18. A Floresta

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«A percepção do desconhecido é a mais fascinante das experiências. O homem que não tem os olhos abertos para o misterioso passará pela vida sem ver nada.»

Albert Einstein

No dia seguinte, Ansara e tia Felismina acordaram com os galos, comeram sem dizer nada, e partiram para a Floresta. Como Ansara tinha trazido o seu cavalo foi muito mais rápido. Quando chegaram ao ponto de cruzamento entre a Floresta e o Reino Pastaria, a tia Felismina pediu para Ansara para deixar o cavalo na entrada da floresta. Ansara ressentiu o pedido. Sentia-se muito mais seguro com o cavalo. Mesmo tendo uma especialista naquele lugar e curandeira, mesmo assim sentia-se nervoso. Só a imagem daquele lugar mexia com ele. Preferia nunca ter de entrar ali.

Entrou na floresta cauteloso guiado por tia Felismina, que nunca lhe pareceu tão confiante. Parecia até ficar mais nova e mais viva naquele lugar. Talvez fosse apenas porque se sentia especial, porque sem ela, ele provavelmente nunca sairia dali. Ele tinha medo das pessoas-árvores, o povo da Floresta. Ansara arrepiou-se ao pensar que tia Felismina estava a levá-lo a conhecer as pessoas que mais temia. Até à sua conversa no dia anterior, nem tinha a certeza que eles existiam e agora saber isso e que qualquer passo em falso poderia levar à sua morte, assustava-o mais do que queria admitir. Talvez o seu temor fosse porque nada sabia deles. Além da sua magia, caso a tivessem, poderia evitar que ele lutasse em caso de perigo, como aconteceu com Aracnia. Receava dizer algo ou ter alguma atitude que não gostassem e ele nunca mais saísse dali. Quando estava próximo de situações perigosas, Valência aparecia-lhe nos seus pensamentos, contra a sua vontade. A sua cara de chateada por ele ter de trabalhar na sua folga. A sua cara de alegria quando lhe trouxera uma flor da patrulha. A sua concentração a ler um livro. Ainda parecia sentir o seu pé a doer das suas pisadas por comer com as mãos em frente da Rainha... Por que ela não admitia que tinha errado em não acreditar nele?

– Ansara, Filho, estamos quase lá – tia Felismina acordou-o do seu sonho.

Quando Ansara voltou a si, viu os brilhos na floresta densa. A humidade era intensa e havia tantas árvores, arbustos e sons de animais a remexer que pareciam que tinham mergulhado num quadro com várias graduações de verde. Os brilhos eram de pirilampos que surgiam porque a vegetação era tão densa que estava tão escuro como no crepúsculo. Era um espetáculo quase tão fascinante quanto o brilho do Artefacto. Apenas a vida da floresta e os tons de verde reforçavam aquelas pequenas luzes que os rodeavam e que Ansara desejou ter para levar sempre que precisasse.

Depois de uma passagem na florestação mais densa, onde estavam os pirilampos, passaram para uma clareira e os caminhos começaram a ser melhores. Onde se ouvia pássaros e animais a rastejar antes, agora pareciam ter sido engolidos por um estranho silêncio.

A tia Felismina continuava tranquila e confiante. Ansara continuava a segui-la com o coração na boca. Esforçava-se para não pensar nas pessoas-árvores, tinha receio que elas conseguissem ler pensamentos. No entanto, ficava a pensar como uma pessoa pode ser árvore também? Teriam raízes ou pés? Dariam bebés nos ramos como fruta? As ideias mais estranhas passavam pela mente de Ansara enquanto caminhava naquela floresta apenas guiado por tia Felismina. O caminho parecia não ter fim. Apesar do silêncio, não se via casa alguma, nenhum animal ou sinal humano. Era estranho no meio de tantas árvores não se ouvir nem um pássaro.

– Chegámos – disse repentinamente tia Felismina.

Tinham chegado a um poço. Pelo menos era o que parecia a Ansara até ver que eram umas escadas. Ansara estalou a língua. Não entendia porque as coisas mágicas tinham de estar em grutas, minas e caves. Já estava farto de estar debaixo do chão. Enquanto pensava, a tia Felismina já descia as escadas. Contrariado, Ansara começou a descê-las também. No meio da escadaria, havia um sino. Tia Felismina tocou três vezes. A seguir, sem esperar nenhuma resposta, continuou a descer a escadaria. As escadas eram muitas e quando chegaram ao fundo, só conseguiam ver porque a gruta era iluminada por archotes. Logo à frente da escadaria havia uma porta. No entanto, tia Felismina deu a volta e abriu a porta que estava à sua esquerda. Quando Ansara olhou em volta, viu que havia portas todo em volta das escadas. Era impossível para uma pessoa que não soubesse saber qual era a certa. Ansara seguiu uma vez mais Felismina.

O Reinado das Mulheres (RASCUNHO)Onde histórias criam vida. Descubra agora