Capítulo 45 - LIVRES PRA QUÊ?

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Quando outubro chegou, encontrou Bento já muito bem adaptado à rotina do hospital. Ele conhecia cada paciente da sua ala, conhecia todos os enfermeiros e seus respectivos horários, todos os médicos e plantonistas, todos os fisioterapeutas e camareiras, sentia-se, finalmente, em algo parecido com um lar.

As melhoras também era bastante visíveis, há duas semanas abandonara as muletas e estava cada vez mais seguro ao andar sem o apoio que elas lhe ofereciam. Sentia saudade de casa, dos abraços calorosos da tia, de implicar com João, de comer comidinha caseira, de estar com os amigos, por isso, a chegada de outubro era, também, uma exaltação, logo o fim de ano chegaria e, com ele, a sonhada alta.

Era cedo, porém, para pensar sobre isso, ainda precisava dedicar seu tempo aos exercícios e tratamentos.

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Kessya contava os meses sempre em "menos um". Outubro chegava e agora era cada vez mais próxima a volta de Bento. Ela fazia planos, os amigos perguntavam sobre datas e ela não tinha certeza, mas sabia que era logo. A ansiedade e a saudade eram suas maiores companhias.

Como sempre fazia, logo que chegava da aula, a menina corria para o celular para conversar com o amigo. Nos últimos dias, no entanto, algo vinha lhe incomodando bastante. Era Hannah.

A colega do quarto ao lado do de Bento parecia bastante prestativa, interessante, boa prosa...: "Ah, a Hannah me trouxe um livro maravilhoso que conseguiu com um enfermeiro", "A Hannah acabou de sair daqui, estava me contando de quando viajou para a Argentina e quase foi passear no Brasil", "Nossa, hoje o café estava muito gostoso, eu amei, mas a Hannah achou bem forte e quase não conseguiu tomar toda a xícara", "Aqui começou a esfriar e a Hannah está fazendo cachecóis para todos, falei para ela fazer um bem bonito pra eu levar pra você".

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Kessya evitou ao máximo falar dela, porque a intimidade de Bento com essa moça a incomodava bastante. Então ela não se alongava em nenhuma conversa em que o menino estivesse contando algo sobre a nova amiga... Não queria demonstrar ciúme, não queria igualar a relação que tinham com essa nova relação. Repetia para si mesma várias vezes que o que tinha com o pianista era maior do que o que qualquer outra menina conseguiria construir, ainda mais em poucos meses, mas também não conseguia parar de pensar que no hospital as pessoas estão mais frágeis e as relações que fazem costumam ser mais intensas.

Hannah estava lá, onde ela queria estar, acompanhava de perto os altos e baixos do menino do seu coração. E se toda essa ajuda e disponibilidade resultasse em algo a mais?...

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Por chamada de vídeo:

...

- Ah, que bom Kess, eu fico feliz que deu tudo certo com o bingo beneficente do CLL, depois me manda as fotos, quero ver tudinho!

- Pode deixar, mando sim...

- Vou mostrar as fotos para a Hannah, ela ama essas coisas...

- É, pelo visto essa Hannah ama muitas coisas...

- Oi?

- Nada...

- Ah, já sei, vou levar o celular lá no quarto dela, talvez...

- Bento, não precisa...

- Não, eu faço questão... Ela quer muito te conhecer, a gente sempre conversa sobre você...

- Se conversar com ela sobre mim na mesma quantidade de vezes que você conversa sobre ela comigo, já é lucro... - ela falava mais baixo e Bento, que estava no corredor a caminho do quarto de Hannah, não ouvia muito bem os resmungos da menina.

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