6. O grupo.

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(Atualmente, dez meses depois).


Escondo o rosto na escuridão da floresta, tendo cuidado para que o grupo em volta da fogueira não me veja.

Se quero mesmo passar despercebida, terei que dar a volta na mata para evitá-los. Penso.

- Estamos perto, só temos que aguentar mais um dia. - O homem branco e barbudo diz, apagando o fogo com a bota em seguida. - Se as pessoas lá estão aceitando gente então devem ser fortes. Devem ter um sistema.

- Será que é um lugar de gente do bem? - Pergunta a mulher negra ao seu lado.

Observo que ela possui uma katana deitada bem em cima do tronco onde ela estava sentada.

Como eu adoraria achar uma dessas.

Me preparo para dar um passo para o lado, mas um barulho de galho quebrando surge antes mesmo que meu pé possa encontrar o chão.

O casal nota o barulho e imediatamente levanta, mas com o silêncio prevalecendo outra vez, eles decidem que não é nada.

Decido não me mover dali. Talvez eles acabem precisando de ajuda.

- Nós aceitamos pessoas. - O homem volta a falar.

- Pois é, e o governador também. - A mulher retruca.

- É. É sempre assim, não é? A gente não sabe até saber. - Diz ele, não notando que um homem sai da floresta em sua direção e outro em direção à mulher ao seu lado.

Imediatamente me ponho pronta para atirar em quem quer que seja.

- Talvez esse lugar nem exista mais. - Diz e então o cano da arma daquele homem que tinha saído de dentro das árvores vai de encontro a sua têmpora.

- Olha só que coisa, você pisou na bola, otário. Você tá ouvindo? Pisou na bola.

Mais três homens do grupo saem de dentro da floresta e apontam suas armas. Um deles vai em direção ao carro parado ali e percebo que tem um menino lá dentro.

- Hoje é o dia do julgamento, senhor. Restituição. O equilíbrio de todo o universo. Que merda, e eu achando que ia dormir na noite de ano novo. - O homem de meia idade ri. - Agora quem vai fazer a contagem da virada comigo? Dez mississipi, nove mississipi, oito mississipi.

- Joe!

De repente um homem de cabelo grande e besta na mão aparece e o casal parece reconhecê-lo.

- Espera.

- Você me parou no oito, Daryl. - Diz quem pelo jeito se chama Joe.

- Espera um pouco.

- Esse cara matou o Lou, então não tem o que conversar. - Outro homem de meia idade diz.

- Ainda bem que hoje em dia nós temos tempo de sobra. Pode falar, Daryl.

- Esse pessoal...deixa eles irem. São boas pessoas.

- Não, eu acho que o Loui ia discordar de você sobre isso. E eu tenho que falar por ele porque seu amiguinho aqui estrangulou ele no banheiro.

- Você quer sangue, eu entendo. - Daryl larga a besta no chão. - Pega o meu, cara.

A atitude dele faz com que eu imediatamente crie algum tipo de empatia. Ele está disposto a fazer tudo por seu grupo e isso é algo muito raro hoje em dia.

- Esse homem matou o nosso amigo. Você diz que ele é uma boa pessoa, eu digo que isso é uma mentira. É mentira. - Diz e como se fosse um tipo de referência pessoal, dois membros de seu grupo que estavam mais próximo do besteiro começam a bater nele.

Me preparo para atirar, mas ao ver que o homem próximo ao carro puxa o menino para fora acabo imediatamente mudando alvo.

Cinco. Digo em uma tentativa de não me odiar por estar fazendo isso outra vez. Mais esses cinco e eu paro de ajudar. Decido.

O primeiro tiro é certeiro. Atravessa o olho do homem que segurava o garoto e isso fez com que todos prestem atenção nas árvores a procura de quem tinha atirado. Mas com a escuridão fica difícil para eles de acharem minha localização com clareza.

Aproveitado a distração deles e atiro no próximo alvo. Não é Joe, porque ele engasga com o próprio sangue e ali percebo que não fui eu que o matei, foi o homem barbudo. Sei disso porque seu rosto está coberto de sangue, sinal de que ele mordeu o pescoço de Joe e arrancou um pedaço fora.

O homem que apontava para a mulher da katana é em quem eu atiro primeiro e logo depois nos dois homens que espancavam o besteiro.

Quando tudo finalmente acaba, é como se meu cérebro perdesse as forças e quisesse simplesmente desligar, mas mantenho a calma e saio de entre as árvores e vou até o grupo. Eles me encaram de um jeito surpreso e o homem barbudo até para de checar se o menino está bem para poder olhar para mim.

Daryl, o besteiro, é quem se aproxima de mim primeiro e eu não hesito em levantar a arma em direção ao seu rosto. Sei que só tenho mais uma bala no carregador mas isso não me abala. Eu sei que sou capaz de matá-los apenas com o facão na minha bainha se eu quiser. Mas de qualquer forma, matá-los não é minha intenção, eu só não gosto que fiquem tão próximos de mim quanto Daryl está.

- Se afasta. - É a primeira coisa que sai da minha boca. Minha voz fina e jovial faz com que eu soe patética, mas Daryl se afasta assim mesmo.

Não há um pingo de medo em seus olhos. Penso e isso me deixa desconfortável. Talvez ele não me veja como uma ameaça agora que eu ajudei todos eles.

- Abaixa a arma. - Diz Daryl com a voz tão rouca e baixa que mal consigo entender - Não queremos te machucar.

- Só fica longe.

- Não precisa ficar com medo. Nós só queremos te agradecer. - A moça diz, tentando soar reconfortante, mas eu não abaixo a arma.

- Agradece de longe. - Digo rude, mas ao encontrar sem querer os olhos do garoto me encarando não consigo me impedir de me importar com ele. - Você está bem?

O fato de eu me direcionar para ele com um tom tão afetuoso faz com que todos olhem para mim com uma expressão confusa.

O que eu posso fazer se eu gosto de crianças?

- Sim. - O menino finalmente responde, se mostrando mais antissocial que eu.

- Bem, se vocês estão bem, então eu estou indo. - Digo e começo a andar para longe para evitar mais conversa.

Somente paro para pegar as armas de um dos homens que abati, afinal gastei as poucas balas de uma das minhas armas com aquele grupo e não podia me dar o luxo de sair por aí só com as facas.

Na verdade, matar pessoas com facas não é difícil, eu apenas acho cruel e por isso prefiro atirar de uma vez. É por isso que minha quantidade de balas diminui em uma velocidade absurda a cada semana: pessoas ruins me atacam e eu tenho pena de fazê-las sofrer.

- Espera! - A moça me chama e eu me viro esperando que ela reclame por eu estar pegando algumas armas. - Qual o seu nome?

- Le'Roux. - A pergunta repentina faz com que eu me perca nas palavras. - Alice. Alice Le'Roux. Qual o de vocês?

- Eu sou a Michonne, esses são Rick, Daryl e esse é o Carl. - Apresenta e como se ele fosse um imã, meus olhos se prendem novamente no garoto.

- Vocês precisam de mais alguma ajuda? Vocês tem lugar para ficar? Destino para ir? Pessoas para achar? - Resolvo perguntar de uma vez e tenho intenção de ajudar, mas me lembro do que eu tinha dito a mim mesma apenas alguns minutos atrás.

Chega de ajudar, Alice.

- Estamos indo para o Terminus. - Diz Rick trocando o peso de uma perna para outra. - Você já ouviu falar?

- Já. É uma idiotice, se querem saber. A não ser que estejam procurando por algum familiar ou conhecido, não vale a pena arriscar ir até lá. - Respondo e então percebo que talvez já seja seguro abaixar a arma. Faço isso e a guardo mas minha mão escorrega automaticamente ficando em cima do facão na minha bainha.

- Por que diz isso? - Pergunta Michonne.

A ingenuidade dela me faz questionar se ela é realmente uma sobrevivente desse mundo, mas tento não ser tão rude.

- Um lugar que oferece abrigo para desconhecidos, ou é cheio de militares, e bombas, e tanques de guerra, ou é uma armadilha bem projetada. As pessoas desesperadas vão até lá pensando ser a sua salvação e então são pegas. Eu não vi o lugar, nem mesmo passei por lá ainda, mas depois de tudo que eu vivi estando sozinha aqui fora eu posso afirmar que as pessoas boas não são tão burras assim. Mas pessoas ruins são inteligentes assim.

- Perdemos o nosso grupo e precisamos muito achar os nossos amigos. E achamos que eles podem estar lá. - Admite Michonne. - Será que não teria algum jeito de nos ajudar com isso? Eu sei que já fez muito pela gente essa noite, mas depois de ver o que você fez, eu...

- Desculpe, Michonne, mas eu não me arrisco assim. - Eu a corto antes que ela consiga me convencer a ajudar. - Eu sinto muito pelo seu grupo, mas eu não posso arriscar ser morta desse jeito. É burrice. Se fizerem isso estarão entrando na boca do leão. - Digo. Automaticamente a culpa chega e me vejo obrigada a usar um tom mais suave. - Me desculpe, está bem? Eu realmente não posso. Espero que vocês encontrem o resto do seu grupo. Mas de verdade, eu não posso ir.

- A gente entende. - Diz Daryl pela primeira vez desde que a conversa foi iniciada. - Obrigada pela ajuda.

- Obrigada. - Michonne também agradece, mas ainda parece decepcionada por eu não concordar em ajudar.

Outra vez me sinto culpada, mas não dou ouvidos para isso e apenas adentro outra vez na escuridão da floresta.

𝐋𝐞'𝐑𝐨𝐮𝐱 - 𝐂𝐚𝐫𝐥 𝐆𝐫𝐢𝐦𝐞𝐬.Onde histórias criam vida. Descubra agora