V. A fazenda ao lado

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A Fazenda dos Castilho não era longe da Fazenda Villamazzo.

Eles eram praticamente vizinhos pois seus terrenos faziam fronteira um com o outro, sendo separados apenas por um lago profundo mas não muito extenso. Assim, pouco depois de passarem direto pela entrada da Fazenda Villamazzo, o imponente casarão dos Castilho já apontava no horizonte e um dos peões já estava a postos para abrir a cancela quando os carros chegaram.

- Escutem - Pilar olhou para as filhas no banco de trás enquanto o Pontiac adentrava as terras dos Castilho, todas prestaram atenção exceto Marinês que retocava o batom com uma concentração invejável - esta é uma reunião importante, comportem-se direito! Não quero saber de indiretas, ódio a sociedade, falar de boca cheia, se meter nos negócios sem ser chamada e principalmente - Pilar olhou para o filho caçula que olhava para o retrovisor, novamente, prestes a desmanchar o penteado. Percebendo o olhar de censura da mãe, Francesco voltou a encostar no banco desistindo da ideia - nada de gracinhas ou peripécias, me entendeu mocinho?
- Nossa mãe - Francesco fingiu ofensa - é essa visão que a senhora tem de mim, seu filho querido?
- Eu conheço bem o filho que pari - Pilar deu um sorrisinho de canto, Francesco exibiu um largo sorriso travesso.
- Não vai nem nos defender, papai? - Vitória inclinou-se para o banco da frente

O Coronel deu uma risadinha e olhou para a esposa brevemente.

- E contrariar a sua mãe? Defendam-se vocês sozinhos - ele respondeu com o único intuito de agradar a esposa, e funcionou.

Os carros estacionaram perto um do outro a alguns metros da varanda que circundava o imenso casarão, e põe imenso nisso! A Fazenda Villamazzo era grande mas a residência dos Castilho era muito maior, o que condizia com a quantidade absurda de terras que Firmino possuía, para todos os cantos e por mais longe que se tentasse enxergar ao redor, era tudo dele.

Por dentro, era uma casa bem iluminada, a luz do sol entrava nos corredores e cômodos abertos por várias janelas e claraboias de vitral, haviam muito quadros nas paredes e era comum ver móveis de madeira marrom avermelhada que, embora aparentemente muito bem conservados, pareciam aqueles objetos que se herdam dos avós. As paredes eram em tom de creme com um rodapé alto também de madeira, o que dava todo um ar clássico para o casarão.

Depois de passarem por duas salas de estar e alguns corredores não muito extensos, as duas famílias chegaram a uma imponente sala de jantar disposta de uma mesa comprida que combinava com o restante dos móveis, tinha doze cadeiras estofadas de tecido bege e, como se já estivesse tudo planejado - e devia estar, com certeza - a fartura era evidente.
Frutas, sucos, pães, bolos, geleias, era tudo de encher os olhos! De repente, Francesco já não estava achando tão ruim assim ter de aguentar mais algumas horas dentro daquele terno horrível.

- Sentem-se, fiquem a vontade - Firmino indicou para os Villamazzo e se sentou numa das pontas da mesa - espero que estejam com fome pois este café foi preparado especialmente para vocês!

Francesco quase foi sincero mas se conteve, com toda certeza dizer "acertou na mosca" se enquadrava no que a mãe queria dizer com "peripécias e gracinhas". Será que experimentar uma torrada com todas as 15 opções de geleia que havia ali também se encaixava? Ele se perguntou.

O Coronel pegou o lugar ao lado da cabeceira da mesa, ao seu lado esquerdo estava Pilar, pulando uma cadeira ao lado dela estavam respectivamente César e Vicente. Do outro lado da mesa se dispunham: Francesco à frente do pai, Marjorie, Amália, Marinês e por fim Vitória, bem em frente ao primogênito Vicente.

A vontade de pegar cada tipo de pão doce ali servido era grande, mas Francesco tinha certeza que definitivamente não era uma boa ideia infringir a primeira regra de etiqueta que a mãe lhe impunha depois de ele cometer a proeza de comer sozinho as duas coxas de peru numa festa de natal da família quando tinha cinco anos: "na casa alheia, não coma de acordo com a sua fome". Com pesar, Francesco teve de acreditar que um pão de sal com ricota e presunto de Parma, suco de maçã e uma tacinha de figos em calda daria conta de seu estômago sem fundo até voltarem para casa – e para a cozinha de Tia Luzia.

HERDEIROSOnde histórias criam vida. Descubra agora