, que já deveria ter feito, iria terminar tudo entre eles. Talvez, para sempre – Quando estávamos no acampamento... eu... estava com o anel... quando te obriguei a fazer amor comigo... eu fiz o mesmo que Aracnia...
– Eu sei. Tu mostraste-me – respondeu Ansara sem largar – agora, começo a compreender porque reagiste daquela forma...
– Não posso condenar Aracnia... – Valência virou a cara. Ansara virou-a de volta e olhou-a bem nos olhos – não fiz nada obrigado contigo. Fiz porque queria e porque te amo.
Valência sentiu as suas palavras como um baque. Algumas lágrimas fugiram-lhe dos olhos. Ele beijou-a com uma maior intensidade. Ela colou o seu corpo ao dele e sentiu o corpo dele a vibrar com o dela. Até ouvirem uma voz atrás deles.
– Hu-hum! – era Kenji que estava ali como se tivesse surgido do chão.
Ansara e Valência olharam para Kenji e compuseram-se
– Kenji! – surpreendeu-se Valência.
– Álvaro! – reagiu Ansara.
– Álvaro? – intrigou-se Valência.
– Sim, este é o vendedor ambulante, estou sempre a cruzar-me com ele. Como está? – cumprimentou Ansara.
Valência sorriu com a confusão. Kenji correspondeu o cumprimento com um aceno e puxou Valência à parte. Ansara percebeu que algo estava estranho, o vendedor falava geralmente pelos cotovelos e Valência tinha lhe chamado outro nome. Talvez, fosse pela presença de Valência, se calhar chamava-o pelo nome de família que Ansara desconhecia. Ansara achou estranho, mas não deu importância, estava demasiado feliz para tal.
– Vossa alteza. É importante. É sobre a sua mãe.
– O que se passa, Kenji? – preocupou-se Valência.
– Ela está muito mal. Precisa de voltar o mais rápido possível para o reino.
Valência pediu a Ansara para voltar com ela para o reino. Depois de tantos ataques e confusões até Ansara tinha se esquecido da sua expulsão do reino. No entanto, a principal razão do seu esquecimento era o olhar desesperado de Valência. As notícias eram da sua mãe. Não sabia como Álvaro tinha sido ordenado a trazê-las, mas fazia sentido. Ninguém conhecia tão bem os caminhos quanto ele.
Valência estava tão preocupada que, se pudesse, voava até ao reino. Sofria com o olhar dela. Estaria a Rainha doente?
Quando Ansara chegou viu os destroços do castelo e que os aposentos que tinha partilhado com Valência estavam destruídos. Olhou ainda a não querer acreditar para a derrocada da muralha e do edifício mais forte de todo o reino. Agora, conseguia ver o quanto Regina era uma mulher perturbada. Ela decidiu precisamente nesta altura em que o seu reino estava tão vulnerável, atacar os outros reinos que são mais fortes do que o dela? Teria ideias suicidas?
Valência correu para o castelo sem esperar por Ansara que parou a ver os danos no reino. Ansara seguiu-a. As pessoas do reino estavam a olhar intensamente para ele. Vinha acompanhado por Valência, por isso, não se atreviam a atacá-lo, mas conseguia sentir a sua desconfiança. Todos paravam a olhar para ele como se tratasse de um fantasma. Ansara correu para o castelo. Estava preocupado com a rainha e com Valência.
Valência agarrava a mão da mãe a lutar contra as lágrimas que teimavam em cair. A rainha estava pálida com as olheiras profundas. Quando esta abriu os olhos, a primeira pessoa que viu não foi Valência, mas Ansara. Sorriu. Lembrou-se de algo muito importante que não tinha falado com a filha.
– Valência... – começou- preciso de dar-te mais um conselho antes de partir.
– Não diga isso, mãe! – suplicou Valência.
– Valência, tens que retirar o exílio de Ansara e explicar o que aconteceu aos homens do reino... – fez mais um esforço para falar — tens de retomar o poder dos homens... eles são importantes e necessários...
– Mãe, não se esforce, podemos falar depois... – pediu Valência
– Não, tenho de falar agora. Quando o teu pai morreu eu senti-me perdida. Só consegui governar bem o reino porque tinha o teu pai a meu lado – fez uma pausa. – Depois de ele partir, eu sempre receei uma guerra ou disputas entre os reinos porque ele conseguia lidar melhor com essa parte do que eu. Para governar, não pode ser nem só as mulheres, nem só os homens. Aceitar as diferenças e através delas atingir o equilíbrio possível. Lembras-me tanto o teu pai... – subitamente as olheiras tornaram-se mais profundas e a rainha mais cansada do que nunca, disse com esforço – amo-te muito filha... vais ser uma ótima rainha... volta com Ansara... ele a-ma....
A Rainha fechou os olhos. O curandeiro aproximou-se e tomou-lhe o pulso. Abanou a cabeça.
Valência tentou-se levantar, mas logo caiu de joelhos a chorar e a soluçar. Ansara abraçou-a, tentando aparar a sua dor, no entanto, não conseguiu.
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O Reinado das Mulheres (RASCUNHO)
FantasyUma mulher que perdeu tudo devido aos homens da sua família, sobrevive a fingir que é homem até ao dia em que descobre um artefacto que vai mudar o mundo para sempre... Dois séculos mais tarde, um homem injustiçado que procura o artefacto para fazer...